Entre luzes e sombras

Por André Sallum | 17/01/2020 | Tempo de leitura: 2 min

Na jornada existencial muitos se deparam com situações que lhes despertam reações inesperadas, impulsivas e agressivas, como se um animal selvagem de repente se apossasse da personalidade, normalmente polida e gentil. Noticiários recheados de casos de violência, corrupção e aberrações comportamentais são amostras do pior do ser humano. Esses fatos revelam aspectos da conduta humana que pareciam superados pelo progresso da civilização, mas que estavam apenas mascarados ou temporariamente contidos. Ainda temos espaços sombrios no próprio ser que demandam paciente e perseverante trabalho educativo a fim de conseguirmos, individual e coletivamente, superar os remanescentes traços primitivos que influenciam nosso comportamento.

Por outro lado, em certas situações como acidentes, catástrofes ou eventos críticos, muitas pessoas são tomadas de tamanha coragem e têm atitudes tão altruístas – a ponto de arriscarem a própria vida para salvar a de outrem – que parecem figuras heroicas saídas dos livros de ficção. Manifestam atributos que pareciam não possuir, mas que, diante de circunstâncias as mais inusitadas, afloram e guiam seu comportamento. De modo mais discreto e sem nenhum destaque na mídia, incontáveis pessoas se dedicam continuamente ao cuidado de doentes, órfãos, carentes e portadores de necessidades especiais ou trabalham como voluntários pela educação, saúde e melhores condições de vida de estranhos, o que é a mais eloquente afirmação das melhores qualidades humanas.

Esses extremos – de um lado ações grosseiras e brutais e de outro atos abnegados e altruístas – mostram duas faces do ser humano, luzes e sombras entre as quais transitamos. Se temos, como humanidade, uma herança primitiva que ainda se manifesta com certa frequência, apresenta-se diante de nós vasto horizonte de possibilidades de aprimoramento, dignificação e sublimação de condutas e atitudes, consequentemente da qualidade das relações humanas (conquista já realizada por uma minoria que se torna inspiração para os demais).

Se o homem ainda é capaz de ações ou reações que lhe evidenciam o egoísmo mais brutal, também protagoniza atos de nobreza e generosidade que lhe demonstram uma natureza bondosa e altruísta. Tal realidade é reflexo, além da dualidade e alternância que nos caracteriza, da imensa heterogeneidade de tipos humanos e da disparidade de níveis de consciência entre os seres, ao mesmo tempo que mostra as imensas possibilidades de realização ao alcance da humanidade.

Trazemos nos arquivos inconscientes significativa herança do passado, a qual pode se manifestar como impulsos, reações e condutas nem sempre harmoniosas, de acordo com diversos estímulos e circunstâncias. O reconhecimento do nosso lado sombrio e primitivo, sua integração e cura tornam-se imprescindíveis como parte do processo de autoconhecimento para a transformação que nos conduza a patamares mais elevados de conduta e convívio.

Parece evidente a importância de admitirmos a nossa imperfeição, falibilidade e possibilidade de ações incorretas, o que nos evoca a necessária vigilância quanto aos próprios comportamentos. Por outro lado, o reconhecimento e o cultivo de nossos atributos essenciais traz uma perspectiva otimista e motivadora para que sigamos serenos e confiantes no caminho do autoaprimoramento, especialmente diante de experiências difíceis, dos inevitáveis desafios e de eventuais tropeços.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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