Caça às bruxas

Por Rubinho Vitti | 03/11/2020 | Tempo de leitura: 3 min

“Dia 31 de outubro não é mais o Dia das Bruxas no Brasil. É dia de proclamar que Jesus vive e está voltando. Foi publicado no Diário Oficial da União que o dia 31 de outubro como Dia Nacional do Evangelho. Bolsonaro aprovou essa lei”.

Essa é uma mensagem que está rodando no Whastapp e provavelmente sua tia ou alguém no seu grupo da família já deve ter disseminado a informação e isso ter chego até você. Não preciso dizer que é fake news, não é mesmo? O Projeto de Lei para que a data de 31 de outubro se torne o Dia do Evangelho Nacional realmente existe e foi proposto em 2003, mas nunca foi aprovado pelo congresso, muito menos sancionado por Bolsonaro.

Já que estamos em época de Halloween, essa fake news me fez pensar. Bom, para começo de conversa, no Brasil não existe um feriado ou data oficial do Dia das Bruxas. A data, inclusive, é pouco celebrada no país, por não ter muita relação com nações ao sul do Equador.

Pior! O nome “Dia das Bruxas” foi justamente inventado como uma forma dos cristãos demonizarem um rito celta, celebrado há mais de 2.000 anos atrás. Ou seja, antes de Cristo.

Se voltássemos no tempo, os antigos povos celtas estariam celebrando o seu Ano Novo. 31 de outubro era a data que acreditavam ser o início de um novo ciclo, entre o verão e o inverno.

Essa passagem era chamada pelos povos druidas — uma classe poderosa dentro da sociedade celta — como Samhaim (em irlandês).

Segundo os historiadores, o início desta celebração aconteceu na Irlanda, no condado de Meath, onde rituais eram feitos justamente no final de outubro e começo de novembro para celebrar os mortos.

Durante o Samhaim, acreditava-se que os espíritos dos familiares falecidos voltavam para casa querendo se alimentar e se proteger do frio, buscando abrigo e o calor do fogo das lareiras. Mas quem é que quer parente entrando assim em casa, ainda mais depois de morto, não é mesmo?

As fantasias, as abóboras e outras figuras e enfeites assustadores serviam justamente para expulsar os espíritos e não deixá-los se aproximar.

A cidade de Athboy, em Meath, era um local sagrado e de grande reunião dos celtas durante o Samhain. Lá, eles acendiam uma grande fogueira e era a partir dela que todas as outras fogueiras eram acendidas no restante da Irlanda.

No Brasil, muitas pessoas dizem que celebrar o Halloween é uma forma de importar uma cultura americanizada. Mas na verdade, é o próprio Estados Unidos que importa a cultura celta.

Como muitos irlandeses migraram para a América durante a Grande Fome, foram eles os responsáveis por levar na mala e disseminar por lá a tradição celta, que ganhou o mundo todo por meio do cinema e da televisão.

Voltando aos cristãos, mais uma vez eles se apropriaram de uma data “pagã” para criar sua própria celebração, o Dia de Todos os Santos. Basta ver outras datas como o Natal, a Páscoa, entre outras.

Halloween, inclusive, vem de “Hallows’ Eve” (a véspera de “All Hallows’ Day”, Dia de Todos os Santos.

Agora, mais uma vez, ao achar uma boa ideia criar o Dia do Evangelho como lei, ou qualquer outra data para apagar uma celebração antiga, tentando impor sua própria crença, alguns cristão mostram que não tem conhecimento de uma palavrinha fácil de encontrar no dicionário: laicidade.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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