Embora em caráter temporário, as paralisações da produção nas montadoras de veículos confirmam a tendência de queda no ritmo do crescimento industrial. Os trabalhadores voltam a lidar com o fantasma das demissões e com a perspectiva de redução da jornada e eventualmente cortes de salários. A queda da demanda de automóveis foi muito forte nos últimos meses e as empresas estão com estoques muito acima do normal em seus pátios. Para ganhar algum tempo enquanto o consumidor não reage, as montadoras dão férias coletivas e abrem novas frentes de negociação com os sindicatos em busca de acordos que evitem as demissões.
A redução da demanda de automóveis é conseqüência da redução do nível geral da atividade no País. As causas são conhecidas: o racionamento de energia que já dura um semestre afetou o ritmo da produção industrial, revertendo as expectativas de crescimento do PIB neste ano. Significa que a renda das pessoas não está crescendo como se esperava e o consumidor se retrai, adiando compras enquanto aguarda dias melhores. Os índices de desemprego, que apresentavam uma ligeira baixa desde o final do ano passado, voltaram a subir. Em setembro, na Grande São Paulo, a taxa de desemprego se aproximou de 18% (17,8% segundo o Dieese), o que significa uma população de 1 milhão e 400 mil trabalhadores fora do mercado. Mesmo com o oferecimento de juros diferenciados na venda de automóveis, menores dos que se praticam nos demais setores da economia, o consumidor, ressabiado, foge das prestações.
A produção automobilística é fator decisivo para o crescimento industrial e é a produção da indústria que por sua vez determina o ritmo da atividade econômica. A queda na produção industrial neste segundo semestre reduzirá a taxa de crescimento anual do PIB para 1,6% ou 1,7 %, quando no início do ano se acreditava numa expansão de 4% em relação a 2000. Com a taxa de crescimento da população em torno de 1.6%, a renda per capita será praticamente nula.
Há um fato novo que pode contribuir para evitar que o desemprego se generalize no setor automobilístico. A nova lei proposta pelo ministro Dornelles deve permitir uma flexibilização maior nas relações trabalhistas. Não serão retiradas as vantagens obtidas pelos trabalhadores, mas a lei poderá criar algumas condições para facilitar o relacionamento das empresas com seus funcionários, de forma a evitar a medida extrema do corte de postos de trabalho. Abre caminho para negociações que permitam a redução da jornada de trabalho e dos níveis de salário, que poderão ser restabelecidos tão logo a situação melhore. Nas atuais circunstâncias, essa flexibilização é importante porque permitirá a manutenção dos empregos no setor industrial.
(*) Antonio Delfim Netto é deputado federal pelo PPB-SP, professor emérito da USPE-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br