O Eduardo fantasiado por Renato Russo em sua célebre canção era ingênuo e pouco dado ao estudo. A Mônica se preparava para ser médica e era bem mais velha. Mas as figuras que inspiraram o artista em "Eduardo e Mônica" não eram bem assim. Pouca gente sabe, mas o casal da letra existe mesmo - ou, pelo menos, quase. Lançada em 1986 e agora adaptada para o cinema - o filme está em cartaz nos cinemas de Bauru -, a faixa do Legião Urbana tomou como inspiração o relacionamento de uma das grandes amigas de Russo, a artista plástica Leonice de Araújo Coimbra e o marido, Fernando Coimbra.
Na época em que ele compôs a faixa, o músico ligou para a amiga - como fazia com frequência - e mostrou a ela o que, ninguém sabia ainda, se tornaria um verdadeiro fenômeno musical. "Sempre que ele compunha ele me ligava. E certa noite ele me ligou e disse que a música era para nós. Eu, honestamente, não estava nem aí naquele momento. Foi só com o tempo que eu fui reconhecer o tamanho do presente que ele, o melhor amigo que eu tive em toda a vida, me deu", diz Leonice, por telefone.
A indiferença inicial se deve ao fato de ela ser uma pessoa reservada e de não se reconhecer na personagem imaginada por Russo. Leonice não estudou medicina nem era tão mais velha que Fernando.
Leonice fala com este repórter do México, para onde se mudou há poucos meses com o marido, que é embaixador do Brasil no País, carreira que é difícil imaginar Eduardo trilhando. Filha do casal, a também artista Nina Coimbra - que não ficava de recuperação - concorda que o pai é o oposto do personagem. "Na música o Eduardo parece um pouco bobo, ingênuo, e meu pai não é nada disso", afirma.
"Eu acredito que o Renato escreveu essa música idealizando um pouco a minha mãe - o que faz sentido, porque ele era mais próximo dela. Mas a energia da história, esse encontro de amor, isso realmente existe, porque eles são referência de um casamento bacana, são mesmo como feijão com arroz."
O casal conheceu Renato Russo nos anos 1980, num centro acadêmico da Universidade de Brasília, onde Fernando Coimbra estudava antropologia. O músico estava lá para tocar com sua banda e Leonice ficou hipnotizada pela performance. "Nós nos apaixonamos fraternalmente de cara", diz ela.
Renato Russo foi uma presença constante em sua vida e na de Nina, a filha. Mesmo quando a família começou a mudar de um país para o outro, por causa da carreira de Fernando na diplomacia, o músico sempre se fez presente. Nina lembra que quando o telefone de casa tocava de madrugada, eles tinham certeza - Renato Russo estava ligando. Por causa do fuso, eles precisavam se falar em horários nada ortodoxos, mas a chamada era sempre motivo de festa.
"Eu lembro de ter, durante a infância, essa noção de que o amigo da minha mãe era um pop star. E o Renato gostava disso. Quando estávamos no Brasil, ele ia nos buscar na escola, fazia tudo ser uma grande cena, com todo mundo enlouquecido."
As viagens da família, sem data para acabar, motivaram o líder do Legião Urbana a escrever uma outra canção para Leonice, "Uma Outra Estação". Nela, ele canta que "está longe, em outra estação". "Voltarás na terça-feira/ És fogo e gelo ao mesmo tempo/ E vai ser bom/ Do Equador, da Venezuela, do Uruguai/ Teremos o fim de semana só para nós", diz a letra.