Documentário ou ficção?

Por Rubinho Vitti | 17/01/2020 | Tempo de leitura: 3 min

A segunda-feira, 13 de janeiro, poderia ser um dia como outro qualquer. Mas foi a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood apresentar os indicados ao Oscar 2020 que uma onda mágica passou pelo Brasil e, como sob o efeito de um pó de pirlimpimpim, uma infinidade de brasileiros se tornou especialista em cinema de documentário nas redes sociais. Tudo porque o filme Democracia em Vertigem, da cineasta Petra Costa, foi indicado na categoria Melhor Documentário.

O longa, lançado pela plataforma streaming Netflix, narra a política brasileira desde a redemocratização, passando pelos mandatos de Lula, o impeachment da presidente Dilma Rousseff, até a eleição de Jair Messias Bolsonaro. Tudo sob a ótica da cineasta de 30 e poucos anos, fazendo um paralelo do seu histórico pessoal e familiar com a recente história política brasileira.

Petra não esconde sua preferência pela esquerda. Ela foi um dos poucos olhos eletrônicos nos bastidores do impeachment, gravando cenas dentro do Palácio do Planalto, as reações de Dilma e Lula antes e depois do “golpe parlamentar”, entre outras imagens privilegiadas para seu longa.

Com a lista do Oscar divulgada, faltou baba para tanta raiva da ala direitista brasileira. Se no passado o anúncio de um filme brasileiro ao prêmio americano era motivo de orgulho para toda a nação, dessa vez não foi bem assim. O Brasil dividido se refletiu mais uma vez, muito puxado pelos líderes políticos. E o que mais se diz é que o filme não seria, de fato, um documentário.

Bolsonaro disse que o filme é “uma porcaria”. O MBL (Movimento Brasil Livre) não parou um segundo de chorar pelo Twitter, dizendo que o documentário é “uma farsa gigantesca”. Já o PSDB afirmou que o documentário é uma ficção. Tudo foi dito e repetido por quem se reconhece nas ideias destes citados e muitos outros.

Petra Costa fez um documentário, sim. Eu não sou um especialista para dizer, mas o episódio de terça-feira do podcast da Folha de São Paulo, o Café da Manhã, convidou um para falar sobre o assunto, o crítico e fundador do festival É Tudo Verdade, Amir Labaki, que cobre cinema há 30 anos.

Amir disse que, independente do que é falado, Democracia em Vertigem é um documentário com todas as letras. A linha que Petra segue pode não ser a mais convencional dos documentários existentes por aí, mas ela mostra seus argumentos sobre episódios da política brasileira amplamente conhecido.

Muita gente pode pensar que um documentário é como uma grande reportagem ou uma forma de jornalismo. Amir nega, dizendo que esse pensamento vem do tipo de documentário que era feito há 40 anos, mais institucional. “Documentário é uma forma de arte. Não existe neutralidade em obra de arte”, disse.

Na casa dos 30 e poucos anos, eu me reconheci no filme de Petra. Os que não se reconhecem têm o livre arbítrio para criticar o ponto de vista dela. E, como Amir afirma, se você discorda radicalmente “vá e faça seu filme, apresente sua versão”. A direita até tentou, mas “sem a excelência cinematográfica e técnica como o filme da Petra”, afirma Amir.

Eu concordo! Afinal, cá entre nós, existem duas coisas que o pessoal da direita realmente não sabe fazer: cinema e memes.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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