A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) aprovou esta semana a participação de treineiros - estudantes que ainda não concluíram o curso de direito - no exame que garante aos alunos já formados a condição legal para o exercício da profissão. Segundo o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, a decisão atende a uma antiga reivindicação dos estudantes de direito. “O objetivo é proporcionar um primeiro contato com o exame da Ordem, com o fim exclusivo de treinamento”, diz D’Urso.
A medida estará valendo já para próxima edição do exame, prevista para o mês de dezembro, mas ainda sem um dia definido. O exame poderá ser feito por qualquer aluno do curso de direito, independente do ano que está cursando, mas o treineiro participará apenas da primeira fase (prova composta de 100 questões de múltipla escolha). A prova será a mesma do candidato formado, mas será feita em sala separada. A taxa de inscrição também será mais barata ao treineiro - R$ 30,00, contra os R$ 130,00 do candidato já formado.
A notícia foi festejada pelos coordenadores dos cursos de direito oferecidos na cidade. Para o diretor da Faculdade de Direito da Instituição Toledo de Ensino (ITE), José Roberto Martins Segalla, a possibilidade permitirá que os alunos “sintam o ambiente” do exame.
Ele lembra que a ITE já adota as provas da OAB em salas de aula como material de estudo e que os alunos realizam simulados com freqüência. “Mas não é a mesma coisa. Na sala de aula, o comportamento é diferente do verificado numa prova de verdade, ocasião propícia para que ele aprenda a dominar os nervos”, avalia Segalla.
Carlos Roberto Simioni, coordenador do curso de direito da Universidade Paulista (Unip) Bauru, faz coro a Segalla e destaca que a medida é mais um canal para o acadêmico medir seus conhecimentos a tempo de alterar seu plano de estudos antes da enfrentar a prova após a formatura. “É uma boa oportunidade para o aluno conhecer o sistema da prova e principalmente o seu grau de dificuldade”, diz Simioni, para quem o exame da Ordem é tão complexo quanto os realizados para ingresso no Ministério Público e na magistratura.
O presidente da subseção da OAB em Bauru, Edson Reis, também avalia a medida como positiva, mas admite que seu objetivo principal pode ser o de minimizar a incômoda situação criada a partir dos “lastimáveis” índices de aprovação - na última edição do exame, foram aprovados apenas 18% dos candidatos de Bauru e 13% do Estado de São Paulo.
Para ele, estes índices expõem a baixa qualidade do ensino jurídico praticado em muitas instituições. “As faculdades preparam os alunos para os concursos de carreira (MP, magistratura), mas não o fazem convenientemente para o exercício da advocacia”, diz Reis, ao ressaltar que o exame da Ordem é composto por questões práticas da profissão. O dirigente também critica a proliferação de cursos, o que estaria comprometendo a qualidade da formação.
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‘Mercado de cursinhos’
Na contramão das instituições de ensino e da própria OAB, o presidente do Centro Acadêmico IX de Julho da Faculdade de Direito da ITE, Jorge Moura, vê a abertura do exame da Ordem a treineiros com ressalvas pois criaria, segundo sua avaliação, um cenário favorável à proliferação dos cursos preparatórios ao exame da Ordem. “Não podemos participar de mais um mercado criado em torno e às custas de uma educação deficiente”, diz.
Para ele, como a prova é liberada a alunos de qualquer ano do curso, os treineiros irão se defrontar com questões que sequer foram apresentadas. “Muitos alunos vão achar que não sabem nada e já começarão a pensar em recorrer aos tais cursinhos preparatórios”, acredita Moura, ressaltando que missão de preparar os alunos deveria ser restrita às faculdades.
O coordenador pedagógico de um conhecido curso preparatório ao exame da OAB com filial em Bauru foi procurado ontem na Capital para comentar a questão, mas até o final da tarde não havia atendido a reportagem.
Além disso, diz o dirigente estudantil, o exame da OAB é público e já vem sendo utilizado pelos professores nas salas de aula, o que derrubaria o argumento de tornar a prova conhecida através o acesso liberado ao treineiro. Moura também contesta o “mito da dificuldade” que se criou em torno do exame da OAB. “A prova não possui um nível exagerado. O que existe é uma enxurrada de alunos despreparados, fruto da criação desenfreada de novos cursos”, protesta.
Para o diretor da Faculdade de Direito da ITE, José Roberto Martins Segalla, a corrida aos cursinhos preparatórios seria inevitável, principalmente a partir da divulgação dos baixos índices de aprovação. Para ele, porém, tal situação seria motivada mais pelo direcionamento “equivocado” do exame, que privilegia a memorização de temas e artigos dos códigos em detrimento do raciocínio.
“A faculdade deve ensinar o aluno a raciocinar, refletir e criar soluções, mas a prova exige dele que decore algo que pode ser consultado em livros”, argumenta. “Esperamos por mudanças no exame, pois a própria OAB já admite que algumas críticas são procedentes”, completa Segalla. Para ele, porém, o rigor da prova deve ser mantido como forma de conter a proliferação de cursos de direito no País.