OPINIÃO

Marketing e política


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Nos deparamos, cada vez mais, com promessas políticas que jamais serão cumpridas. Infelizmente, nossa população – afeita ao efeito do faz-de-conta e compradora de ilusão – cai rapidamente em bravatas divulgadas pelas redes sociais, sem nenhum conhecimento de como a máquina da gestão pública funciona tampouco as regras de um orçamento municipal.

O marketing se sobrepõe a essa falácia. Somos a cidade das crianças? Será mesmo? Com uma fila de 1,5 mil alunos para serem laudados para deficiência, a que criança nos referimos? Com crianças de 10 anos sem saber ler e escrever, que demoram mais de dois anos para chegar ao apoio pedagógico especializado, que criança é essa? Políticas públicas para crianças são em tempo real. A janela de conhecimento neural de uma criança é fantástica e não podemos perder o momento de estimulá-la na idade correta.

Em Sorocaba, nossa vizinha, o prefeito Rodrigo Manga é um fenômeno de marketing. Ele aparece cantando rap, de óculos escuros, mostrando com simplicidade qual é o real repasse de recursos federais no município. O ponto positivo é que ele conhece a linguagem do povo e consegue colher frutos com sua comunicação, a ponto de ser magnificamente reeleito.  

Entretanto, nem sempre o que ele diz condiz com a realidade e com a legalidade. Jones Martins, secretário de Finanças de Louveira, fez a seguinte consideração:

“Manga tem divulgado incentivos fiscais para diferentes setores, como o desconto de 15% no IPTU para postos de gasolina que não aumentarem o preço dos combustíveis e a isenção total de IPTU para empresas produtoras de café, sob o argumento de evitar aumento no preço do produto. São propostas que parecem vantajosas à primeira vista, mas que, na prática, não se sustentam. O preço dos combustíveis, por exemplo, não é definido pelo dono do posto, mas sim pelo mercado e pela política de impostos estaduais. Já no caso do café, o custo final ao consumidor depende de fatores muito além do IPTU, como a cotação internacional do grão e os custos logísticos.

Fui pesquisar para entender melhor o impacto dessa isenção do café e descobri que Sorocaba tem três empresas registradas no CNAE C-1081-3/02, que corresponde à moagem e torrefação de café. Considerando que cada uma delas paga, em média, R$ 100 mil de IPTU por ano, o impacto total da isenção seria de aproximadamente R$ 300 mil anuais. Pode não parecer um valor tão expressivo dentro do orçamento municipal, mas a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) exige que qualquer renúncia de receita tenha uma compensação – seja aumento de outro tributo ou corte de despesas. E mais: já pensou se outros setores começarem a propor o mesmo benefício sob a justificativa de não repassar o custo ao consumidor? O setor de panificação, supermercados, farmácias e tantos outros poderiam reivindicar isenções semelhantes, e, nesse ritmo, de onde viria o dinheiro para manter os serviços públicos?”

Não se enganem, quando um político promete obras ou isenções, é preciso avaliar mesmo se há previsão no orçamento ou no plano plurianual para tais eventos. A gente só melhora segurança contratando mais policiais (há recurso para isso?); a saúde investindo em mais prevenção, o que inclui alimentação de fato e educação; inclusão, somente com profissionais capacitados e salas adequadas;  emprego, com mais empresas. O resto é conversa mole pra boi dormir.

Ariadne Gattolini é jornalista e escritora. Pós-graduada em ESG pela FGV-SP. Editora-chefe do Grupo JJ

Comentários

1 Comentários

  • VIVALDO JOSE BRETERNITZ 10/02/2025
    Texto lúcido, escreva mais e não publique asneiras que outros colunistas vem produzindo.