Ser

Os gays confiam nas mulheres

Luly Zonta
| Tempo de leitura: 5 min

Assumido ou não, à primeira vista todo gay elege sempre uma melhor amiga. Apesar da opção ou da orientação homossexual, ele continua sendo um homem e poderia ter amigos do mesmo sexo. Mas não é o que acontece.

“Por que os gays se tornam amigos de mulheres? Questão complicada esta, vou me afastar para poder responder. Gosto de crer que tenho vários melhores amigos e não um ou uma, tenho coração de mãe...”, brinca o empresário carioca Álvaro, 39 anos.

Numa avaliação séria e sincera, ele acredita que as mulheres sentem-se mais à vontade com a homossexualidade masculina. “Os amigos homens, heteros, normalmente não ficam confortáveis quando um amigo se revela gay.”

Álvaro aponta ainda que é normal que gays, isolados do mundo hetero, acabem por se apegar a quem lhes ouve, lhes dá ombro. Para o empresário, as mulheres são mais sensíveis a isso e acabam suprindo esta carência, já que normalmente não há uma tensão sexual nesta relação.

“Fica mais fácil abrir a guarda...”, brinca novamente. “Daí nasce a cumplicidade, o companheirismo e amizades sólidas.”

A tendência de que todo gay tem como base um grande amiga, também se confirma com Hugo, um dentista de 35 anos. Para ele, a afinidade tem vários motivos, mas o primeiro é o fato de ambos gostarem de homens e poderem conversar sobre o assunto. “Como conversar com um homem sobre o quão bom é estar com outro!!! (risos)”

Hugo ressalta que, como a mulher, o gay é dotado de uma sensibilidade mais desenvolvida, portanto a comunicação fica muito mais fácil e a compreensão é muito mais verdadeira.

“Pensando ainda nessa questão da sensibilidade, quem teria paciência para ouvir um desabafo sobre o fim de um relacionamento entre dois homens? Claro que uma mulher! Um hetero não teria paciência não por não querer, mas por não ter tato, sensibilidade para entender e tentar auxiliar de alguma forma. Portanto, ter uma amiga, ajuda muito. Ela tem muita coisa em comum e sempre poderá suprir carências de compreensão que, certamente, a atual sociedade não compreenderia”, desabafa.

Festas, babados e afins

“Conheço inúmeros casos de gays que têm melhores amigas e que, além de pedirem conselhos, saem juntos para dançar, festejar e são capazes até de contar os segredos e tudo o que acontece na intimidade”, revela Eduardo Caram, 25 anos, executivo de negócios.

Apesar dessa total liberdade, Caram se considera muito fechado para contar detalhes de sua vida sexual. “Costumo sim, conversar, pedir conselhos, sair para as baladas com as meninas, mas meu melhor amigo mesmo é um homem, ou melhor, outro gay. Acho que tenho um melhor amigo homem, porque a situação dele é parecida com a minha: não assumido. Quero dizer, publicamente. Ambos temos uma profissão que exige um certo sigilo, e, como eu, ele não pensa em sair por aí tão cedo, levantando a bandeira da homossexualidade”, desabafa.

O executivo conta que estabelece um vínculo forte de amizade com uma mulher pelo fato dela compreender muito bem não só o que ele pensa, mas as dificuldades de um relacionamento homossexual. “Os conselhos são os melhores, pois, querendo ou não, elas estão ligadas diretamente com o mesmo objetivo que o seu, os homens... (risos).”

O sigilo também é outro ponto ponderado numa amizade. Não é para qualquer amiga, mesmo sabendo de sua condição, que Caram vai contando tudo. “São raras as amigas que posso afirmar que tenho confiança nas coisas que falo e comento sobre minha vida gay. Muitas ainda não sabem respeitar e saem por aí comentando. A confiança em uma amizade, a liberdade de expressão e o respeito que elas nos proporcionam são inigualáveis e determinantes.”

Para ele, uma amiga fiel e heterossexual é como se tivesse uma pessoa da família com quem pudesse conversar e desabafar sem preconceitos e... “de igual para igual”.

“Só tem um problema na amizade entre um gay e uma amiga hetero: a disputa!!!! Nem tudo que reluz é ouro. Quando para ela não dá jogo, você acaba levando o prêmio... (risos).”

Profissional de moda e estilo, Alex, 28 anos, vai mais além. Ele afirma que, geralmente, as mulheres gostam dos gays porque eles são “metade de cada sexo”.

“Gostamos de perfumes, cosméticos e sabemos de coisas que jamais os homens saberiam Temos feeling masculino e feminino. É isso que encanta as mulheres. Hoje, tenho uma boa amiga, mas o meu melhor amigo é gay. Nascemos no mesmo dia, mesma hora e local. Pode?”

____________________

'Não vivo sem eles'

“Descobri que meu melhor amigo era gay muito tempo depois de nos tornarmos amigos. Não tinha nem percebido. Minha surpresa durou cinco minutos e nossa amizade dura mais de dez anos. Nesse período, encontrei mais meia dúzia, no mínimo, de amigos lindos, inteligentes, cheirosos, bem vestidos, companheiros fiéis e, obviamente, gays.

Cada um se assume (ou não) à sua maneira, uns afetados, outros discretíssimos. Eu respeito, afinal todos sabem me escutar. Aliás, estão sempre dispostos a ouvir e ajudar a resolver, seja um problema sério ou uma unha quebrada. Estão sempre dispostos a ir a uma balada, pegar um cinema, um teatro, discutir futilidades, passear no supermercado. E estão sempre de bom humor. Jamais deixam uma amiga sozinha no sábado à noite, nem quando estão namorando. Que homem faria isso!”

Ana Laura, 30 anos, atriz

____________________

Afinidade e necessidade

O psicólogo e psicoterapeuta Ricardo Mokdici aponta que não é uma regra, mas o homossexual masculino ou gay tem nas mulheres heterossexuais grandes amigas por se sentirem mais à vontade para expor suas questões e vice-versa.

“A mulher é naturalmente mais sensível e as pessoas mais sensíveis acabam se tornando mais próximas. Talvez esse seja o maior ingrediente deste contato maior de um gay e uma mulher. Ele não tem vergonha de abrir seus sentimentos, coisa que um homem hetero e bem resolvido deveria fazer e não consegue. Aliás, nessa nossa sociedade, homem ainda nem chora e são raros os que têm uma melhor amiga de verdade. Eles sempre se fecham no mundo deles”, alerta.

Outro ponto que para Mokdici podem influir nessa aproximação é o dito popular de que “mulher não pode confiar em mulher”.

Dessa forma, um homem mais sensível é o amigo ideal e não oferece perigo maior, não vai fazer jogos de interesse sexual. Ao mesmo, tempo se tiverem gostos semelhantes poderão se apaixonar pelo mesmo homem.

O psicoterapeuta aponta que, independentemente da orientação sexual, numa relação de amizade cada um deve impor seus limites e expor ou não os seus segredos. “Só é preciso contar e discutir o que se tem de fato necessidade.”

Comentários

Comentários