Meus amigos vivem me pedindo para que eu escreva histórias de pescaria. Não, não é porque sou bom contador de histórias, é que eles acham que meus “causos” são quase inverdades, mas eu juro que quase todos são verdadeiros, apenas com uma pitadinha de mentira e outra pitadinha de piada, para que eles se tornem um pouquinho mais temperados.
Vocês se lembram do meu amigo Orlando Faria, aquele que certa vez fisgou um bagre com tamanha força que o bicho escapou do anzol, rodopiou no céu e caiu em cima de um tatu, matando o coitadinho do bicho? Pois é, o Orlando me contou que foi dia desses pescar lá no rio Paraguai, foi ele mais uma turma de cervejeiros, mas disse que a coisa ‘tava’ ruim demais, não pegavam nada. Passa um dia, passa outro dia e mais um dia e só cachaça e cerveja goela abaixo, peixe que é bom, nada.
Uma bela manhã resolveram fazer um churrasco lá longe do rancho, num lugar chamado “Pedreira”, e lá foram todos, três ou quatro barcos cheios de apetrechos para a tal festa. Chegaram por volta das dez horas. Descarrega um barco, descarrega outro e mais outro e qual não foi a surpresa: esqueceram a carne, porque é assim mesmo; evento que é organizado por muitos, sem coordenação, só dá ‘caca’, como dizia um amigo meu: panela que muitos mexem, o doce queima.
Coitado do Orlando, sem carne pra churrasquear e sem traia pra pescar, porque não tinham levado nada para pesca. Foi aí que ele, olhando no fundo de um barco, achou uma linhada, toda emendada, linha 30, um pedaço 40, outro pedaço 60 e um anzol 5/0 na ponta, mais ou menos uns 30 metros de linha.
Bem, pegou um pedaço de salsicha também no fundo do barco, espetou no anzol e atirou na água (cá entre nós, a salsicha ‘tava’ muito mal cheirosa e toda amassada de tanto a turma pisar nela). Como quem não tem cão... ficou ali, desconsolado, uma latinha numa mão e a bela linhada na outra. Rapaz do céu, daí a pouco sentiu uma puxada que quase levou nosso companheiro pra dentro d’água. Começou então uma briga medonha: o peixe puxava pra baixo e o Orlando puxava pra cima e o bicho era muito, mas muito grande.
A turma lá no barranco gritando, o Orlando suando até debaixo da língua e vai daqui e vai de lá e o bicho não mostrava a cara. O Orlando então ficou de pé no barco, desequilibrou-se, caiu de bunda no banco do barco, que fez um barulho danado. Foi aí que ele notou que, com o barulho, alguns pacus pularam pra dentro do barco. Ah, que beleza, começou a bater a sola da bota no assento do barco e a cada batida era só peixe que pulava, foi aquela festa.
Pra encurtar a história, o Orlando me falou que ele contou 209 pacus dentro do barco, de tamanhos variados, pesando acima de um quilo e meio cada um. Porém, com aquela bagunça toda, o Orlando tinha amarrado a linhada no barco e, quando se deu conta, já ‘tava’ a uns 100 metros rio acima. Foi aí que ele conseguiu puxar o bicho pro barco, pacu também, de mais ou menos 21, 22 quilos.
Pra vocês terem uma idéia do que foi essa pescaria, o Orlando desceu sozinho pro rancho com o barco sem o piloteiro, porque era perigoso o barco até afundar de tanto peso. Se vocês duvidarem de mim, perguntem pro Orlando, ele está sempre entre os amigos eletricitários aposentados.
Ivo de Jesus Ribeiro é pescador e contador de histórias. E-mail mribeirobauru@yahoo.com.br.