Alex Mita |
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Há 55 anos, dona Margarida Guedes vê Bauru do alto do seu sobrado, na Vila Guaggio
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Quando o assunto é topografia, Bauru é feita de altos e baixos. O JC nos Bairros desta edição conferiu histórias de moradores que vivem nos bairros considerados os mais altos do município. No Jardim Aeroporto, Jardim Solange, Parque Jaraguá, Jardim Ouro Verde e nos tradicionais Jardim Bela Vista, Vila Quaggio e Parque Vista Alegre, entre outros, estão localizados alguns dos pontos mais elevados da cidade.
“A região do Jardim Aeroporto é considerada a mais alta de Bauru. Entretanto, a área urbana do município é dividida por microbacias. Para definir o ponto mais alto é adotado um córrego como referência. Por exemplo, o Jardim Bela Vista tem início no Rio Bauru e o seu divisor de sub-bacia é com o Córrego do Castelo, pegando o Parque União, bem mais acima. Então ele começa na parte baixa e termina na arte alta”, exemplifica o secretário municipal de Obras, Sidnei Rodrigues.
As regiões do Nova Esperança e Vila Industrial também são citadas pelo secretário como sendo altas.
‘Vi os trens e o progresso’
A quadra 3 da rua Padre Nóbrega, na Vila Quaggio, abriga um morador que observa atento as mudanças de Bauru através da vista que tem da calçada. Trata-se de “seu” Natalino Mariano, 76 anos.
“Este bairro abrigou muitos trabalhadores da Noroeste e da Paulista. Cresceu nas mãos deles, na verdade, já que os pés do bairro ficam praticamente na estação. Infelizmente, hoje não há mais trens de passageiros e o mato toma conta dos trilhos...”
Do passado, só restou a lembrança da movimentada estação ferroviária, vista da calçada da casa do morador. No fim do ano, as luzes de Natal iluminam o pátio da Noroeste, recorda Natalino.
“Por outro lado, o progresso também é visível. Veja todos esses prédios e como a cidade cresceu. Estou há 40 anos neste bairro. Pude acompanhar de tudo. A estação silenciou, mas a cidade não parou”, aponta.
Eles viram Bauru crescer...
Décadas e décadas no mesmo endereço. Fixar raízes é uma das características mais marcantes dos moradores da Vila Guaggio, o terceiro bairro a ser formado em Bauru, depois do Centro e Vila Falcão, apenas.
Assim como todo bairro formado por ladeiras, a localidade em questão tem sua parte baixa e alta. Mas é na memória dos moradores da parte mais alta que está guardada parte da história de Bauru, já que o bairro foi formado, em boa parte, pelos funcionários das ferrovias, principalmente da Noroeste e Paulista (Fepasa).
Como o marido de “dona” Margarida Carlos Guedes, “seu” José Ezequiel Guedes, um dos moradores mais antigos do lugar, que foi contador dos escritórios da Noroeste. “Ele construiu nossa casa e ia trabalhar a pé. Permanecemos aqui durante todos esses anos. Não deixo esta casa por nada”, afirma.
Dona Margarida tem 79 anos e há 55 deles vive no cruzamento das ruas Padre Nóbrega e Consolação. Do alto do seu sobrado, ela acompanhou marcantes transformações bauruenses.
“Bauru mudou muito. Quando eu olhava a cidade das minhas janelas, eu via uma mata verde e todo o movimento da ferrovia. Hoje, o mato toma conta dos trilhos e as construções estão praticamente abandonadas. Ao longe, os prédios altos arranham o céu azul”, narra.
Mas, da área de lazer construída no sobrado, a moradora também acompanha uma longa “novela” com outros personagens bauruenses. A história é a do viaduto inacabado, com início em 1995 e ainda sem final feliz.
“Daqui de cima eu vi tudo. O início das obras, a movimentação dos trabalhadores, das máquinas... Todo o tempo em que o viaduto ficou parado, seu recomeço recente... E espero, ansiosa, pra ver o trânsito de veículos nele”, aguarda.
Da casa, dona Margarida vê parte de bairros bem mais distantes. “Meu filho mora em um prédio na região da Getúlio Vargas. E eu consigo ver o prédio daqui, acredita?”, orgulha-se.
O sobe e desce das ladeiras nas ‘alamedas das flores’
Alameda das Camélias, Ipês, Jasmins, Cravos, Rosas, Hortênsias... As famosas vias do Parque Vista Alegre carregam, além do nome de alamedas floridas (moda na época da fundação do bairro), vistas de encher os olhos. Do alto de suas ladeiras, os moradores puderam acompanhar o crescimento e a urbanização de Bauru ao longo das décadas, e como eles mesmo dizem, cada tempo tem a sua beleza.
Fundado em meados da década de 1950, o Parque Vista Alegre ou, PVA, destaca-se no mapa do município como um “triângulo” formado entre a Rodovia Marechal Rondon e as avenidas Nuno de Assis e a Moussa Tobias. O bairro nasceu no mesmo entroncamento em que teve início o desbravamento do município, na Baixada do Silvino.
E é em uma dessas ladeiras, na Alameda das Hortênsias, que “seu” João Augusto, 84 anos, vive desde 1975. Da rua, ele tem uma vista privilegiada da cidade e do mesmo endereço, há décadas, ele acompanha o crescimento e as mudanças da cidade.
“A vista é linda. Isso nem preciso mencionar. Quando as árvores da quadra de baixo eram menores, eu conseguia ver até o Parque Vitória Régia”, comenta.
O aposentado é do tempo em que as famílias colocavam as cadeiras nas calçadas do bairro para conversar e olhar a paisagem. “E era uma delícia, né?! Mas, agora, isso já não é mais possível porque os tempos são outros e a violência aumentou muito”, diz, com pesar.
Ladeiras
E se do alto a vista é privilegiada, tarefas rotineiras como pagar uma conta na agência bancária do bairro ou ir até a padaria podem representar verdadeiras maratonas para quem vive em regiões altas como os bairros Parque Vista Alegre, Jardim Bela Vista e Vila Quaggio. “Coisa que eu tiro de letra. As subidas e descidas me ajudam a manter a saúde em dia”, afirma.
Região do Jardim Aeroporto é a mais alta
Há 14 anos a professora aposentada Ana Santos Pereira vive em um prédio residencial localizado na rua Doutor Sérvio Túlio Carrijo Coube, na região do Jardim Aeroporto. Embora more no primeiro andar do edifício, a alta localização oferece uma vista ampla para a avenida Nações Unidas e seus arredores. A região do Jardim Aeroporto é considerada a mais alta da zona urbana de Bauru.
E quando o assunto é “viver no alto”, Ana aponta o que para ela simboliza tranquilidade e prazer: “O lugar é agradável e arejado”, diz. Entretanto, por se tratar de uma região cercada por edifícios, em época de ventos a sensação ali é maior, já que ocorre a canalização dos ventos por causa das construções.
Segundo o secretário de Obras de Bauru, Sidnei Rodrigues, os bairros mais altos estão mais propensos a ventos. Em épocas de seca, os problemas respiratórios podem ser maiores, pela falta de umidade que a distância dos córregos proporciona, diferente dos bairros localizados em fundos de vale. Com os ventos, as partículas de poeira também é mais comum em bairros altos.
Quanto mais alto o bairro, menor é a temperatura
Quanto mais alto o bairro, menor é a temperatura, certo? Certo. E, no caso de Bauru, tal variação pode representar até três graus a menos nos termômetros, de acordo José Carlos Figueiredo, meteorologista do Instituto de Pesquisas Meteorológicas (IPMet) da Unesp.
E isso em qualquer época do ano. Se no inverno (que tem início hoje) os bairros mais altos são mais frios, no verão, as temperaturas tendem a ser mais agradáveis.
“Entretanto, alguns elementos cooperam para a diferença de temperatura entre as regiões mais altas e as mais baixas da cidade. A arborização é uma delas. Regiões altas e arborizadas podem apresentar até três graus a menos, em relação as demais. Exemplo são os picos do Jardim Bela Vista em relação ao Centro”, exemplifica o meteorologista.
Jardim Solange
Dona Luci Aparecida de Oliveira mora no Jardim Solange, uma das regiões de Bauru consideradas altas. Há 30 anos no bairro, ela comenta que o inverno por lá parece ser mais frio do que no antigo bairro em que vivia, a Vila Santista. “Mas a diferença não é tão grande assim. E viver em um lugar mais alto é sempre mais bonito”, acredita.
Quando se mudou para a quadra 20 da rua México, dona Luci quase não tinha vizinhos. Sua residência ficava entre um pasto e mato. De longe, ela via os bairros da zona sul e, pouco a pouco, foi vendo o cerrado dar lugar a loteamentos, entre eles, condomínios. “Minha vista era de prédios ao longe e mata fechada por perto. É possível ver a região sendo urbanizada”, observa.
Antenas
A região do Jardim Ouro Verde é outra das mais altas do município. Tal topografia atraiu diversas torres de sustentação de antenas transmissoras e retransmissoras de TV e rádio. Tal concentração caracteriza o bairro.