Não é novidade alguma que as mulheres estão cada vez mais ganhando espaço no mercado de trabalho, muitas vezes até desempenhando funções antes tidas como exclusivamente masculinas. As mulheres agora estão atacando outra frente nessa batalha (pacífica) para se igualar, na prática, aos homens em direitos, deveres e obrigações: o próprio lar. Ou seja, elas estão mandando mais dentro das suas casas e, por conseqüência, em suas famílias, tomando decisões sobre tudo, mas, principalmente, sobre o dinheiro que se gasta
O homem é sempre o cabeça da casa, mas quem controla a cabeça é o pescoço e o pescoço é a mulher, diz o segurança Antônio Capelim. Casado há nove anos e pai de dois filhos, ele não tem nenhum problema em admitir que na sua casa a esposa, Marluce Capelim, é quem dá a palavra final na maioria das situações, inclusive aquelas nas quais os dinheiro está em questão. Marluce, que é bancária, confirma que na maioria das vezes suas decisões prevalecem, mas não se acha uma ditadora no lar. A gente procura decidir sempre tudo em conjunto, diz. Mais caseiro que a esposa, Antônio conta que não consegue escapar de um programa à noite quando a mulher quer sair: Ela gosta mais de passear do que eu e sempre me convence que eu tenho que sair com ela, brinca. Quando o assunto são finanças, Marluce também é quem convence o marido a gastar ou não.
Com o casal Alexandre Dias e Silvana Pereira Dias a situação é parecida. A diferença é que Silvana - professora, mas atualmente sem emprego - administra a casa in loco, é a verdadeira dona de casa, no sentido literal da expressão. O meu marido fica o dia todo trabalhando e não tem como ficar se preocupando com detalhes do dia-a-dia doméstico, casa, filhos, diz Silvana. Entre suas atribuições estão cuidar do orçamento doméstico, dos filhos e até mesmo do carro. Uma vez eu tive que levar o carro ao mecânico e aprendi muito sobre motores e pneus para não ser enrolada. Hoje, nenhum mecânico me engana inventado defeitos no carro só porque eu sou mulher, gaba-se. Silvana diz que não se acha especial por ter o controle da casa nas mãos. É uma questão de circunstância, precisávamos nos organizar e coube a mim o controle da casa. Não vejo nada demais nisso, afirma.
Na realidade, a mulher, de certo modo, sempre mandou em casa. A mulher historicamente foi criada para ser a responsável pelo lar, cuidar dos filhos e da cozinha, lembra a psicóloga Marisa G. F. de Oliveira. A diferença é que a mulher antes, não controlava as contas da casa, apesar de dar ordens para os empregados ou realizar os serviços domésticos. Hoje a mulher se preocupa mais com o aspecto financeiro porque o dinheiro passou a fazer parte da sua vida a partir do século passado quando saiu para o mercado de trabalho. Antes ela não tinha meios, e por isso, nem desenvolvia vontade própria de ter alguma coisa para si, tudo dependia do marido. Atualmente, a mulher se preocupa tanto com aspecto financeiro quanto o homem, explica.
No caso de Dalton Capiotto e Vanessa Húngaro, casados há dois anos, os comandos são invertidos, já que além de conviverem em casa os dois trabalham juntos na empresa de prestação de serviço da família. Na empresa, eu sou o patrão dela, em casa, ela é quem manda, decreta Capiotto, sem cerimônia. E o manda ele garante que não é força de expressão. Ela domina a situação mesmo e controla contas, compras, gastos, tudo. Quem administra a casa é ela, diz. No escritório a coisa é invertida, ela é uma funcionária como qualquer outra, afirma Capiotto, lembrando que também na empresa a atuação da esposa é muito importante, ela sabe de algumas coisas melhor do que eu.
De acordo com o casal, a combinação atual de tarefas funciona muito bem e o fato da mulher ser a chefe da casa não incomoda nem um pouco. Aquele pensamento machista de que o homem tem que mandar sempre está ultrapassado, é retrógrado. A mulher está cada vez mais ocupando espaço e é ela quem tem que administrar mesmo, define Capiotto.
Temperamento
A liderança feminina em casa, porém, não é uma regra geral. Algumas mulheres até acreditam que o homem deve ser o chefe da família e assumir essa postura em todas as decisões, como a doméstica Graziela Ribeiro, que diz que o marido é o homem da casa e por isso toma as decisões. Outras ainda afirmam que o marido é quem manda mas em apenas algumas situações. Meu marido é o chefe da família mas nem sempre a gente segue só a palavra dele, diz a balconista Maria Aparecida Miazato, casada há 18 anos.
De acordo com Marisa de Oliveira o temperamento e a maneira com que a mulher foi criada precisa ser levada em conta. Ao mesmo tempo em que algumas gostam de coordenar e de mandar em casa, outras podem não se sentir confortáveis nesse papel, por uma questão de cultura familiar, por exemplo, coloca. A operadora Andréa Oliver se encaixa nesse exemplo. Embora não se considere declaradamente a chefe da casa, ela confessa que o marido a chama de patroa porque ela sempre toma a frente em diversas situações. Eu sou ansiosa e não fico esperando por uma coisa que posso fazer na hora, por isso sempre me preocupo mais com as coisas e acabo tomando as decisões, diz. A advogada Lucinéia Antunes também é assim. Tomo conta de tudo, até das roupas dele porque gosto de ter tudo bem organizadinho à minha volta e não gosto de esperar por nada, explica.
Existem ainda mulheres que não querem assumir que mandam em casa, como se tivessem vergonha de afirmar que dividem com os maridos a direção do lar. Para a psicóloga, isso pode ser resquício de uma cultura machista. Ela ouviu tanto a vida toda que quem manda é o homem que sente vergonha de dizer que também tem opinião, afirma.
Bem resolvidos
A posição da mulher como chefe do lar não interfere no sucesso do casamento quando os dois são bem resolvidos quanto ao que esperam da relação e um do outro. Se o homem não tiver nenhum conflito mal resolvido com a sua figura materna, por exemplo, não corre o risco de passar a ver a esposa como uma mãe só porque ela administra o lar, afirma a psicóloga Elaine Olmo. Da mesma maneira, a esposa não deve acreditar que o marido é ausente por não tomar decisões em casa. A psicóloga explica que, em muitas situações, a mulher tem uma natureza dominadora e se sente bem por estar em comando, por isso não se importa se o marido não dá a última palavra, pois é assim que ela quer que seja. É claro que caso é um caso diferente e variações podem ocorrer, lembra.
Como afirma a psicanalista americana Susan Forward, autora do livro Comprando sua felicidade - Formas Saudáveis de se Relacionar com Dinheiro, no qual aborda como os casais lidam com o poder e o dinheiro, o importante é que nenhum dos dois use a sua posição de comando para menosprezar o outro ou que através dela se sinta desamparado. O casal existe para trabalhar em conjunto, com um completando o outro quando necessário, no trabalho ou em casa, define.
Mulheres é que decidem as compras
Aquilo que todo homem casado já sabia na prática foi comprovado pela Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap): as mulheres são responsáveis por mais de 70% das decisões de compras de produtos alimentícios e de higiene pessoal. Nos outros setores a participação feminina também é muito grande. A estimativa é de que elas decidam mais de 50% na hora das compras.
Fonte: Diário de São Paulo