Sabe o salto do Sting no meio do palco, com as pernas juntas e dobradas, ao lado de Andy Summers e de Stewart Copland? É uma imagem bem rock’n’roll, muito usada nessa turnê mundial do Police, nas propagandas do show. Pois bem, eles reproduziram esse salto no palco do Maracanã, durante “Roxanne”. Mas se você não foi à apresentação e viu tal foto nos jornais ou na Internet, é capaz de pensar que foi uma noite muito alucinante. Não foi.
O show foi altamente competente, profissionalizado e irrepreensível em aspectos objetivos. Mas está domesticado e o Maracanã não tremeu. Sting é um ótimo cantor e baixista. Summers, um grande guitarrista. Copland, um talentoso baterista. O que se ouviu foram 20 músicas sensacionais, 15 delas hits incontestáveis, tocadas por três vovôs sem tesão nenhum. No geral, os arranjos das canções, iniciadas por “Message in a Bottle” (1979), às 21h32, estavam bem próximos dos originais. Mas a guitarra permanecia baixa e conduzida pelo baixo onisciente de Sting.
A segunda música, “Synchronicity 2” (1983), calcada principalmente em cima de um riff de guitarra nervoso, ficou parecendo parte da carreira solo do baixista, frouxa. Andy Summers só se soltava nos solos, quando lhe era permitido tocar alto.
Ponto alto visual: o baixo velho de Sting, todo arrebentado, remendado e descascado.
Ponto alto sonoro: “Can’t Stand Losing You” (1978), maravilhosa, pesada, digna de um estádio lotado.
Ponto baixo visual: os dinossauros ridículos que interagiam com os músicos em sépia durante “Walking in Your Footsteps” (1983). Outro: as fotos de crianças com feridas no rosto durante “Invisible Sun” (1981).
Ponto baixo sonoro: “Wrapped Around Your Finger” (1983), arranjada com motivos orientais, cheia de maquiagem, digna, aliás, da área VIP repleta de globais.
Uma olhada na lista de músicas do show dá a sensação errada de que o Police está mais punk do que nunca. Das 20, seis estão no álbum de estréia, “Outlandos d’Amour” (1978), cinco são de “Zenyatta Mondatta” (1980), e cinco de “Synchronicity” (1983), o quinto e último álbum. “Regatta de Blanc” (1979) e “Ghost in the Machine” (1981) compareceram com duas canções cada.
Ora, esse privilégio de “Outlandos d’Amour” - sem falar que, das seis últimas músicas do show, quatro saíram dele - passa a impressão de uma festa com rocks rápidos e pesados, cantados aos gritos. E é justamente daí que saíram alguns dos melhores momentos do show, como “So Lonely”, cuja execução foi animal. Nessa hora, parecia mesmo que a banda iria desembestar.
“Roxanne” finalizou a primeira parte do show. Muitos aplausos e pedidos, mas nem precisava. Como muita coisa nessa apresentação, os dois biz estavam milimetricamente programados. Minutos depois do final do show, às 23h20, o primeiro bis teve “King of Pain” (1983) e “So Lonely”. O último bis reservava o maior sucesso da banda, “Every Breath You Take”, com sua terrível letra sobre namorados psycho, e “Next to You”, a primeira música do primeiro álbum.
Mas, na derradeira, o punk cedeu ao pop novamente. Sting rebolou, agradeceu em português - no início, havia dito “Que saudades do Brasil” -, mas não convenceu. É provável que o Police tenha convencido os tios e vovôs da platéia. Afinal, eram os hits de sua juventude, coisa suficiente para arrancar suspiros e marejar olhos. Mas levar um filho de 17 anos para o Maracanã e dizer que esses caras eram, talvez, os melhores há 30 anos, isso, de fato, seria humilhante.
Dezenas de textos sobre a vinda do Police ao Brasil não resistiram à piada de chamá-los de “Tropa de Elite”, em alusão ao sucesso dos cinemas. Mas Sting não é Mick Jagger; e Summers muito menos é um Keith Richards, que, há quase dois anos, desfilaram seus sucessos no Rio. Mas aqueles vovôs ingleses pareciam carregar o tal do tesão que faltou a esses.