José Milagre

Seu celular virou um espião no seu bolso?

12/04/2020 | Tempo de leitura: 4 min

Esta semana, tivemos um boom de mensagens dos leitores da Inovação & Tecnologia sobre as medidas anunciadas pelo governo João Dória no escopo de conter a crise provocada pela pandemia da Covid-19, onde fora anunciado que as operadoras passarão a enviar dados de celulares para o governo, para que possam realizar o monitoramento das atividades de isolamento e da efetividade da quarentena.

A que ponto chegamos?

Muitos leitores questionaram a medida, fazendo alusão a Estado Totalitário, modelo chinês, dentre outros. Não bastou o anúncio para que dicas “milagrosas” para não ser monitorado passassem a circular na rede mundial de computadores. “Desabilite seu GPS”, “não atualize mais seu dispositivo”, “desconecte-se da internet” foram algumas das “dicas” para fugir do monitoramento do Estado de São Paulo.

Então, vamos aos fatos técnicos...

Primeiramente. As cinco operadoras de telefonia confirmaram que os dados que serão remetidos ao governo do Estado de São Paulo são agregados e anonimizados! Dados anonimizados são aqueles onde se remove de forma definitiva o vínculo entre o a pessoa e o dado e dados agregados normalmente são somatórias, totalizadores, que não identificam as pessoas, seus comportamentos suas atividades ou os locais que frequentam.

Incide a Lei de Proteção de Dados Pessoais?

Se os dados forem realmente anonimizados nas operadoras, de forma irreversível, não se aplica as proteções da LGPD, considerando que estamos diante de dados anônimos. Anonimizar não é cifrar, criptografar ou pseudonimizar. Estas são boas práticas de segurança para os dados, mas não retira destes o caráter de “dado pessoal”. Assim, no caso da transmissão de dados dos celulares, se as operadoras cumprirem o que disseram, os dados são anônimos e podem ser cedidos sem consentimento do titular.

E se eu desligar o GPS e não mais atualizar o celular?

Primeiro, se você não atualizar mais seu celular, seu dispositivo se tornará inseguro e você estará em grande risco. Se você desligar seu celular... (não acredito que você consiga). Depois, o GPS não tem nada a ver neste caso! Isto mesmo, o monitoramento não se dá com base no GPS, mas como base nas autenticações que nossos aparelhos fazem nas estações rádio-base (ERBS) próximas ao dispositivo. Isso começa quando seu celular é ligado e de acordo com sua movimentação, o dispositivo se autentica em outras antenas. É com base nesta análise que se pode traçar a localização “aproximada” de uma pessoa e assim “quantificar” pessoas em determinadas regiões como parques, e áreas de risco, gerando-se os chamados “heat maps”, ou mapas de calor, importantes instrumentos para que Governos possam avaliar descumprimentos e agir preventiva ou reativamente.

Faz sentido então esta cessão de dados ao governo, Milagre?

Total, o mundo já parou de discutir se é legal ou não. Todos sabemos da importância dos dados no combate à Covid-19, para que possamos por exemplo, identificar áreas de risco com alta concentração de pessoas e para que o Governo possa tomar decisões. Estamos tratando de defesa de interesses vitais, aqui. Tão relevante quanto a biomedicina e a medicina, está a ciência da informação e de dados, a primeira descrevendo o comportamento informacional, e cooperando para organização efetiva de modo que a informação possa gerar valor, e a segunda no emprego de análise matemáticas, algoritmos e estatísticas para que o Governos possam tomar decisões com base em fatos.

E se os dados fossem “pessoais”, precisaria de consentimento?

Existem outras hipóteses em que o tratamento de dados pessoais é autorizado sem que seja necessário o consentimento do cidadão e titular. Elas estão previstas no art. 7, como por exemplo, para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro ou para a tutela da saúde, exclusivamente, em procedimento realizado por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária. Portanto, nem sempre será necessário o consentimento para o tratamento de dados pessoais, sobretudo diante da pandemia que estamos vivenciando, no entanto, remanescem presentes os direitos dos titulares de dados que poderão consultar as empresas com os quais o controlador compartilhou os dados e exercer demais direitos previstos no art. 18 da LGPD, bem como os deveres dos controladores de não violarem as finalidades pelas quais estão fazendo o tratamento, utilizar os dados mínimos necessários e adotando princípios da privacidade por padrão e por design eM todos os processos de tratamento, incluindo medidas técnicas e organizativas de segurança da informação. Um mapa online de infectados por bairro, por exemplo, sem indicação dos dados de quem é ou sua localização real (residência), muito comum em Prefeituras, não expõe a privacidade, intimidade ou dados pessoais dos mesmos, ao mesmo tempo, cumpre a finalidade de alertar a população das áreas de risco, importante recurso no combate a disseminação do vírus.

Live sobre o assunto

Vou fazer uma live sobre este tema no meu canal no Youtube, gratuita: www.youtube.com/josemilagre. Se inscreva e participe, informaremos por lá os detalhes. Envie também seu comentário para consultor@josemilagre.com.br e participe da elaboração do Inovaçao & Tecnologia.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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