Em 27/12/ 2007 entrou em vigor a Lei Federal n. 11.635, que instituiu o dia 21 de janeiro “Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa”.
A data remete ao falecimento da líder religiosa Gildasia dos Santos Santos, (‘Mâe Gilda”), fundadora do “Ilé Axé Abassa de Ogum” , em pleno funcionamento em Itapuã - Salvador, cuja ocorrência se deu por conta de matéria publicada no jornal da IURD, tratando-a por charlatã e outros impropérios, permitindo que algumas pessoas instigadas e carregadas de ódio, agredissem a religiosa até como uso de bíblias, apedrejamento, incêndio ao terreiro, sendo que a religiosa não suportou tanta violência física e psicológica sofreu infarto fulminante.
Aqui em Jundiaí a Iyalorixa Rosana de Yansã teve seu terreiro, em pleno funcionamento no bairro Água Doce, integralmente incendiado no dia 26 de setembro de 2017 e, até os dias atuais, não foram identificados os autores, pois há suspeita de que foram duas pessoas. Nesse caso, a Iyalorixá Rosana teve força suficiente para suportar o ataque, recuperou todo o terreiro e retomou as atividades.
Não se pode ignorar que as religiões de raiz afro sofrem ataques de toda a natureza desde a Bula Papal RomanusPontifex, de 1454, na qual o papa Nicolau V, autorizava o sequestro dos negros africanos, reduzindo-os a “coisa” e, sob alegação de “evangelização” escravizá-los mediante violência sem medida, com reflexos até os dias atuais.
Eu, particularmente, entendo que a designação“tolerância”, remete a “tolerância”. Assim eu não quero ser “tolerado”, quero sim ser “respeitado".
Interessante notar que o poder público federal, provavelmente entendendo que “intolerância” não seria adequado, baixou o decreto 12.278, de 29/11/ 2024 instituindo a “Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e de Matriz Africana”, do qual se extrai a seguinte definição: “Art. 2º A Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e de Matriz Africana tem a finalidade de promover medidas intersetoriais para a garantia dos direitos dos povos e das comunidades tradicionais de terreiro e de matriz africana no País, com base no reconhecimento, no respeito e na valorização da cultura e da memória dos afrodescendentes, e a superação do racismo.
§ 1º Povos e comunidades tradicionais de terreiro e de matriz africana são considerados como povos e comunidades tradicionais, para fins do disposto no Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, por serem grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, por meio da utilização de conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.
Já tive a oportunidade de escrever nesse espaço que existe ferramental jurídico potente que pode muito bem ser utilizado em caráter pedagógico e, diante das maldades, impor penas severas contra os autores, inclusive ao instigador da demonização e do ódio. Ao responsabilizar os líderes religiosos que instigam o ódio e as igrejas que frequentam, com a condenação pecuniária de alto valor, seguramente, deixarão de provocar tanto ódio contra qualquer segmento religioso notadamente contra as de matriz afro, agravado por se tratar de religião de pretos “tipificando racismo religioso”.
Vivemos em um País democrático onde se garante a liberdade da fé, crença e proteção às manifestações e liturgias. Sendo País de dimensões continentais oferece espaço para todas as pessoas e religiões e, nesse sentido, a educação - enquanto educação formal – exige ação pontual e de muita qualidade com necessária revisão de todo material didático e da formação da nobre classe do professorado, além do também necessário letramento.
José Saramago disse: “Eu acredito no respeito pelas crenças de todas as pessoas, mas gostaria que as crenças de todas as pessoas fossem capazes de respeitar as crenças de todas as pessoas.”
Eginaldo Honório é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)
Comentários
2 Comentários
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Railson Vieira Loures 26/01/2025Bom dia meu caro amigo Dr Eginaldo. Que bom que você trouxe mais um elemento “comprobatório” que está na raiz dessa “doença social do mundo ocidental”, que foi a citação da Bula Papal de 1454! São séculos de desrespeito formalmente defendido, veja só, por quem era visto como “autoridade máxima” e exemplo para uma imensa maioria deseducada e facilmente manipulável!! Há muito o que “desconstruir”!! Abs
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Sidinei Miguel 24/01/2025Parabéns!!!! Muito boa matéria precisamo disso , Doutor Eginaldo como sempre cirúrgico