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Região tem 2 mosteiros religiosos

Rita de Cássia Cornélio
| Tempo de leitura: 11 min

A região de Bauru tem dois mosteiros, um deles muito próximo, na cidade de Piratininga (13 quilômetros de Bauru), que acolhe a ala religiosa feminina. O outro é específico para os homens, na cidade de Torrinha (90 quilômetros de Bauru).


O Mosteiro da Imaculada Conceição ficou 43 anos em Bauru e atualmente ocupa dois hectares na entrada de Piratininga. Os aposentos do convento despertam muita curiosidade, porque as religiosas são enclausuradas e o acesso ao interior do prédio é feito com muita discrição.


Ao todo, são nove irmãs que ocupam o espaço para trabalho e oração, além do artesanal que ajuda na subsistência delas. São pães de mel, licores, frutas em compota, bolos. Tem ainda terços, trabalho em papel vegetal, bordados e imagens de santos.


Os trabalhos domésticos também são tarefas exercidas pelas mulheres que optaram pela vida religiosa. “Lavamos, passamos, cozinhamos, fazemos faxina e trabalhamos na jardinagem e horta que no momento está sendo refeita. No lugar dela está sendo erguida a igreja. Antigamente os fiéis compravam verduras aqui, depois da missa,” comenta a madre Teresa Bitencour Martins.


Mas são as pílulas do frei Galvão, famosas por ajudar as pessoas que estejam com problemas, físicos ou mentais, que levam muitas pessoas até o mosteiro. As religiosas pertencem à ordem da Imaculada Conceição, que tem mais de 514 anos. No convento, a vida é contemplativa.  


O atendimento de aconselhamento é uma ação fraternal e de ajuda a muitos necessitados. “Nós atendemos a muitos pedidos de oração. Fazemos aconselhamento até por telefone. Nosso ponto forte é ouvir e rezar. Atendemos em nome da caridade humana.”


O Mosteiro Paraíso está instalado no bairro que leva o mesmo nome, em Torrinha. Tem formação para monges voltados ao público masculino. Os padres, em número de três também fazem doces, porém a especialidade é o chocolate.


Para a subsistência, eles fabricam chocolates em vários formatos, ovos de páscoa e outras iguarias. Mantêm uma loja na cidade onde são efetivadas as vendas. Eles pertencem à diocese de São Carlos.


Como a comunidade que eles estão inseridos é rural, a missa do Cio da Terra realizada na capela ao ar livre é que torna o local um atrativo turístico. O Mosteiro Paraíso tem missas dominicais.


Mas o que é um mosteiro? Segundo a definição oficial, é uma instituição e edifício de habitação onde a oração e o trabalho são as principais ações. Os mosteiros cristãos ocidentais podem ser chamados de convento, abadia ou convento de frades. Os mosteiros budistas também são conhecidos como Vihara.


Na nossa região, os dois mosteiros são beneditinos. No Brasil eles somam seis. Na Itália, três; em Portugal sete e na Alemanha, seis. Da ordem da Imaculada Conceição no país são 19. Seis deles estão no Estado de São Paulo; cinco no Estado de Minas Gerais e os demais estão localizados no Ceará, Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Bahia.

 

Retrato da simplicidade e do amor


No Mosteiro Imaculada Conceição, a rotina diária é de muita oração e nenhum trabalho externo: vida contemplativa

Se existe um lugar que pode ser considerado um pedacinho do céu na terra, esse lugar é o Mosteiro Imaculada Conceição e São José de Piratininga. O silêncio é absoluto. A organização é impecável. A simplicidade e o amor brotam nos dois hectares que abrigam a ‘casa’ das religiosas enclausuradas.


Para os menos avisados, a clausura pode ser encarada como uma prisão, mas elas são enfáticas em dizer que não é assim. “É um símbolo que não significa que não podemos sair e que não temos liberdade. A nossa liberdade foi oferecida a Deus. É uma separação que mostra até onde o mundo pode ir e entrar. Nossa vida é contemplativa”, explica a madre Teresa Bitencour Martins, 30 anos.


A vida das religiosas se resume a trabalho e oração, oração e trabalho, mas nem por isso faltam sorrisos, aliás, cada um deles transmite uma paz que contagia. A rotina, segundo a madre, começa antes mesmo do sol aparecer.


“Acordamos às 4h45 quando temos o primeiro momento de oração, que se estende até as 7 horas com a missa diária. Temos alguns momentos de recreio, de fraternidade, mas nenhum trabalho externo. As orações não são voltadas só para nós. Rezamos para quem está lá fora, pela vida missionária. O papa João Paulo II comparava a vida contemplativa com o coração, ele dá vitalidade para todos os membros do corpo.”  


A vice-superiora do mosteiro, irmã Inês Maria, explica que as religiosas do mosteiro rezam sete vezes por dia. “Rezamos juntas e cada uma tem uma hora de oração pessoal diante do santíssimo. Sem isso a nossa vida não tem sentido, porque podemos fazer doce até melhor lá fora. Poderia industrializar, colocar uma marca. O primordial nosso é a oração.”


 As saídas do local só ocorrem em casos de necessidade, uma consulta médica, dentista ou trabalho administrativo, nada de compras. “Há irmãs designadas para isso, os serviços externos. Compras em supermercado são feitas por outras pessoas. Somos nove irmãs, duas estão em licença, uma está com a família e outra estudando”, diz irmã Inês Maria.

 

‘Senti o chamado de Deus aos 15 anos’


A irmã Inês Maria é mineira, já pelo falar a gente percebe isso. Ela confessa, aos 60 anos, que dos 15 aos 25 não conseguiu seguir o chamado porque foi impedida pela família. Só aos 25 anos conseguiu seguir a vocação. “Não desisti, foi muito tempo de espera, mas agora já tenho 35 anos seguindo Jesus de perto.”


Com seu jeito mineiro de ser, a religiosa diz que nesses anos todos viveu muitas experiências enriquecedoras e emocionantes. “Quando completei 25 anos de consagração, a capela do mosteiro em Bauru estava lotada. As pessoas estavam junto dando ações de graças pela minha perseverança. Aquilo me marcou muito, porque peço todos os dias que Deus me dê perseverança. Foram muitos ‘hojes’.”


Ela lembra que deixou a família, a terra natal. Desta época, não se esquece das montanhas do Estado de Minas. “Fiz uma opção certeira. Sempre confeccionamos as pílulas de Frei Galvão e um caso me marcou muito, porque fui eu quem fez o atendimento a família da mulher que estava condenada à morte por sofrer de com um câncer na língua.”


A religiosa frisa que os familiares estavam desesperados. “Nós oferecemos a pílula do Frei Galvão, que todo mundo conhece. Ressaltei que a pílula não cura, o que cura é a fé. É uma oração. A mulher foi curada e depois veio nos visitar, agradecer. Outros muitos casos já aconteceram.”


A irmã Maria Alice, 65 anos, também tem 35 anos de vida dedicados a Nosso Senhor e é enfática em dizer que se nascesse hoje, percorreria o mesmo caminho. “Começaria tudo de novo. Ingressei em 1977 no Mosteiro da Luz em São Paulo. Sempre costurei e aqui além de servir a Deus, faço limpeza, costuro e rezo.”  A religiosa é uma exímia costureira e faz bainha, coloca rendas minúsculas e borda todo o kit de tecido usado no altar das igrejas. O trabalho exige atenção extrema. “Faço tudo por amor a Nosso Senhor.”


Frei Galvão

A história oficial sobre a origem da pílula de Frei Galvão diz que o religioso, certo dia, foi procurado por um homem muito aflito, porque sua mulher estava em trabalho de parto e corria perigo de morte.


O frei então escreveu em três papelinhos o versículo do Ofício da Santíssima Virgem: Pos Partum Virgo, Inviolata permansisti: Dei Genitrix intercede pro nobis ( Depois do parto, ó Virgem, permaneceste intacta: Mãe de Deus, Intercedei por nós). Deu-os ao homem, que levou a esposa. A mulher ingeriu os papelinhos enrolados como pílulas. A criança nasceu normalmente.


Caso idêntico se repetiu quando um homem que se contorcia com dores provocadas por cálculos renais os expeliu e ficou curado após ingerir as pílulas. Esta foi a origem dos milagrosos papelinhos.

 

A pílula da fé

A pílula do Frei Galvão ganhou destaque no mosteiro da Luz na Capital quando um homem gritando de dor tomou o ‘medicamento’ e expeliu a pedra renal que gerava as dores. De lá para cá, o papel arroz com a oração em latim vem sendo utilizada para as mais diversas curas, seja de doença física ou emocional, enfatiza a irmã Maria Inês.


“A pílula não é indicada apenas para doenças graves. Ela acalma, tranquiliza as pessoas que as ingerem e fazem a oração por nove dias. Quem toma com fé, alcança a graça desejada. A oração em latim é gravada no papel arroz pela gráfica. Chegam aqui e são enrolados bem pequeninos e depois cortados em nove pedaços para que a pessoa reze por nove dias. Quem faz isso é uma religiosa de 83 anos. A dobra é tão pequena que a oração fica com aparência de pílula.”


A religiosa explica que recebe pedidos de todo o Brasil. “As pessoas pedem a oração pelo correio. Elas enviam o envelope com selo para despacharmos. Mandamos muitas pílulas para o Rio de Janeiro, Acre, enfim, para todo o país. O “medicamento” é gratuito, aceitamos contribuições para pagar a gráfica. Junto às pílulas vai um santinho de Frei Galvão.”  As pílulas, de acordo com as religiosas, têm feito a alegria de muitas mulheres. “Recebemos muitos relatos de mulheres que tentavam engravidar e não conseguiam. Senhoras com muitos anos de casamento. Uma delas teve um menino que hoje está um homem. Ela sonhava com um filho, foi o único.”

 

Interessadas têm que dar sinais de vocação

 

Na opinião da madre Teresa Bitencour Martins, a vocação é um chamado de Deus. “A pessoa já nasce com a vocação. Cada um de nós é chamado a realizar alguma coisa nesse mundo. Nós vamos descobrindo isso na nossa vida. Alguns descobrem mais cedo outros mais tarde. Quando a jovem, com no mínimo 18 anos, apresenta sinais de vocação, gosto pela vida de oração, uma vontade sincera de servir a Deus, tem saúde, maturidade  e o ensino médio completo, pode se candidatar.”  


Segundo a religiosa Inês Maria, vice superiora do mosteiro, a maioria das interessadas não é do Estado de São Paulo. “Na cidade de São Paulo sempre tem interessadas, mas no Estado é mais difícil. Da cidade de Bauru, por exemplo, nunca tivemos uma interessada na vida contemplativa. Ficamos naquela cidade por mais de 40 anos e não tivemos uma candidata. Temos fé que isso ainda vai se concretizar. ”


A partir do interesse, tem início a fase de acompanhamento. “Como primeiro passo sugiro que a pessoa interessada procure e converse com o sacerdote da paróquia do município onde ela mora. Ele entra em contato conosco. Começamos o acompanhamento para saber se realmente é isso que ela quer. Nesse período, mantemos conversas constantes. Ela vem aqui. Contamos com a experiência vocacional que permite à interessada passar uma semana conosco e experimentar nossa vida,” comenta a madre.  


O período de acompanhamento consome cerca de um ano. “Tem várias jovens sendo acompanhadas. Elas não entram logo, passam pelo acompanhamento. Na sequência, a candidata a freira passa pela parte de formação, postulado e nupciado, que somam seis anos até a consagração definitiva.”

 

Mosteiro Paraíso está inserido em uma comunidade rural, em Torrinha

 

O Mosteiro Paraíso foi instalado em Torrinha na década de 90 e por lá já passaram cerca de 20 jovens que optaram por servir a Deus. Atualmente o local é ocupado por três moradores, todos eles são padres que atendem a paróquia da cidade.  Padre Nilton Antônio Marques é um deles. “Os jovens que por aqui passaram vieram da região e até de outros Estados. Alguns ordenaram padres e não ficaram aqui. São quatro padres ordenados que foram servir a vida diocesana.”


Marques explica que embora muitos confundam a vida de monge é diferente da de padre. “O monge tem uma vida consagrada celibatária, faz votos de obediência, pobreza e castidade. Para a formação de monge exigem-se os estágios de votos. Os interessados vão fazendo votos temporários até fazer os votos perpétuos, normalmente é de seis a oito anos o período de formação. O monge necessariamente não é padre.”


Para ser padre, o jovem que entra no mosteiro é encaminhado para o curso de formação de seminário diocesano. “Eles vão cursar Filosofia e Teologia pela Diocese de São Carlos, aqui na nossa região. Atualmente a abadia não tem nenhum candidato recolhido. Temos dois candidatos que estão sendo acompanhados. Muito provavelmente, eles virão para cá no próximo ano.”


A casa é mantida pela comunidade na qual está inserida. “Vivemos com a renda dos chocolates, ajuda da comunidade, do dízimo, trabalhamos com a horta, que atualmente está sendo refeita porque estamos em reforma. O chocolate é o que a gera boa renda. Fazemos ovos de Páscoa, pão de mel, trufas. Há 15 anos temos uma loja.”


Desde 1996 o mosteiro promove a missa do Cio da Terra, reunindo agricultores de toda a região. “A missa é realizada no último domingo do ano litúrgico, domingo de Cristo Rei, normalmente entre 20 e 25 de novembro.”


O local é todo decorado com garrafas azuis. “Temos arandelas, sinos de ventos. Começamos a fazer a ornamentação do pátio com essas garrafas e conservamos para não descaracterizar.” O Mosteiro Paraíso fica na rodovia Cesarino Mariano, quilômetro 12.

 

Doces com gostinho mineiro

 

No mosteiro de Piratininga, todas as religiosas trabalham, mas é na hora da confecção dos doces que elas fazem a diferença. Um ingrediente incomum é acrescentado na receita do pão de mel, o amor ao próximo. O preparo original veio de Minas, através da irmã Inês Maria, uma mineira de carteirinha.


O pão de mel ‘viaja’ até pelo Sedex. “Há semanas que fabricamos mais de dois mil. Eles são levados para todas as cidades da região.” As freiras também fazem bolos, doces em compota e licores, tudo artesanal. As vendas ocorrem todos os dias, das 9h às 11h30 e das 14h30 às 17h.

 

 

 

 

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