VIOLÊNCIA

Vítimas da gangue da bicicleta relatam trauma com celular na rua

Por Mariana Zylberkan e Lucas Lacerda | Folhapress
| Tempo de leitura: 5 min
Reprodução
Gangue da Bicicleta ataca e mulher tem o celular roubado no centro de SP
Gangue da Bicicleta ataca e mulher tem o celular roubado no centro de SP

Era uma manhã atípica quando a analista financeira Amanda Ribeiro, 24, tirou o celular da mochila para encontrar uma rota de ônibus durante uma pane na linha 1-Azul do Metrô, que a leva todos os dias para o trabalho no bairro da Saúde, na zona sul de São Paulo. Ela saiu da estação Ana Rosa e, em segundos, teve o aparelho arrancado de suas mãos por um ladrão em cima de uma bicicleta.

A mulher conta que correu três quarteirões para tentar alcançá-lo, mas desistiu ao vê-lo sumir entre os carros. Era por volta das 8h da manhã de uma quinta-feira. "Tinha bastante gente na rua, mas ninguém fez nada. Parei no meio da rua e comece a chorar e, só então, tive ajuda", afirma ela, que é moradora de Perus, na zona norte da capital paulista.

Presente inicialmente na avenida Paulista no fim da pandemia, a chamada gangue da bicicleta atua em locais onde há aglomerações, como saídas de estações, ruas com grande movimento de pedestres e pontos de concentração de bares e restaurantes.

Foi na frente de um bar no centro, durante a Virada Cultural, que o biomédico Ged Novais, 55, também viu o celular sumir das mãos enquanto chamava um carro de aplicativo. Morador de Pinheiros, na zona oeste, bairro onde a gangue da bicicleta é bastante atuante, ele conta que está acostumado a ficar atento ao usar o celular na rua, mas não foi suficiente. "Foi uma coisa muito rápida, eu simplesmente senti o celular sumir da minha mão. Não vi de onde ele saiu."

Assustado, ele conta que contratou um seguro para o novo aparelho. "Já me sentia bastante inseguro e, agora, estou em pânico. Fico com a sensação que serei assaltado novamente. A sensação de impotência é terrível, tenho vontade de sumir do meu próprio país."

Ele diz acreditar que seu celular roubado foi levado para o comércio ilegal de peças, já que a última localização consta em uma rua no centro onde funcionam lojas de conserto de aparelhos.

Felizmente, o biomédico conseguiu bloquear as contas a tempo e impediu mais prejuízo, diferente da analista financeira que teve a conta invadida minutos após o roubo. "Em 12 minutos, conseguiram a senha do meu celular e tiraram R$ 1.400 da conta", diz Amanda. Os ladrões também tentaram comprar quatro celulares em seu cadastro em uma loja online, mas ela conseguiu cancelar a tempo.

A gangue também ligou para seu noivo e exigiu R$ 5.000 para devolverem o celular, além de debocharem do que consideraram pouco dinheiro encontrado na conta. Sua mãe também foi contatada pelos bandidos. "Fiquei com bastante medo. Nos primeiros dias, não conseguia mexer no celular. Voltei sem ouvir música no metrô porque qualquer pessoa que chegava perto, eu ficava com medo", diz Amanda. Ela conta ter perdido três quilos em duas semanas e aumentado a frequência das sessões de terapia.

A cidade registrou 31.874. furtos de celulares de janeiro a abril deste ano. As estatísticas apontam para uma estabilidade deste indicador criminal, já que o número de ocorrências é semelhante ao mesmo período no ano passado, quando foram 30.190 casos. Não há detalhamento sobre em quantos casos o ladrão estava em uma bicicleta.

Mesmo assim, a sensação de insegurança impera. Na praça Olavo Bilac, em Campos Elísios, na região central, os comerciantes conseguem detalhar o modus operandi dos criminosos de tanto presenciarem furtos. O local é visado pela gangue de bicicleta pela concentração de bares e calçadas lotadas durante os finais de semana.

Nos primeiros quatro meses do ano foram registrados 23 boletins de ocorrência de furtos de celular na praça, número próximo aos 31 registros do mesmo crime no local ao longo de todo ano passado. Os roubos no local aumentaram quatro vezes no de janeiro a abril deste ano em comparação com o mesmo período no ano anterior, quando houve 3 ocorrências do tipo. Em 2025, subiu para 13.

Na delegacia da região, o 77º DP (Santa Cecília), houve aumento de 40,5% nos furtos de celulares nos quatro primeiros meses deste ano em relação a 2024. Foram 961 ocorrências antes 684.

Segundo relato de comerciantes, primeiro um integrante da gangue passa pela calçada em busca de uma vítima em potencial -de preferência, donos de celulares considerados caros, como os modelos com mais de duas câmeras- e usam fones de ouvido para se comunicarem com os comparsas.

Quando o alvo se distrai, seja para pedir um carro de aplicativo, mandar uma mensagem ou tirar uma foto, o ladrão passa de bicicleta, pega o aparelho e foge. Para evitar o flagrante, o celular é passado de mão em mão a outros integrantes da quadrilha.

Um desses comerciantes disse já ter presenciado integrantes da gangue da bicicleta levarem os aparelhos até um carro estacionado nas proximidades, onde havia uma pessoa com um computador, provavelmente, para invadir as contas das vítimas. Ele pediu para não ter seu nome divulgado por temer represálias contra seu estabelecimento.

Moradora da praça, Marta Regina Garro Tidei, 63, teve o celular arrancado de sua mão quando embarcava em um carro de aplicativo, na calçada em frente de casa, no ano passado. Ela se mudou para o interior, mas o medo persiste. "A insegurança aumenta. Mesmo no interior, quando via uma bicicleta, eu ficava tensa."

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que os casos do biomédico e da analista financeira foram registrados como furto e que "as equipes das unidades responsáveis estão empenhadas na apuração dos fatos".

A pasta também afirmou que 3.970 infratores foram presos e apreendidos nos primeiros quatro meses deste ano na região do 77º DP, 3,3% a mais do que no mesmo período do ano passado.

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