A ótima jornalista Luana Nascimbene trouxe uma oportuna matéria ao JJ intitulada: "Paulista tem entrave em negociação da SAF, mas mantém otimismo". Na chamada da matéria, há o lembrete sobre as dívidas do Galo junto ao Banco Fator. Mais do que dívidas, há dúvidas:
Onde é que o torcedor do Paulista pode se informar sobre as dívidas que o clube tem com a instituição bancária? Aliás, o quanto, de verdade, o Tricolor Jundiaiense deve? Onde as contas estão? Os balanços são claros?
Há muito sigilo - carregado de antipatia e mistério - em todo esse processo. Das primeiras negociações com os prazos vencidos, até a presente data, pouco se fala de oficial. A palavra do clube é de que "estamos fazendo tudo com calma e responsabilidade". O interessado nada fala. E o aficionado apaixonado fica sem saber o que pensar.
É óbvio que a diretoria do Paulista não falará dos trâmites, do que está travando, e terá, por lógica, um discurso de positividade. Normal tal fato. Mas a não clareza do mais importante: qual é a proposta (que se resume a quais são os valores e condições), irrita e traz incertezas.
Antes de mais nada: eu sou a favor de SAF auto-gerida (como o Fortaleza, que não vendeu a sua e está sendo administrada pelos competentes membros do clube), SAF vendida (como o modelo do Bahia City, clube-empresa (como o Retrô-BA), arrendamento profissional via multiequipes (como faz a Red Bull com o Bragantino). Em suma, defendo gestão profissional.
A questão é: qualquer que seja o modelo (até mesmo no modelo de clube associativo, que não precisa de SAF, como Flamengo e Palmeiras), há de se ter competência.
Insisto em um mito: o de que a SAF é a "salvação dos clubes". Nada disso, as Sociedades Anônimas de Futebol são empresas como outras quaisquer, apenas regidas por um regime adaptado ao esporte. Nelas, existem os bons e maus gestores. Não quer dizer que uma equipe que se torna SAF, melhorou ou piorou. Pode acontecer ambas as coisas, como nada acontecer também.
Os exemplos são variados: olhe o desastre que tem sido a SAF do Coritiba (torcedores paranaenses fizeram uma "romaria" para São Paulo, a fim de protestar contra os donos - o Tree Group). Olhe o sucesso que é a do Bahia (está de novo em competições internacionais, não passa vergonha e nem deve para ninguém).
E o que esperar da SAF do Paulista?
Eis o problema: eu, que procuro estudar o assunto, não posso dizer nada! E explico:
Não sei a proposta financeira (se for a SAF por 10 anos, a troco das dívidas, talvez seja uma boa). Mas... qual é o valor real das dívidas? Quem quer assumir a SAF (a EXA Capital) tende a sobrepujar para dizer que está pagando caro. E no mundo das negociações, os lados fazem sua proposta e sua contraproposta.
O que acho um péssimo negócio: caso o Estádio Jayme Cintra for cedido em definitivo, é algo absurdo. Qual o valor do terreno, da obra e das demais benfeitorias? Imagine as pessoas que se sacrificaram para construir o estádio, o que pensariam? Se depois de 10 anos, a EXA não renovar o contrato, o Paulista SAF volta para a gestão do Paulista FC, e não teria onde jogar. O razoável é: o Paulista FC ceder por comodato o Jayme Cintra enquanto a EXA gerir a SAF. Acabou o contrato, volta para o Galo. Se não for isso, é um baita mau negócio.
Imagino que o Poder Público deve estar atento a isso. Afinal, ninguém quer o "capital político" de ver o Paulista vender o seu estádio e nada ter feito. Mas repito: ninguém sabe qual a proposta, o que foi ofertado e a contraproposta.
Enfim: nada está assinado, e nenhum tostão foi investido. Tudo ainda é intenção. Nenhuma dívida trabalhista foi paga, apenas foram "conversadas" para que, caso se assuma, o novo gestor gaste menos do que o valor original.
Gosto da frase do jornalista Mauro Cezar Pereira: "O Mundo Maravilhoso das SAFs"! E ele costuma, em outras palavras, complementar: "Para quem deve, aceita qualquer trocado de SAF para pagar conta; para quem não precisa, SAF pra quê"?
Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)