Pesquisadores descobrem nova molécula que trata vício em álcool
A molécula MCH11, desenvolvida para atuar em uma área específica do cérebro, mostrou resultados promissores no combate ao alcoolismo. O composto, ainda em fase pré-clínica, reduziu o consumo de álcool em testes com camundongos e apresentou efeitos adicionais contra ansiedade e impulsividade, dois fatores que favorecem a recaída.
O estudo, realizado por pesquisadores das universidades de Madri e Alicante, foi publicado na revista Science Direct. O resultado demonstrou que o MCH11 impede a degradação da molécula 2-AG - uma substância do sistema endocanabinoide associada à regulação do humor e do estresse. Com isso, aumentam os níveis de 2-AG, o que diminui o desejo de beber e melhora sintomas emocionais.
A descoberta dos efeitos da molécula é promissora e pode atuar nas dimensões centrais do alcoolismo, diz João Maurício Castaldelli Maia, psiquiatra e professor do Instituto de Psiquiatria da USP. "Todo tipo de molécula que agir no sistema endocanabinoide possui especial interesse para os transtornos relacionados às adicções", completa.
O sistema endocanabinoide é um conjunto de receptores, moléculas e enzimas que ajudam a manter o equilíbrio interno (ou homeostase) do corpo e, portanto, regulam o humor, sono, apetite, dor, memória, imunidade e metabolismo. Segundo Maia, ele se acopla ao sistema de recompensa, no qual diversos outros neurotransmissores também atuam.
O psiquiatra diz que este tipo de ação não é totalmente novo, pois vem sendo estudado há mais de uma década e já possibilitou o desenvolvimento de outros medicamentos. "Porém, essa molécula em específico parece oferecer uma ação mais direcionada e potencialmente com menores efeitos adversos do que os antigos receptores do tipo CB1, como o rimonabanto, que foi retirado do mercado devido a efeitos psiquiátricos graves."
Os resultados também mostraram diferenças marcantes entre machos e fêmeas: os primeiros responderam a doses menores, enquanto as fêmeas precisaram de quantidades maiores para obter o mesmo efeito. Maia diz que isso ocorre devido às diferenças nas vias metabólicas, nos ambientes e na forma como cada pessoa reage ao efeito do álcool.
Os cientistas testaram a combinação do MCH11 com o topiramato, medicamento já usado em terapias para dependência alcoólica. A associação foi mais eficaz, principalmente entre as fêmeas. Apesar disso, o psiquiatra diz que dificilmente a nova molécula superará medicamentos já consolidados, como naltrexona, acamprosato e dissulfiram, que estão entre as opções mais eficazes, seguidos do próprio topiramato, baclofeno e gabapentina.
O próximo passo para confirmar a eficácia da molécula é realizar ensaios clínicos em humanos e, depois, estudos mais robustos. "Ainda não se sabe se essa molécula chegará à fase final em humanos, mas os resultados em animais indicam um possível efeito", conclui Maia.