ENTREVISTA

Cracolândia: Anderson quer demolir casas e internação compulsória

Em entrevista a OVALE, prefeito de São José revela que prefeitura demole casas utilizadas para venda e consumo de drogas, mas admite a dificuldade em levar usuários para internação

Por Xandu Alves | 4 dias atrás | Tempo de leitura: 7 min
São José dos Campos

OVALE

Anderson Farias na redação de OVALE
Anderson Farias na redação de OVALE

A Prefeitura de São José dos Campos aposta em duas medidas para combater o tráfico de drogas na cidade e o surgimento de 'cracolândias'. Uma delas é a demolição de casas abandonadas utilizadas como locais para venda e uso de entorpecentes. A outra é convencer usuários a aceitar a internação, especialmente de pessoas em situação de rua. Ele defende até a internação compulsória de dependentes.

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"Na Rui Barbosa havia uma casa com 56 pessoas, 16 saíram presas e 14 estão presas agora há mais de um ano. Todos usuários. Fizemos a demolição, a retirada e acolhimento para todos, mas 95% não quiseram o acolhimento”, disse o prefeito Anderson Farias (PSD), em entrevista exclusiva a OVALE. Veja a entrevista completa aqui.

Segundo ele, o enfrentamento às drogas passa pelo atendimento da população em situação de rua, que acaba virando “cliente” de traficantes e aumentando a sensação de insegurança nas ruas.

“Essa situação de moradores em situação de rua que são dependentes é um problema de saúde pública”, afirmou Anderson, que é favorável à internação compulsória para tratamento de dependentes químicos. Confira os principais trechos da entrevista.

Como é feito esse trabalho para demolição e identificação dos pontos de venda e uso de drogas?

A gente faz a identificação de todos esses pontos. Na Rui Barbosa, por exemplo, a gente identificou uma casa que tinha muita movimentação e a casa já não tinha mais proprietário, não tinha herdeiro, já tinha dívida com o município, então há toda uma investigação. A Polícia Civil também faz a investigação da questão do que entra e sai, quem são as pessoas e aí na justiça a gente consegue, se expede lá um mandado para que possa fazer e adentrar no imóvel.

Na Rui Barbosa havia uma casa com 56 pessoas, 16 saíram presas e 14 estão presas agora há mais de um ano. Tinha lá dentro uma fábrica de cartaz, com mais de 200 cartazes: ‘estou passando fome’, ‘me ajuda’, ‘precisando de emprego’. E todos eram usuários. Fizemos a demolição, a retirada e acolhimento para todos, mas 95% não quiseram o acolhimento. Então, isso também é um processo que tira desse ambiente e põe na rua, mas na rua também a gente continua com a nossa acolhimento.

Agora recentemente tinha um comércio abandonado lá na Vila Maria, numa antiga padaria e lá se encontravam mais de 40 pessoas usando [drogas]. E aí você tem no meio as pessoas que são dependentes, os traficantes que se aproveitam para vender e os que se aproveitam para cometer crimes, ou seja, para furto, para roubo, às vezes na rua.

Aí intimida o cidadão comum que está ali transitando, está chegando do seu trabalho ou está indo estudar ou indo para a faculdade, ou saindo de madrugada, para ir para escola. Tem um trabalho forte de todas as forças de segurança e também das nossas equipes sociais. Nossas equipes sociais trabalham 24 horas por dia, sete dias por semana, o número 156 e 153 funcionam com a nossa guarda e com o nosso apoio social. São pessoas totalmente capacitadas para a gente abordar. Mas não é fácil. As pessoas às vezes acham que é só uma abordagem e a gente consegue tirar.

E a nossa cidade tem uma característica. Pela Rodovia. Presidente Dutra passa por mês pelo menos 300 pessoas em situação de rua, andarilhos. Boa parte deles para em São José dos Campos. O nosso Terminal Rodoviário é uma porta de entrada. E se pegar na entrada da cidade, a Avenida Nelson D'Avila, ali próximo da Rodovia Presidente Dutra no DCTA, embaixo das marquises, sempre tem pessoas ali, muitos são de fora. É questão de passagem pela cidade, mas a gente faz abordagem, oferece o acolhimento, é um trabalho com sensação de enxugar gelo, mas é um trabalho que tem resultados.

E não fazemos nenhum recâmbio sem ter o vínculo familiar na cidade ou vínculo com a assistência social da cidade. Infelizmente, as outras cidades não trabalham assim. Chegou lá: ‘onde você mora? São José, tchau’ e dá a passagem e manda para cá. É assim que vem e nós não fazemos isso. A gente vai atrás do vínculo familiar ou com assistência social da cidade para poder receber essa pessoa.

Em paralelo às drogas, há a questão da população em situação de rua. Como lidar com esses dois desafios?

Hoje nós temos outro problema. Um fenômeno que vem acontecendo no mundo, no Brasil e em São José não é diferente, que são as pessoas em situação de rua. Sempre digo que não temos moradores de rua, que perderam sua casa, perderam seu emprego e estão com os seus filhos e esposa na rua. Casos assim a gente consegue acolher rapidamente e essa pessoa não fica mais do que 24 horas na rua. Temos estrutura para atender e acolher essas pessoas.

Mas temos pessoas hoje que querem estar em situação de rua. São dependentes químicos na sua grande maioria, de álcool ou droga. A droga hoje está muito mais forte e os deixa mais agressivos. Quando não estão sob efeito da droga também são mais agressivos para poder conseguir e adquirir a droga. Aí você tem a questão do furto no Brasil. Eles cometem furto. Furto no Brasil na nossa legislação não tem pena. Não digo nem pela prisão, mas você não tem nenhuma pena de pelo menos ele ter que pagar algo, prestar um serviço. Não vai preso e eles sabem disso.

A polícia faz o papel dela: prende, prende, prende. Tem cidadão que é preso três vezes na semana em flagrante dentro de comércio, mas ele é solto, assim é a legislação e não é nem o judiciário. Eu estou falando da legislação. O judiciário nesse caso tem que cumprir a legislação, tem que soltar. Então não fica preso, mas a polícia faz o papel dela.

Essa situação de moradores em situação de rua que são dependentes é um problema de saúde pública. Esse tratamento o país não autoriza, a nossa legislação não autoriza uma internação compulsória. Nós temos mães que pedem para internar filhos. Você não pode levar e não pode pôr a mão, a não ser que ele queira. Então tem uma política que a gente precisa rediscutir essa situação.

O sr. é favorável à internação compulsória?

Eu sou favorável à internação. Se a gente pegar o histórico, vamos pegar desde o Frei Hans, aqui próximo de nós, com os resultados que teve, e são positivos, de fato consegue se recuperar. Mas também temos aqui as nossas clínicas, que contratamos. Tudo isso tem uma força de vontade da própria pessoa. Nós temos um apoio quando a gente tem essa oportunidade de levar uma pessoa pra internação, a nossa equipe social faz contato com a família, tenta reconectar, reconstrói os laços familiares. Tem o psicólogo, a assistente social, a equipe médica para atender, qualificação de mão de obra para a gente poder reinserir no mercado de trabalho, para devolver a dignidade.

Ele tem todo o atendimento, por isso a nossa campanha desde o ano passado de não dê esmola, dê dignidade. Se a gente der esmola, e não falo só o recurso financeiro, mas o alimento. As pessoas não vão passar fome, porque elas têm aonde ir. O poder público tem estrutura. Temos 17 abrigos adequados para qualquer um de nós passarmos um período que for lá necessário, com o chuveiro, com material higiênico pessoal, com roupa de cama, com alimentação. Pode levar gato, cachorro, bezerro, cavalo, o que você tiver de bicho de estimação. Temos abrigos específicos pra homens, mulheres, jovens, para LGBTQIA+, casais, quer dizer, temos estrutura para atender a todos.

Mas é um trabalho que não é tão simples assim essas abordagens, porque tem a questão da dependência. E quando a gente tem a questão da esmola, a gente afasta não só do poder público, mas afasta das igrejas, que também fazem um trabalho de acolhimento, das entidades, que também fazem um trabalho de acolhimento.

Então as pessoas que fazem com a maior boa vontade de querer ajudá-la, de levar uma sopa à noite, podia ajudar convencendo essa pessoa a ir para o abrigo naquela noite, e vamos dar essa sopa para ele lá no abrigo, até para ele conhecer o abrigo. O abrigo não é uma internação, é para ele poder passar uma noite, vai ser bem cuidado, mas tem regras, tem a questão das regras que não querem.

E a gente tem um combate com relação ao tráfico de drogas, seja por locais que a gente hoje tem até ação conjunta que faz até demolição de alguns imóveis que concentram muito dessas pessoas.

 

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1 COMENTÁRIOS

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  • João
    4 dias atrás
    Achei engraçado demais ele falando que é a favor da internação compulsória e depois falar no meio do discurso \"Depende da força de vontade da própria pessoa\" - TEM o porque da internação compulsória não funcionar e ainda é a favor e é incapaz de enxergar isso no próprio discurso! Além de ferir autonomia e dignidade humana, criar uma politica favorável a isso é um risco! Há diversos casos em que o processo de internação compulsória é utilizado de maneira injusta, muitas vezes para suprimir dissidências políticas, reprimir opositores ou para outros fins ilícitos. Alguns exemplos históricos incluem regimes autoritários que usam instituições psiquiátricas para silenciar críticos e dissidentes, rotulando-os erroneamente como \"doentes mentais\" para justificar sua detenção involuntária. Essa prática viola gravemente os direitos humanos e é considerada uma forma de abuso de poder. Seria ele um comunista????