OPINIÃO

São Paulo, 40 graus


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Escrevo esta coluna do Rio de Janeiro, onde vim participar de um curso. Ali fora, em Copacabana, a sensação térmica é de 44ºC, mas Jundiaí marca 31º, com o povo reclamando do calor intenso e da sensação de fritura para quem trabalha ao ar livre. 

Mesmo na contramão do mundo ocidental, os fieis do ESG (sigla para meio ambiente, governança e social) alertam há anos para o aquecimento global e o impacto da emissão dos gases de efeito estufa, que só será diminuído com uma descarbonização de nossa frota e projetos com energia limpa.  O Brasil tem grandes chances de liderar na América esse novo modelo econômico verde, já que, desde a década de 70, investimos em biocombustível, etanol e outras soluções que substituem o petróleo e sua maligna emissão de carbono na atmosfera. 

Estamos vivendo período de chuvas intensas e períodos mais extensos de secas. Quem cuida do próprio jardim, como eu, já sabe que as orquídeas agora têm de ser molhadas diariamente e que as chuvas estão sucedidas por dias muito quentes e secos. 

Não vi ainda um documento que mensure o valor que as cidades terão de gastar para se adaptarem às mudanças climáticas. O governo de São Paulo saiu à frente e criou um gabinete de crise. Em nossa região, não há uma cidade que desponte na liderança deste diálogo que deve ser de todos (não adianta começarmos a reclamar somente quando houver escassez de água nas torneiras e o racionamento diário no abastecimento).

A verdade é que aquele mundo onírico onde tudo que se planta dá não existe mais. As cidades têm de investir na criação de parques, edifícios e telhados verdes e reduzir drasticamente a presença de veículos e frotas a diesel de suas ruas. A cidade de São Paulo tem feito com maestria a organização de empreendimentos de uso misto, com lojas, escritórios e residências coexistindo no mesmo espaço, evitando deslocamentos desnecessários. 

Precisamos construir sistemas de retenção de água de chuva, como jardins de chuva e bacias de infiltração, para combater enchentes e aumentar a disponibilidade de água, assim como incentivar práticas de reuso de água em edifícios residenciais e comerciais, como exigência para os novos empreendimentos. 

Ainda não vi por aqui a discussão de benefícios fiscais (IPTU mais barato?) para construções sustentáveis e tecnologias verdes nem mesmo o estudo sobre áreas de ventilação natural e corredores ecológicos. 

Nossas ciclovias são diminutas, há anos não temos um projeto decente de integração deste modal e olha que Jundiaí tem um número crescente de ciclistas. Esse sistema arcaico de terminais urbanos faz as pessoas darem mil voltas na cidade antes de chegarem a seu destino, consumindo mais combustível e tempo. A nova concessão de transporte público, já aprovada na Câmara de Jundiaí, prevê quantos ônibus eletrificados na nova frota que vai servir a cidade?

Outra pergunta que precisamos fazer é como está o novo projeto de reservação de água, assim como medidas eficientes - com uso de inteligência artificial - para diminuir a perda de água durante o trajeto em nossa rede de abastecimento. 

Jundiai sempre esteve à frente de mitigações ambientais. Dou graças aos pioneiros - e aí incluo meu saudoso pai - que trabalharam em prol da despoluição do Rio Jundiaí e outros que se lançaram a construir a represa de reservação de água. Mas as urgências agora são imediatas. Ou tomamos a dianteira das mitigações climáticas ou veremos nossa Serra do Japi virar cenário inóspito do filme “Duna”. O meu maior temor. Seca e teocracias absolutistas.

Ariadne Gattolini é jornalista e escritora. Pós-graduada em ESG pela FGV-SP e editora-chefe do Grupo JJ

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