Entrevista da semana

Pereirão: versão popular de um homem discreto

Guilherme Tavares
| Tempo de leitura: 4 min

Por trás de uma das lojas mais populares do Centro de Bauru está um cara simples e discreto. Tanto que nem mesmo a chamativa e colorida fachada do Lojão do Pereirão carrega, de fato, o nome dele. Luiz Henrique Soares de Souza, de 62 anos, se inspirou na personagem da atriz Lilia Cabral na novela Fina Estampa (2011-12) para batizar o estabelecimento. "Ela interpretava o Pereirão, uma mulher que consertava tudo, resolvia as coisas", conta o empresário, referindo-se à consagrada atuação de grande apelo midiático na época.

Na ficção, a personagem faz trabalhos braçais sem preguiça, tão menos vergonha. A vida dela muda ao ganhar na loteria: vai viver em um condomínio de luxo, porém não deixa de trabalhar e abre uma empresa. Na vida real, Luiz não ganhou na loteria, mas também decidiu abrir o próprio negócio, já depois de aposentado. "Para complementar a renda", explica.

Começou com um espaço de 200 metros quadrados, vendendo tudo a R$ 1,00. Hoje, a loja ocupa uma área dez vezes maior, com 50 funcionários e um catálogo de dez mil itens. Segundo ele, as oportunidades foram surgindo e ele foi aproveitando-as.

É um dos 13 filhos de Sebastião Lima de Souza e Laura Soares de Souza (ambos em memória). Começou a trabalhar ainda criança, vendendo coxinhas no Centro, para ajudar em casa. Aos 14, foi contratado na extinta Rede Santo Antônio, da família Svizzero. Ao longo de 27 anos, foi de empacotador a diretor. "Foi onde aprendi tudo da vida profissional e também muito sobre comportamento", comenta.

É casado há 38 anos com Marta Silva de Souza, 58 anos. Da relação, nasceram Tássia Silva de Souza, 32 anos, e Cintia Silva de Souza, 37, casada com José Carlos Peres Junior, 39, o quinto integrante da família. A esposa e a filha mais velha também trabalham na loja. Quando tem tempo, Luiz gosta de pescar e curtir moda de viola com os amigos.

Neste ano, o Lojão do Pereirão completa dez anos e, segundo o empresário, conseguiu sobreviver à pandemia graças à austeridade dos donos e a novas investidas, como as vendas online e um setor de importação. O empresário conversou com o JC: confira a seguir os principais pontos dessa trajetória.

Jornal da Cidade - Se não é sobrenome da família, de onde veio o nome Pereirão?

Luiz Henrique Soares de Souza - A gente procurou um nome que chamasse atenção. Na época, em 2012, tinha uma novela (Fina Estampa, na Rede Globo) com a personagem da Lilia Cabral, o Pereirão, uma mulher que dava jeito em tudo, resolvia as coisas. Pegamos o que estava, no momento, na moda e tentamos dar esse conceito, de uma loja que tivesse de tudo um pouco. Começamos vendendo tudo a R$ 1,00, com artigos populares.

JC - E por que investir em um tipo de comércio mais popular?

Luiz Henrique - Foi sugestão de um amigo, Rogério Pradelli, que depois acabou virando meu sócio durante alguns anos. Ele vendia itens desse segmento e trouxemos a ideia para Bauru, com utensílios de cozinha, utilidades domésticas, mas também agreguei gêneros alimentícios. Pensei em abrir uma lojinha para não depender só da aposentadoria. Aí você começa a se envolver, o negócio vai expandindo. Quando vimos que estava crescendo, mudamos o perfil, porque o dólar começou a subir, a maioria dos produtos era importada, então R$ 1,00 já não dava mais. Ainda somos uma loja com segmentos populares, mas hoje atendemos uma grande gama de clientes.

JC - Com essa mudança de perfil, foi difícil desassociar a ideia do preço a R$ 1,00?

Luiz Henrique - Não, porque foi gradual, o cliente foi assimilando com a gente. Mas o nosso grande negócio foi vender em quantidade. Faturar menos na margem, que é muito pouca, mas ganhar em volume de vendas. Então isso é marcante. Independentemente se produto custa R$ 1,00 ou R$ 200,00, a margem é menor. Antes de entrar em um novo segmento, fazemos pesquisa para saber se conseguimos vender mais barato que todos e normalmente é possível. O mais recente foi a linha pet: hoje temos todos os produtos para atender esse cliente.

JC - E como um comércio popular fez para enfrentar a pandemia?

Luiz Henrique - Foi muito difícil. Ficamos três meses fechados sem nenhuma renda. O que nos ajudou foi justamente essa forma de não ter vaidade. Nada de carrão, imóvel ou ficar tirando dinheiro do caixa da empresa. Eu moro na mesma casa que morava quando era funcionário. Isso nos ajudou, não dispensamos funcionários e nem entramos em acordos do governo para pagamentos. Também começamos a trabalhar com a venda digital. Contratamos pessoas especializadas em e-commerce. Hoje estamos em todas as plataformas e temos nosso próprio site. E também criamos um setor próprio de importação. Antes, eu comprava tudo de importadora, agora eu sou o importador. Dessa forma, vou conseguir colocar o produto de 30% a 40% mais barato do que hoje e transferir essa economia para consumidor.

JC - E o Luiz, dono do Pereirão, uma das lojas mais populares do Centro, é um cara popular também?

Luiz Henrique - Não, sou extremamente reservado. O que eu faço, de vez em quando, é uma pescaria. Mas, quando era funcionário, ia mais vezes, agora tenho menos tempo. E tem uma turminha que se reúne para tocar e cantar moda de viola. Mas eu não toco, só ouço e tomo minha cervejinha.

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