Geral

A questão de fundo

Jorge Boaventura
| Tempo de leitura: 3 min

Desde o 11 de setembro que, segundo entendemos, explicitou o ponto de inflexão em que teve início a entrada em declínio irreversível do formato civilizacional que, desde há muito, muito tempo, vem sendo corrompido e desvirtuado pela desvinculação progressiva das raízes culturais de que proveio o noticiário internacional, ainda que maquilado por evidente manipulação, dá-nos conta da guerra assimétrica em curso.

Tal modalidade de guerra tem peculiaridades sem precedentes históricos, o que torna o seu desdobrar e as avaliações acerca do futuro, difíceis de antever, clara e antecipadamente. Por exemplo, quais são, de fato, os contendores? Quem, de fato, teria perpetrado os atentados do 11 de setembro? Quais teriam sido, realmente, as suas motivações e os seus objetivos? Por outro lado, quem são, e o que, efetivamente, defendem os que se apresentam como representantes do Bem e fazem chover devastadora massa de explosivos sobre um povo miserável e sofrido ainda que, de fato, até agora, não tenham sido apresentadas provas irretorquíveis acerca da culpa do sr. Bin Laden e dos seus seguidores, na realização dos referidos atentados do 11 de setembro? O que tem levado seres humanos, não apenas a matar outros seres humanos mas, também, para fazê-lo, a imolarem as próprias vidas? Por que será que, não apenas nos países periféricos, mas até nos que compõem o chamado 1.º mundo, os povos arcam com tremendas dívidas, quando não externas, mas apenas internas, cujos serviços atuam como ventosas ou sanguessugas do produto do seu suor? Os próprios EUA têm uma dívida interna de alguns trilhões de dólares, cujo serviço sai do bolso do contribuinte, pela via de impostos que poderiam ter destinação mais nobre e mais justa.

A questão de fundo, pois, parece-nos, radica em um sentido absurdo de vida, em frontal contradição com o significado das raízes culturais judaico-cristãs de que brotou a civilização agora declinante pela via da corrupção, sentido que tem erigido a satisfação das necessidades corpóreas como objetivo único e obsedante da vida humana. Tal disparate levou ao absurdo de um consumismo insaciável e sem fim que, na prática, tem levado a uma concentração de renda mais do que evidente, com o aprofundamento crescente da diferença entre pobres e ricos, não apenas dentro de cada sociedade nacional, como das diferentes sociedades nacionais, no âmbito internacional. E, os que, por trás das cortinas, brandindo pretextos válidos, continuam, segundo supõem, a locupletar-se com os frutos das injustiças estruturais que engendram. E, o que é ainda mais grave, para que as vítimas daquelas estruturas viciadas não reajam, prestigiam, em nome da liberdade, cujo significado corrompem e aviltam, fazendo-o, na prática, transformar-se na mais escancarada e crescente licenciosidade.

É que, sociedades assim corrompidas e viciadas, perdem a capacidade de reagir, objetivo a ser alcançado pela ínfima minoria dos que se supõem beneficiários da ordem, ou desordem, que implementaram e buscam manter. Mas, acreditamos, existe um 2.º plano da História, o Providencial. E este, aparentemente, face ao desvario dos homens, está produzindo o conflito assimétrico a que nos estamos referindo e que, contrariamente ao que alguns podem imaginar, está longe de ter chegado ao final que, acreditamos, será marcado pelo surgimento rápido de uma nova civilização, melhor, muito melhor, do que esta sobre cujos escombros aquela brotará. Uma nova humanidade para a qual seja claro, por exemplo, que violência jamais será compatível de modo realmente eficaz com violência, mas com justiça. Justiça cuja falta não justifica aquela, mas pode explicá-la.

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