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Entrevista da semana: Julinho do Sereno

Ana Paula Pessoto
| Tempo de leitura: 9 min

‘Batida do samba é como o pulsar do coração’

Sorriso de satisfação, desses que só são possíveis em rostos de pessoas que estão vendo seu maior sonho se realizar. Assim é a expressão de Júlio César Correia, o Julinho do Sereno, que depois de dez anos de estrada, vê seus sonhos realizarem e um futuro bastante promissor para seu grupo de samba.

Nascido em Bauru, cidade pela qual é apaixonado, ele relembra das proezas que fazia pelas ruas quando criança, das vezes que jogava bola pelos campinhos de futebol improvisados, numa época que sonhava em ser jogador de futebol. Sonho não tão grande quanto o de ter uma carreira de sucesso como cantor de samba.

Dono de uma criatividade musical invejável, Julinho desenvolveu com o Sereno uma nova forma de fazer música: o grupo misturou o samba do carioca com o sertanejo do caipira, cavaco e viola. A dançante mistura chamou a atenção de empresários do ramo e está impulsionando o Sereno para o sucesso além Bauru.

Além de lutar para o Sereno brilhar, Julinho quer, com o grupo, derruba o preconceito que ainda haja com relação à mistura de sons e de sotaques nacionais que, para ele, só enriquecem a cultura brasileira.

JC - Como foi a sua infância?

Julinho - Não fui um garoto diferente dos outros. Gostava de brincar na rua, jogar bola e caçar pássaros. O que me diferenciou da maioria das crianças foi o fato de eu ter tido contato com a música desde muito cedo por ter músicos na família.

JC - A música chamava a sua atenção quando criança?

Julinho - Muito. A música me despertava um sentimento bom. Na época meu bairro tinha escola de samba, a Império da Nova Esperança. Eu participava dos ensaios, da elaboração do enredo, da bateria. Enfim, meu contato musical com o samba vem desde a infância. Posso dizer que a música foi uma das minhas paixões quando criança.

JC - E quais foram suas outras paixões de menino?

Julinho - Ah, o futebol e a música foram minhas paixões. Eu adorava jogar bola pelos campinhos da cidade. Cheguei a disputar pequenos campeonatos. Posso dizer que meu tempo era dividido entre o futebol e a música.

JC - Em que momento o amor pela música falou mais alto?

Julinho - Chegou um momento na adolescência em que tive que decidir. Ou seria um atleta, ou seria um boêmio. E a música bateu mais forte. Eu já tinha contato com algumas pessoas do meio e decidi correr atrás desse sonho.

JC - Por que a escolha do samba?

Julinho - Isso é uma coisa interessante porque na nossa região o que prevalece é o sertanejo. Eu acho que foi pela tradição das escolas de samba que havia em Bauru quando eu era criança. Era o melhor Carnaval de rua da região que, infelizmente, não tem mais. Eu morava muito perto da escola Império da Nova Esperança. Gostava demais. Através das escolas fui conhecendo os sambas de enredo. Quando me dei conta estava tocando cavaquinho.

JC - Teve aulas?

Julinho - Escute que engraçado. Um tio que toca violão disse que me ensinaria o instrumento. Ele pagou seis meses de aulas particulares para mim. Até que um vizinho me emprestou um cavaquinho dele. O incrível foi que, em uma semana, eu estava tocando melhor esse instrumento que o violão, que passei meses aprendendo.

JC - Acha que nasceu para isso?

Julinho - É uma coisa que já estava dentro de mim. Sou autodidata. Peguei o instrumento e já comecei a tocar, depois fui me aperfeiçoando.

JC - Você sempre quis ser cantor?

Julinho - Sim. Cheguei a cursar três anos de psicologia na faculdade mas tive que abandonar por causa da música. Ainda pretendo concluir. Psicologia é um assunto que me interessa muito. História é outro. Mas por enquanto a música consome meu tempo.

JC - Quais foram as suas influências musicais?

Julinho - Os principais foram Zeca Pagodinho e o grupo Fundo de Quintal, além de um tio meu que era engajado com o antigo Carnaval de Bauru.

JC - Quem compõe as músicas do Sereno?

Julinho - A maioria das canções do grupo é de minha autoria em parceria com meu amigo Cristiano Castilho, que também é do grupo. Além disso eu faço a produção musical dos álbuns.

JC - Já teve outro emprego?

Julinho - Meu único emprego, antes da música, foi no Jornal da Cidade. Trabalhei como jornaleiro. Foi meu único trabalho com carteira assinada. Tenho muito orgulho disso, mas foi no Sereno que encontrei meu caminho.

JC - Como surgiu o grupo?

Julinho - Eu tinha uns 14 ou 15 anos quando descobri que tocava cavaquinho. Reuni um grupo de amigos que também gostavam de samba e começamos a tocar na praça do bairro todo final de tarde. Fazíamos rodas de samba e foi ali que as primeiras composições surgiram. Tocamos também em feiras agropecuárias, festas de peão, padarias, praças e bares. Enfim, estávamos onde havia público e muitas vezes ganhávamos o lanche da noite ou fazíamos o show de graça mesmo. Depois começamos a tocar em casas noturnas, como o Jack. Fazíamos nossa tradicional roda de samba. Foi o que nos levou a alcançar um público grande. Éramos nove caras, mas hoje somos seis: eu, Cristiano, Tavão, João Gano, Ney e o Casca. Tocamos profissionalmente pela primeira vez em 1999, quando lançamos nosso primeiro disco (Amigos enfim).

JC - Como é o relacionamento de vocês?

Julinho - Somos como irmãos. Nem saberia te dizer quando brigamos pela última vez, quando acontece é sempre pelo bem do grupo.

JC - Existe uma música que marcou a sua carreira?

Julinho - “Amigos enfim” foi a primeira música tocada nas rádios. Ela também foi tema de uma grande campanha de agasalho. Isso foi muito bom porque tivemos uma música envolvida em uma campanha beneficente muito legal.

JC - Qual é o tema da canção?

Julinho - A música fala sobre amor, relacionamentos. Na verdade ela fala sobre um fato verídico sobre a minha vida. Eu a escrevi, gravamos e tive a felicidade dela cair nas graças do povo.

JC - As canções do Sereno sempre falam de amor?

Julinho - Por incrível que possa parecer, o trabalho “Amigos enfim” (nosso primeiro CD), foi o mais romântico até agora. Procuramos nos outros quatro trabalhos fazer músicas mais alegres, festivas e dançantes. Já em 2005 decidimos fazer um álbum que trouxesse um sotaque da música sertaneja, da cultura do Interior do Brasil.

JC - Por que a idéia de trazer para o samba a música raiz?

Julinho - A minha mais forte lembrança musical (da infância) é quando eu acordava de manhã para ir à escola e ouvia canções de Tonico & Tinoco e Tião Carreiro & Pardinho vindas do radinho a pilhas do vizinho. Então decidimos falar sobre o jeito e as coisas simples da gente que vive no Interior, mas com o ritmo e o gingado do samba carioca que, na verdade, não é só do carioca, mas sim do brasileiro que tem o samba pulsando nas veias.

JC - Essa integração musical se dá nas letras das canções?

Julinho - Não só nas letras, mas também na melodia. Usamos a viola caipira, que é um instrumento tradicional do sertanejo de raiz. Posso dizer que trouxemos a batida e a levada da viola do Tião Carreiro para dentro do samba do Zeca Pagodinho. Ficou uma mistura legal e muito original.

JC - Esse jeito diferente de fazer música abriu novas portas para o grupo?

Julinho - Sim, foi isso que chamou a atenção do nosso escritório em São Paulo, que é hoje um dos maiores escritórios de artistas do Brasil. Bruno & Marrone faz parte desse escritório também.

JC - Quantos CD’s já foram lançados pelo Sereno?

Julinho - Foram 5 CD’s e um DVD lançado recentemente. O título do último trabalho é “Sereno: Pagode do Sertão”. Contamos com a participação especial de Bruno & Marrone e Alexandre Pires.

JC - Como conheceram a dupla?

Julinho - Gravamos um disco em 2007 no Jack Pub, aqui em Bauru. Já trazíamos esse lance de colocar a viola caipira dentro do samba de raiz. Divulgamos de maneira simples e humilde na região e na Capital. Tivemos a sorte, não sei de que forma, do nosso CD ter chegado na mão do Bruno, que levou até o escritório da Worldshow, em São Paulo. Marcamos uma reunião e eles gostaram do nosso trabalho, acharam diferente e nos convidaram para participar de um projeto com a dupla.

JC - Como foi o projeto?

Julinho - Um Cruzeiro Country com Bruno & Marrone e alguns convidados. Dentre os convidados algumas duplas sertanejas, Alexandre Pires e o grupo Sereno. Dividimos o palco com eles e logo que saímos do cruzeiro assinamos um contrato com produtora e a gravadora do Bruno & Marrone. Começamos a fazer um trabalho nacional em conjunto e em seguida veio a gravação do nosso último CD e o primeiro DVD da carreira. Isso foi em abril de 2008. Outro cruzeiro já está sendo preparado para abril desse ano.

JC - ‘Pagode no Sertão’ foi gravado em Bauru, certo?

Julinho - Sim, tivemos o prazer de fazê-lo em nossa querida cidade. Na verdade essa foi uma reivindicação minha. O show foi no Rastro do Cowboy nos dias 8 e 9 de julho do ano passado. Teve a participação do Bruno & Marrone e do Alexandre Pires.

JC - O Sereno já se apresentou em programas de TV?

Julinho - Sim, em alguns programas regionais e em um dos programas de auditório de maior audiência do Brasil, o Programa Hebe, no final de 2008.

JC - E a agenda de 2009?

Julinho - Ainda não posso confirmar. Sei que faremos apresentações em programas respeitados da TV.

JC - E quanto a projetos internacionais?

Julinho - Fomos convidados a participar em julho de um projeto do Pelé. Trata-se de um cruzeiro internacional pela Europa. A idéia é levar aos europeus um pouquinho da nossa música, comida e futebol. Será uma viagem de 10 a 12 dias pelo mediterrâneo.

JC - Vocês já têm fã-clubes?

Julinho - Sim, aqui em Bauru e em outros lugares do País. Conversamos sempre com os fãs para saber como fazer nosso trabalho, já que é para eles que o fazemos. O contato do artista com os fãs é fundamental. Eles são a causa e a conseqüência do nosso trabalho.

JC - Você se sente realizado? Julinho - Sim, porque meu maior propósito está acontecendo: tocar por todo o País e levar o nome de Bauru do Oiapoque ao Chuí.

JC - O que você tem a dizer aos fãs?

Julinho - Só tenho a agradecer a todos que acompanham nossa carreira ao longo desses anos e às pessoas que participaram da gravação do DVD. Esse trabalho é um pouco do carinho e do respeito que temos pelos fãs e por Bauru. O que queremos é valorizar esse apoio e levar o nome da cidade por esse mundo afora.

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