Geral

Atendimento gratuito para os doentes emocionais é precário

Rita de C. Cornélio
| Tempo de leitura: 4 min

Listas de espera quilométricas, internações inadequadas, poucos investimentos e luta constante. Este é o quadro da assistência gratuita prestada a doentes emocionais em Bauru. Apesar de atingir cerca de 20% da população brasileira, os males de origem psíquica não são prioridade dentro do aparato público de saúde.

Em Bauru, não há atendimento emergencial especializado nos finais de semana, feriados ou período noturno, obrigando os doentes em crise aguardar o horário do expediente normal. Nos quatro pronto-socorros da cidade, são atendidas, em média, por final de semana, 50 pessoas com queixas que denotam doenças do gênero.

As doenças que afetam o emocional não sangram e, na maioria dos casos, não assustam pela aparência, pois estão nas entranhas do comportamento humano. Como uma bomba, elas podem ser desencadeadas a qualquer momento, dependendo das características individuais. Embora não externem gravidade, as crises emocionais exigem socorro imediato, o que só acontece - ou seja, raramente - quando o paciente dispõe de condições financeiras para custear o atendimento. Essa carência pode ser medida pelos números dos locais públicos que fazem o tratamento eletivo (não emergencial), onde as listas de espera computam mais de 500 nomes.

Providências imediatas poderiam evitar males maiores, como a superlotação das entidades especializadas em doenças psíquicas. Se contassem com o pronto-atendimento, por exemplo, os pacientes emocionais não estariam transbordando pelas portas do hospital psiquiátrico da Sociedade Beneficente Cristã, o único da cidade a prestar esse tipo de atendimento.

A psiquiatra Elaine Lúcia Dias de Oliveira, que acumula a função de presidente da Associação de Usuários do Ambulatório de Saúde Mental, acha que o número de leitos disponíveis em Bauru, cerca de 50, são suficientes para a demanda, mas faz uma ressalva: Isso se fossem internados apenas os pacientes avaliados por profissionais habilitados. Por falta de um atendimento emergencial, diz ela, muitas pessoas, especialmente os alcoolistas, são internados. Eles poderiam ser tratados sem a necessidade da internação, argumentou. O leito ocupado inadequadamente impede que um doente em crise, geralmente necessitado de internação, receba tratamento. Os profissionais que fazem o atendimento emergencial nas unidades comuns desconhecem o procedimento e, por vezes, ficam assustados com a situação, comentou. Na opinião da médica, o serviço emergencial específico para doentes psíquicos e mentais evitaria a falta de leitos hospitalares e os gastos provenientes da internação. Os alcoolistas usam os pronto-socorros como porta de entrada para internações, exemplificou.

Emergência pede socorro

A diretoria dos pronto-socorros municipais não tem computados todos os atendimentos prestados a pacientes emocionais, mas um levantamento feito nos dias 22, 23, 29 e 30 de setembro (dois finais de semana) deu uma mostra do que acontece nas unidades (acompanhe os números no quadro).

Analisando os dados, chega-se à conclusão que os casos de doenças psíquicas e emocionais são significativos em termos de procura. Embora sem números comparativos, os chefes das unidades confirmam um crescimento nos casos de alcoolismo e distúrbio comportamental nos fins-de-semana.

Alcoolismo

Tendo como base a população de Bauru, estimada em aproximadamente 315 mil habitantes, pode-se dizer que pelo menos 1% sofre com o alcoolismo, uma doença emocional que pode ser tratada sem o recurso da internação, dependendo do caso. O Núcleo de Apoio Psico-Social (Naps) tem inscritas 3,2 mil pessoas, que participam dos grupos de desintoxicação, voltado aos alcoolistas. A atual situação econômica do País é uma das causas do grande número de pessoas que costumam usar os finais de semana para se embebedar e talvez esquecer, por alguns momentos, a realidade.

A terapeuta Janice Maria Moreira Gomes disse que os alcoolistas têm idades entre 20 e 60 anos e são, em sua maioria, do sexo masculino - cerca de 85%. O número de desintoxicados, de acordo com ela, chega a 500 por mês. Temos também 225 adultos que tentaram suicídio e que estão em acompanhamento psicológico, numerou.

A dona de casa Tânia Regina Ferreira de Souza tem 36 anos e está há 14 em tratamento no Ambulatório de Saúde Mental. Os primeiros sintomas que lhe revelaram a doença surgiram quando ela nem desconfiava o que era depressão. Eu sentia uma tristeza, não queria tomar banho, chorava muito e achava que estava sendo perseguida pelas outras pessoas, lembra. A mãe de Tânia foi quem a levou até o médico. O médico constatou que eu estava sofrendo de depressão. Estive internada várias vezes e atualmente faço parte do grupo de terapia ocupacional. Continuo em tratamento, uso medicação, mas estou com a situação sob controle, comemora.

Comentários

Comentários