Auto Mercado

Quebrando preconceitos

Marcelo Ferrazoli
| Tempo de leitura: 5 min

Até pouco tempo, as mulheres eram vistas como o sexo frágil, principalmente a bordo de um automóvel. Quando homens as encontravam ao volante então, estas eram obrigadas a ouvir os mais variados impropérios: “vai lavar roupa, dona Maria”, “lugar de mulher é na cozinha”, “mulher só sabe pilotar fogão”, “tinha que ser mulher”, e por aí afora.

Atualmente essa postura machista perdeu um pouco a força. Hoje o mesmo homem que mandava as mulheres voltarem para o tanque acabou se tornando minoria, pois tem dado espaço para um cidadão mais compreensivo com o sexo oposto.

As próprias mulheres já sentem essas diferenças. Além de reconhecidas boas motoristas, a ponto de receberem desconto das seguradoras, também passaram a competir e a trabalhar em pé de igualdade com os homens em ambientes tradicionalmente masculinos, como o do mercado automobilístico.

Há exatos seis dias da data internacional de homenagem às mulheres, exemplos disso não faltam. As bauruenses Fabiola Simão Garcia e Priscila Maria Braga Simão trabalham na recepção da oficina de uma revendedora de automóveis da cidade. A função lhes reserva as mais diferentes atividades, como o atendimento aos clientes e o relacionamento direto com os mecânicos, que elas asseguram ser bom. “Eles sempre nos respeitaram”, afirmam.

Antes de chegar à oficina, Priscila, há 11 anos na empresa, atuou nos setores de consórcios e vendas. Já Fabiola soma nove anos na firma, sempre na atual ocupação. Ambas admitem gostar da atividade e, principalmente, de carros. “Quando viajo, às vezes para o exterior, fico prestando atenção para ficar tirando fotos dos veículos diferentes que encontro”, diz Fabiola.

Mas Fabiola e Priscila não se limitam apenas a recepcionar os fregueses e auxiliar os mecânicos no que precisarem. Elas também colaboram para dar um toque feminino na oficina. “Damos bastante palpites aqui e aproveitamos para dar uma decorada no ambiente, o que os homens não faziam antes. Para eles bastam ter o prédio de concreto armado e mais nada”, brincam elas.

A simples presença das duas no local, segundo Fabiola e Priscila, já serviu para aumentar o fluxo de mulheres dentro da oficina, que não se sentiam muito à vontade por haver somente homens. “Com o tempo elas começaram a freqüentar a oficina, o que não acontecia antes, bem como a comprar os veículos. Antigamente eram os maridos que traziam os carros para efetuar os consertos e, hoje, elas até já fazem isso”.

Mas quem pensa que elas não sabem nada de mecânica está enganado. Ambas enfatizam que a convivência no meio as ajudou a compreender muitos conceitos dos veículos. “Com o tempo fomos aprendendo o básico. Chegamos até a pensar em estudar mecânica, mas ficamos impossibilitadas pela falta de tempo.”

Preconceito ainda existe

Mas ser mulher num ambiente predominantemente masculino não é viver só em um mar de rosas. As dificuldades começam nos cuidados com o vestuário. No verão, saias e vestidos às vezes têm de ser abolidos. “Temos de vir trabalhar de calça, pois freqüentemente estamos passando perto de valetas, onde sempre há mecânicos trabalhando”, diz Priscila, rindo.

Mas o mais complicado, conforme elas admitem, é mesmo o preconceito que ainda teima em existir na cabeça de alguns clientes homens. Estes, às vezes, recusam-se e ignoram a ajuda das recepcionistas. “Tem gente que entra na oficina e, quando perguntamos se podemos auxiliar, eles vão logo perguntando dos mecânicos. Acho que ao fazer isso, depois de ter olhado para uma mulher, o cliente quis dizer “me chama alguém que entende de carro”, destaca Priscila, bem humorada.

Apesar disso, elas enfatizam que tais fregueses de perfil mais conservador são minoria. Geralmente, segundo as recepcionistas, estes são pessoas mais idosas. “Apesar disso, muitos homens elogiam o tratamento dispensado e só ligam para a gente solicitando agendamento e como proceder para o conserto do veículo”, ressaltam Fabiola e Priscila.

Casos curiosos

Casos curiosos não faltam para as recepcionistas contarem. Um deles ocorreu com Priscila. Com um orçamento em mãos dos serviços a serem executados em um automóvel, ligou para uma unidade da marca em determinada cidade para passar a lista das peças.

Em determinado ponto da conversa telefônica com um rapaz que Priscila falava pela primeira vez, o mesmo a questionou sobre a utilização do termo “caneta da direção hidráulica”. “Ele disse que tal expressão e o equipamento não existiam mais. Fiquei assustada, pois além de ser hora do almoço tinha várias coisas para fazer”, conta ela.

Na seqüência, já após o almoço, Priscila resolveu perguntar para o mecânico da firma o porquê dele ter colocado aquele termo. Com a resposta ela acabou fazendo uma descoberta: tinha caído em uma brincadeira do seu interlocutor telefônico. “O mecânico me garantiu que o termo era usual. Então, conclui que o cara estava tirando uma comigo. Depois, liguei para ele para falar que não estava errado meu orçamento e, a partir do momento que ele soube que eu era uma das filhas do proprietário, o tratamento dele comigo mudou completamente”, destaca ela.

Em outra oportunidade, Patricia viajava sozinha em seu veículo com destino a São Paulo. Eram cerca de 10 horas e a recepcionista tinha de chegar antes das 14 horas para fazer uma prova. Entretanto, seu carro quase chegou a ferver e, por isso, precisava parar em períodos regulares para esfriar o motor. “Tinha que agir assim, pois sei que se o propulsor fervesse os prejuízos seriam grandes”, frisa ela.

Ao chegar em um posto dirigiu-se diretamente para uma auto-elétrica. Mas, consciente da situação em que se encontrava, foi logo avisando: “Falei para o eletricista que tinha uma oficina em Bauru e o alertei que se precisasse trocar uma peça ligaria antes para confirmar a real necessidade. Ele colocou água no radiador, pediu para acompanhar o marcador da temperatura e não arriscou a fazer nenhum orçamento”, conclui Priscila.

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