
Crocante, aerado, viciante.? Se abocanhar o primeiro, já era: comem-se dois, três, quatro - e só para quando se avista o fim do pacote. Batizado de pororoca por seu criador, um cidadão limeirense, em 1930, em razão das semelhanças com a pururuca (essa feita com courinho de porco), foi rebatizado pela indústria na década de 1950 e virou mandiopan, o primeiro salgadinho fabricado no Brasil.
Se você nunca ouviu falar no dito-cujo, provavelmente nasceu depois da década de 1980, quando o petisco sumiu das prateleiras e quase entrou em extinção - não à toa, ele faz parte da Arca do Gosto, catálogo do movimento Slow Food que visa identificar, mapear e registrar ingredientes e receitas em risco de extinção.
A boa notícia - ao menos para quem viveu a época de ouro do mandiopan - é que o salgadinho, feito originalmente de polvilho azedo e fubá, voltou a pipocar por aí. É oferecido como petisco em bares como o SubAstor, o Ambar (e cai muito bem com o chope artesanal da casa) e o Mica, que trabalha com uma versão asiática do belisco, prawn crackers, com camarão moído na massa. Ela é comprada semipronta na Liberdade e frita na hora do pedido.
ALTA GASTRONOMIA
Mas, para além da mesa do bar, o belisco também foi parar nas cozinhas de alta gastronomia. Por sua textura de nuvem crocante, que estala e derrete na boca, o mandiopan caiu na rede de chefs, que passaram a usá-lo como base para bocados. Não bastasse, surgiram também variações da receita, feitas com farinha de milho, arroz, sagu, tapioca? O modo de preparo é parecido: a farinha (ou grão ou goma) é cozida com água ou caldo e batida, se necessário. A massa é, então, posta para secar e, depois, frita em imersão.
No carioca Olympe, o chef Thomas Troisgros dá seu toque à receita original do salgadinho ao acrescentar cor e sabor à massa crocante de polvilho. "O mandiopan é um curinga quando quero acrescentar crocância ao prato", conta. Pois o chef já usou caldos de bacalhau e de cogumelos para incrementar a massa, além de suco de beterraba (imagine a cor púrpura) e de purê de azeitonas pretas, para tonalizar e, ainda, acentuar o sabor. Hoje em cartaz no restaurante, há também um mandiopan clássico salpicado com pó picante de kimchi (conserva coreana).
O chef Thiago Cerqueira, que deixou recentemente a cozinha do Loup e, hoje, presta consultoria ao restaurante, aposta no milhopan (feito só com farinha de milho) para servir de base para o tartare de camarão apimentado com vinagrete de manga. Para preparar crocantes, o chef já usou também mochigome (arroz glutinoso), arroz negro e quirera - esse último, com resultado mais granulado.
FELIPE BRONZE
Se no paulistano Pipo o chef Felipe Bronze investe nessa versão delicadíssima de crocante, em seu Oro, no Rio de Janeiro, brilha uma versão mais rústica de pururuca. Ela é feita com sagu cozido em suco de abóbora, que é desidratado sem bater para preservar as bolinhas derivadas do amido de mandioca. As plaquinhas fritas de sagu, bem coradas graças ao fruto, recebem lagostim levemente defumado, gel de abóbora e Catupiry também defumado. A inspiração, conta o chef, vem do camarão na moranga.