Opinião

Mudar a mentalidade

31/03/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Foi o que disse o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton após as ofensas ditas pelo também piloto Nelson Piquet.

Referida ocorrência ocupou bastante espaço nos noticiários e rede social, em especial em vista do valor da condenação. Para quem ainda não sabe, foi fixada em 5 milhões de reais.

A decisão judicial avaliou muito bem os fatos, sua repercussão; o potencial de cada um dos envolvidos e o alcance a um indeterminado número de pessoas.

Ainda que se pondere o valor da condenação, tal resultado que sirva de exemplo para que aqueles que cometem ilícitos dessa natureza, sintam muita dor onde mais dói : NO BOLSO. Obrigando-os a pensar várias vezes antes de ofender quem quer que seja.

A tradição e nossa legislação ainda é branda nesses aspectos, pois, invariavelmente, os causadores dessas ofensas ao serem processados, findam por entregar cestas básicas, o que, não se exige muito esforço do intelecto, para concluir que tal condenação não os inibe a repetir os danos causados.

Vale lembrar daquele sujeito que divulgou na rede social que estava vendendo um "escravo africano legitimo, único dono, bom estado de saúde ...", que teve a pena de reclusão convertida em 365 horas de prestação de serviços a comunidade! Notem: uma ofensa dessa ordem paga com horas trabalhadas! Certamente não inibirá sua repetição.

Igualmente aquela médica que perguntou a uma menina com 3 anos de idade se ela "era filhote de urubu ou de macaco", passando também pelas ofensas à religião, jogadores de futebol etc. Chega, né?

Já passou da hora de diminuir tais comportamentos e a melhor maneira são condenações judiciais que realmente inibam a repetição, com a aplicação de penas severas e de alto valor econômico. Caso contrário, o quadro não se modificará!

Outra forma para combater tais abusos é com a inclusão real e eficaz de pessoas negras, homossexuais, com deficiência, mulheres, enfim, aqueles chamados de "minoria", pois têm absolutas e plenas condições de avaliar o estrago deixado pelos ofensores e pessoas que excluem sob a sensação da impunidade.

Nessa esteira, estamos aguardando ainda o resultado de julgamento, pelo STF, do chamado "perfilamento racial", no qual se discute a forma pela qual as pessoas negras são avaliadas, comparadas às não-negras. Na hipótese, se discute o fato de uma pessoa negra portar 1,53 gramas de entorpecente e for classificada por "traficante", sendo que tal abordagem recaiu, como de costume, diretamente contra a pessoa negra, que, se não fosse negro, seguramente seria interpretado como "usuário".

O tema é polêmico, sem qualquer sombra de dúvidas, mas um fato é muito certo e, como costumo dizer: "Só quem é sabe o que é ser". Só quem é sabe o quanto constrange ser acompanhado por segurança em supermercados, que para o não-negro é imperceptível, porque transitam livremente nesses ambientes; sabe o quanto dói ser chamado de "macaco", "fundo de panela", entre outros; ser recusado no mercado de trabalho apenas por ser negro; receber tratamento diferenciado pelas Polícias, Ministério Público, Judiciário; na Saúde; o estrago é imensurável.

A ausência dessas pessoas em postos de mando dificulta sobremaneira e entrega de políticas públicas universais, na medida em que estão muito distantes daqueles e são lembradas apenas nas proximidades das eleições.

Dias atrás surgiram muitas manifestações por conta do "Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial". Os eventos, palestras, debates foram vistos em todo Brasil, significando que o tema ganhou musculatura e proporções evidenciando a necessidade de "mudança na mentalidade", ainda que com raízes profundas nas entranhas da sociedade.

A legislação Nacional assegura garantia da dignidade da pessoa humana. Assim sendo, todas as pessoas devem obediência a esse comando, pois estamos tratando de "PESSOAS HUMANAS", independentemente da cor da pele.

Ainda que possa parecer sonho... eu sonho, mesmo sabendo que não terei tempo para vivenciar profundas mudanças, porém, sem falsa modéstia, estou oferecendo minha humilde parcela de contribuição a esse incessante combate.

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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