Desaprender

Por André Sallum | 18/06/2021 | Tempo de leitura: 3 min

Considerando-se o processo de aprendizado como algo permanente, ele certamente ocorre, além do ambiente escolar, também em casa, na família, no relacionamento social, no trabalho, nas experiências religiosas, nas reflexões, nas dificuldades e dores, nos triunfos e fracassos. Toda e qualquer situação vivencial pode se converter em  fonte de aprendizado. Ocorre que aprendemos não somente o que se torna útil e benéfico, mas igualmente, e frequentemente, muitas coisas inúteis, tanto quanto prejudiciais, as quais, em certa medida, moldam nosso comportamento, influenciam nossas escolhas e refletem-se em nosso modo de ser e agir; por isso, tão necessário quanto aprender, parece ser o desaprender.

Desaprender no sentido de nos descondicionar, nos emancipar, retirando os véus que nos impedem de sentir integralmente a vida. Para desaprender é necessário uma mente atenta, desperta, sinceramente empenhada em se despojar de tudo aquilo que se revele obstáculo a uma vida mais plena e livre.

A fim de conseguirmos desaprender aquilo que tenha se tornado inconveniente ou prejudicial, necessitamos estar sinceramente interessados em compreender, ao mesmo tempo abertos ao novo e, acima de tudo, estar dispostos a nos desapegar da imensa carga  opressiva que temos acumulado, individual e coletivamente, ao longo da história.

Há muitas coisas que precisamos desaprender: a violência que, de inúmeras formas, permeia nossas ações e atitudes; os condicionamentos e preconceitos, que nos tolhem a compreensão; os vícios, que nos escravizam; as crenças equivocadas e limitantes, que nos cerceiam; a corrupção, nas mais diversas formas e sob os mais sutis disfarces, que desvirtuam as relações; a hipocrisia, com que nos protegemos das próprias iniquidades.

Até mesmo nossas crenças e práticas religiosas têm se mostrado presas a convencionalismos e vazias de sentido, alimentando, intencionalmente ou não, o sectarismo e os conflitos. A religiosidade, inata no ser humano, se perverteu, desvirtuando-se no fanatismo, na intolerância, na exclusão e no moralismo, gerando prejuízos a diversos setores da sociedade. Cremos que isso também precise ser desaprendido, para que a verdadeira fé possa se expressar mais livremente.

Somente quando desaprendermos muita coisa inadequada que temos assimilado é que poderemos ter uma mente e um coração mais límpidos, capazes de refletir e expressar realidades superiores da consciência e da vida, permitindo o florescer da bondade e da fraternidade.

Estamos de tal forma saturados de preconceitos, violência, ambição, competitividade, corrupção, consumismo, materialismo, que talvez no momento atual tenhamos mais a “desaprender” do que a “aprender”, permitindo com isso que haja um espaço interior íntegro, intocado, vazio, a ser preenchido por algo novo, puro, criador e curativo. 

A nosso ver esse tão necessário desaprender significa fundamentalmente desapegar-nos e despir-nos de falsos saberes, presunção, arrogância, orgulho, egocentrismo. Além disso, estamos saturados de informações perturbadoras, quando nossa mente clama por silêncio, serenidade e paz. Talvez estejamos em um momento de desaprender muitas coisas, pois a mente e o coração humanos transbordam conteúdo tóxico, desequilibrando a vida individual e coletiva. O psiquismo de muitos seres não comporta mais vícios, desencantos, angústia e desespero, precisando ser em parte esvaziado, a fim de que nele possa surgir e se expressar algo capaz de promover e alimentar um novo modo de viver.

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