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| O bauruense Renato Shippee é modelo e ator internacional |
Aos 12 anos, aluno destacado de uma escola pública, Renato Ferreira da Silva foi premiado com uma bolsa de estudos de francês e acalentava o sonho de ir estudar o idioma "in loco", na França.
Mas a vida deu voltas e, até agora, isso não aconteceu. Frustração pelo sonho não realizado? Nada disso. Pelo contrário. Hoje, aos 30 anos (completa no próximo dia 29), com o nome artístico Renato Shippee, está simplesmente desbravando Hollywood. E de forma muito positiva. Renato é um dos poucos, senão o único (não se sabe ao certo) bauruense, nascido e criado aqui, a conseguir o registro no Screen Actors Guild (SAG), o sindicato de atores dos Estados Unidos. O Screen Actors Guild é um sindicato que representa mais de 120 mil atores nos EUA.
Ele garante a seus membros não só a legalidade da profissão como condições de trabalho seguras, um salário mínimo para as produções, cerca de U$$ 1.500,00 semanais, com a ressalva de que qualquer trabalho freelancer por lá paga em torno de US$ 3 a US$ 4 mil. E mais: mantém um prêmio famosíssimo, o SAG Awards, que todo premia os melhores desempenhos no cinema e na televisão, sendo considerada, desde 1995, uma das melhores premiações de Hollywood.
Renato Shippee vive há dois anos em Los Angeles, para onde foi apenas com o inglês aprendido em músicas. Revendo familiares em Bauru, ele falou ao Jornal da Cidade.
Jornal da Cidade - Vamos começar pelo clipe Havana, de Camila Cabello, como foi isso?
Renato Shippee - Parece golpe de sorte, não é? Quem tem menos de 30 anos e está ligado em música e clipes internacionais sabe que desde agosto de 2017, Havana, da Camila Cabello, é o maior sucesso na Internet. Continua batendo recordes em todas as plataformas da área, já indo para a casa dos 2 bilhões de visualizações. Mas pouca gente sabe que eu, Renato, estou lá dançando. Fui para o teste e estava lá no meio e de repente o diretor gostou da minha figura, estava mais bem arrumadinho, me chamou para a frente. Acabei ficando entre os principais e daí já viu. Claro que agarrei a oportunidade. Até então já tinha ralado um ano em vários testes e pequenos trabalhos por lá.
JC - Até já conseguiu um papel na série televisiva que recria o assassinato real do estilista Gianni Versace.
Renato - Com esse cartão de visitas foi menos difícil descolar o papel. Claro que lá precisa tudo certinho, muito afinco, foco e acabei interpretando o assistente pessoal de Donatella Versace (Penélope Cruz), a irmã de Gianni, que hoje comanda o legado da marca. Contracenar direto com a Penélope, com Ricky Martin (que faz o namorado do estilista), foi tudo de bom.
JC - Você não esconde sua origem humilde...
Renato - Jamais! Sou o caçula de uma doméstica, Maria da Silva Gardiolo, mãe de cinco filhos. Foi diarista a vida toda para nos dar de comer. Éramos muito humildes, praticamente favelados, mas ela fazia questão que estudássemos. Eu frequentei o Eduardo Velho Filho, perto da Rodoviária, e depois o Senai. Sempre fui nerd. Gostava de estudar.
JC - Mal conheceu o pai...
Renato - Sim, meu pai, abandonou a família quando eu ainda era bebê. Mas não tenho mágoas dele e tive a oportunidade de vê-lo aos 15 anos, quando ele, já doente, quis se reconciliar com os filhos. Morava em outra cidade e cheguei a tempo de vê-lo morrer. Estava muito doente por causa da bebida, até por isso eu nunca bebi nada.
JC - Sua formação profissional não era de artes cênicas?
Renato - Na verdade não, nem imaginava. Até por gostar de estudar, por ser bom aluno, ganhei a bolsa de francês, mas eu precisei logo trabalhar e acabei enveredando pela mecânica. Fiz curso técnico no Senai. Logo vi que essa não era minha praia e fui trabalhar em uma empresa de cobranças, onde cresci rapidamente, virei coordenador, mas também bateu uma certa insatisfação. Sou meio altruísta. Como cobrar uma pessoa que a gente sabe que está com dificuldades, sem emprego? Achava que deveria existir uma profissão mais condizente com o meu jeito, meu coração. Não que eu fosse ruim, não fizesse meu trabalho, não é isso...
JC - Mas você foi professor também
Renato - Sim, do Centro de Integração Escola Empresa (CIEE), onde desenvolvi vários trabalhos, com grupos, com jovens aprendizes, com criatividade, criação de show de talentos... Sempre tive essa inquietude e usava a criatividade. Fazia a diferença. Isso também me ajudou na hora de conseguir ser aprovado e ir para os EUA em condições de solicitar meu visto de trabalho. Fiz questão de fazer tudo direito, como manda a lei, e já fiz contatos a partir daqui do Brasil.
JC - E esse nome artístico?
Renato - Quando decidi que queria ir para os Estados Unidos e batalhar por uma chance em Los Angeles, fui aumentando minha rede de contatos. Acabei que conheci uma família cujo sobrenome é Shipp, me ajudou muito, deu dicas. Não é um sobrenome muito conhecido e quer dizer 'entregador'. Lá, eu resolvi adotar para nome artístico, mudando um pouco a grafia. Está dando certo, me deu sorte.
JC - A gente percebe que você tem cuidado com o corpo, é todo malhado...
Renato - Fui muito franzino, resolvi mudar meu corpo através de academia. Sou regrado quanto a isso, me cuido mesmo e a alimentação é natural. Nesse aspecto, eu sou até chato, mas levo tudo a sério e não tomo nada, nenhuma bomba, nem um estimulante, nada, consigo o físico que quero me alimentando bem e fazendo exercícios.
JC - A que credita o seu crescimento?
Renato - Foco. Disciplina. E à minha mãe. Ela sempre me estimulou. Sempre exigiu o melhor dos filhos. Um exemplo: ela fazia questão de que eu andasse muito bem vestido, bem apresentado, socialmente falando. Assim, mesmo na mecânica ou na empresa de cobrança, eu não andava "largado". Isso fez toda a diferença até para minha promoção.
JC - E há algum teste em vista para quando você voltar? Qual o próximo passo na profissão?
Renato - Já estou escrevendo meus próprios roteiros. Um deles já está pronto. É um suspense sobrenatural: 'Welcome Home Darling', que está em fase de lapidação. Lapidação tanto da preparação técnica quanto do idioma que, claro, ainda não domino 100% como um escritor americano. Espero fazer dele, por enquanto, um curta-metragem, filmar e inscrever em circuitos alternativos e outras disputas. O curta hoje em dia é a porta de entrada para ser um roteirista.
JC - Esse é seu desejo para o futuro? Ser um roteirista de sucesso?
Renato - Vale lembrar que para a gente chegar lá, e eu vou chegar, vou fazer sucesso, isso não tenho a menor dúvida, isso é fato, não bastam os sonhos. É preciso ser estrategista e, se você perguntar se eu não quero ser um grande ator, eu digo que sim, claro, e estou lá toda semana batalhando por testes para esta ou aquela produção. Mas tenho que levar em conta que concorro com jovens de 20/21 anos, mais bem preparados e a concorrência é enorme. Já o mercado tem uma defasagem de bons roteiristas e a criação de histórias também é minha área. Como criatividade não me falta, vou enveredar por aí.
JC - Essa é a sua meta profissional. E para o pessoal?
Renato - Servir de inspiração para outros jovens. Cheguei aqui e já fui fazer um trabalho de fotos com dois amigos, uma menina e um menino. Ele, por exemplo, quer trilhar o mesmo caminho que eu lá nos EUA e estou ajudando. O que eu puder eu ajudo mesmo os outros. Quero ser exemplo e, no futuro, quero muito poder ajudar Bauru, ajudar outras pessoas a expandirem o seu mundo. Pensa bem, até pouco tempo atrás meu país não era o Brasil, meu mundo é Bauru. Até há bem pouco tempo eu não conhecia nenhum outro lugar. Nunca havia saído daqui para nada.
JC - Para finalizar, algo que você faça questão de dizer...
Renato - Preciso deixar claro que sou grato às minhas origens. Tenho uma ligação muito grande com minhas raízes. Valorizo demais a vida do Interior, o interiorano, acho que as pessoas precisam valorizar também. Quero investir aqui.
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