Fundada pelo general cartaginês Asdrúbal, o Belo, em 228 a.C., Cartagena é hoje um museu a céu aberto onde se pode interpretar a história de diferentes civilizações. Situada no sudeste da Espanha, na província Autônoma de Murcia, Cartagena continua sendo um porto influente do Mediterrâneo, como o foi na Antigüidade.
A cidade é um dos principais destinos turísticos da Europa, não só pela sua origem milenária, mas também por aqueles que procuram suas águas mornas para temporadas de descanso e lazer. “Porto de Culturas” é como seus habitantes resolveram denominar a cidade pelas manifestações artísticas que lá ocorrem o ano todo, como o Festival Mar de Música, quando se reúnem intérpretes e compositores do mundo todo.
Os sítios arqueológicos, evidentemente, são o seu maior tesouro. As marcas deixadas ao longo dos séculos pelos fenícios, cartagineses, romanos, mouros e bizantinos e castelhanos são consideradas Patrimônio da Humanidade pela ONU.
A baía de Cartagena é repleta de fortalezas militares e baterias de canhões encravadas na rocha. Essas fortificações tornaram o porto o mais bem protegido do Mediterrâneo. Até hoje a frota da Marinha de Guerra da Espanha tem ali seu atracadouro e estaleiro. A base de submarinos, por exemplo, foi escavada na rocha junto ao mar durante a Segunda Guerra Mundial. Em tempos de paz guarda os torpedos e serve de depósito de peças de reposição.
Na pequena península onde está a cidade, rodeada de colinas, podemos conhecer os vestígios da Muralha Púnica - púnico, do latim “poenicia”, como era denominado o conquistador cartaginês, ou seja, aquele que tem ascendência fenícia.
Cartago era do outro lado do Mediterrâneo, no Norte da África, onde hoje está a Tunísia. Disputava com os romanos a hegemonia do comércio e a navegação naquele mar. Para fortalecer sua posição na Península Ibérica, o comandante cartaginês Asdrúbal, o Belo, fundou a cidade que chamou de “Nova Cartago”, hoje Cartagena.
Das montanhas vizinhas extraíam minérios de prata, ferro e chumbo para manutenção dos exércitos e para combater os romanos.
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Aníbal e os elefantes guerreiros
Foi de Cartagena que Aníbal (218 a.C.), irmão de Asdrúbal, saiu com seu exército para surpreender os romanos pelo costado, na Segunda Guerra Púnica. Atravessou os Alpes nevados com milhares de soldados treinados segundo as táticas de Alexandre, o Grande.
Até hoje se discute como o general cartaginês conseguiu a proeza de cruzar tamanhos obstáculos naturais, como as montanhas altíssimas, onde a temperatura chega a 20 graus negativos. Roma jamais poderia supor que por ali penetrasse um exército inimigo.
O projeto de Aníbal chegou a ser chamado de “delirante”. Venceu a sua obstinação. Além da infantaria e da cavalaria, conseguiu conduzir pelos despenhadeiros, em meio a tempestades de neve, a sua “arma secreta”: elefantes. Ninguém, além de Alexandre contra Dario III (313 a.C.), na Pérsia, jamais havia utilizado esses paquidermes com objetivos militares.
A cavalaria dos exércitos inimigos não havia sido treinada para confronto com aquela estranha espécie animal que só existia na África e na Índia. Os cavalos aterrorizados diante da aparição, cheiro e barrido dos elefantes, relinchavam e empinavam até se livrarem dos cavaleiros para fugir a galope na direção contrária.
Como essas, há muitas histórias em Cartagena suficientes para satisfazer estudiosos da paleontologia e os simplesmente curiosos. O esplendor de Roma, que acabou vencendo a Terceira Guerra Púnica e anexando a Hispânia ao seu Império, ali se mostra como algo que ainda estivesse palpitando nos dias de hoje.
O Museu do Teatro Romano, a Casa da Fortuna e o Augusteum são só alguns dos exemplos. Na verdade, as ruas de Cartagena são um gigantesco espaço temático-cultural. A caminhada na orla passa pela Muralha do Mar (1771-1788), erguida por Carlos III junto ao porto, e vai até a arquitetura eclética da cidade do século XIX, em seu calçadão.
* O jornalista e professor da Unesp viajou a convite do Centro Oficial de Turismo Espanhol, da Ibéria e do Turismo de Múrcia.