Comprar uma arma clandestina em Bauru é fácil, apurou o Jornal da Cidade. Dois itens são essenciais para que o negócio seja efetivado e um está atrelado ao outro: dinheiro e confiança. Sem o dinheiro não há encomenda e sem a confiança, não há entrega. Se o seu desejo é ter um revólver calibre 38, ele pode estar em suas mãos em até 48 horas, mas se a opção for por uma arma mais sofisticada, o prazo pode ser maior: uma semana, no máximo. Esta é a realidade do comércio ilegal de armas que ‘pipoca’ nos bairros periféricos de Bauru, assim como nos grandes centros.
A entrega é garantida, desde que o comprador tenha o dinheiro na mão, nota, sobre nota no valor combinado. A confiança entre as partes é a chave do negócio. Sem ela, nem mesmo com o dinheiro o interessado consegue fazer a compra, avisa um comerciante do ramo.
Como no comércio legal, a escolha é feita antecipadamente. O comprador tem que definir, pelo menos, o calibre da arma a ser adquirida. Depois da escolha, num prazo máximo de uma semana o negócio pode ser fechado. O preço varia de R$ 250,00 a R$ 800,00, dependendo da arma, mas o pagamento é feito somente à vista.
Uma arma ‘carregada’ de crimes sofre desvalorização (queda de preço), enquanto aquela que foi usada num crime ‘famoso’ tem seu valor aumentado. Outro item que influencia no preço é o tipo de armamento. Um revólver calibre 22 ou 38 tem o mesmo valor, já a pistola é a mais cara e também a mais difícil de encontrar.
O comércio de armas ilegais é semelhante ao de drogas em vários aspectos. O mais importante deles é que, ao mesmo tempo, são sinônimo de exclusão e união. Exclusão da sociedade e união entre o grupo envolvido no negócio ilegal, porque essa perigosa prática faz com que as pessoas que vivem essa rotina aumentem os laços de solidariedade e fidelidade.
Tentar chegar ao ‘chefe’ do negócio é missão impossível. Ninguém abre a boca para falar sobre o assunto. Por ele, seus subordinados são capazes de enfrentar a cadeia. Quem ousar ir além do permitido pode ter sua cabeça a prêmio, como eles mesmos dizem para alertar que podem ser mortos.
Nesse mundo desconhecido da maioria da população, sobreviver a qualquer custo é a lei maior. Em nome da sobrevivência vale tudo, inclusive fazer comércio de armas e drogas. Excluídos pelo Estado, essa parcela da população vive de favores dos chefes que sustentam suas famílias e os apóiam nas horas difíceis. As regras de sobrevivência são ditadas por normas nada convencionais e mostram, antes de tudo, o quanto a sociedade se distanciou da população mais carente.
Em Bauru, os bairros onde se adquire com mais facilidade uma arma ilegal são: Fortunato Rocha Lima, Jaraguá, Ferradura Mirim e Pousada 1 e 2. Estima-se que haja pelo menos mil armas clandestinas em circulação na cidade. Contudo, o número não é real, já que não há levantamento sobre isso. O cálculo foi feito com base nas apreensões realizadas nos primeiros três meses deste ano.
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Organização criminosa interiorana
A chegada dos presídios no Interior paulista foi o ao ponto inicial da criminalidade organizada. Mesmo presos, os marginais conseguem administrar o negócio de armas e drogas ocorrido fora das muralhas.
O chefe nunca aparece e quem delatá-lo assina o atestado de óbito, explica um dos “meninos do crime” entrevistados pelo JC. “O cara tem que ser homem e assinar sozinho. O delator é morto. Todos nós estamos preparados para ir para a cadeia, nunca delatar.”
É o chefe que fica com a arma, ou que sabe onde ela está. “A gente vende para ele e ganha até a metade do valor. Pegamos o dinheiro e entregamos para ele, e ele nós dá a arma para ser entregue para o comprador.”
A venda não é grande, adverte o adolescente. “A gente vende uma por mês. As pessoas querem armas para se defender, para segurança própria, porque tem muita gente ameaçada”, comenta.