Os olhos em pranto da moça, na outra semana, ficaram comigo. Triste demais! Foi a São Paulo com o marido para compras na Galeria Pagé 25 de Março. Nas proximidades, havia uma movimentação estranha em torno de um prédio. Detiveram-se para observar. Muita gente por lá.
No local se encontravam bombeiros e outros profissionais habilitados para ajuda nas tentativas de se jogar de um prédio. Disseram que o esforço para contê-lo começara logo cedo. O homem, do 10º andar, vinha à sacada, subia e retornava. Por certo, no andar do apartamento, deveria haver quem se empenhava para que ele desistisse do intento.
O tempo corria e alguns, que acompanhavam apenas por curiosidade, por incrível que pareça, começaram a fazer apostas sobre a queda ou não. Um falou alto que, com a aposta, estaria com o Natal garantido. Meu Deus do Céu! Alguns gritavam para que se jogasse logo e outros para voltar para dentro. O ser humano é capaz de tudo. O inesquecível Dom Joaquim Justino Carreira gostava de citar São Filipe Néri, que dizia a Deus: "Senhor, segura o Filipinho pelos cabelos". Em alguns momentos também faço isso.
Quando a moça saiu da Galeria, o impasse continuava e, quase em seguida, o homem se jogou.
Acredito firmemente que uma pessoa se suicida por não aguentar a dor que está sentindo por dentro. Quer aliviar essa angústia que sangra, às vezes acumulada ao longo dos anos. É alguém que não aguentou a dor que o(a) torturava por dentro. Ninguém tem domínio sobre a resistência individual. Fazer apostas diante de uma situação como essa me pranteou a alma. Rezo pelo desconhecido e pela conversão dos apostadores.
Domingo passado, 2º. Domingo do Advento, o Padre Márcio Felipe de Souza Alves, Reitor do Santuário Diocesano Santa Rita de Cássia, em sua homilia, falou fortíssimo sobre o Evangelho (Marcos 1, 1-8):"Esta é a voz daquele que grita no deserto: 'Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas estradas'! Foi assim que João Batista apareceu no deserto, pregando um batismo de conversão pardas o perdão dos pecados".
Comentou sobre o Senhor vir ao nosso encontro; o Senhor que enxerga a humanidade de seu povo individualmente e veio para salvar a todos. E Ele é paciente como foi proclamado na segunda Leitura (2 Pedro 3,9): "Ele está usando de paciência para convosco, pois não deseja que alguém se perca. Ao contrário quer que todos venham a converter-se".
Citou que Isabel, prima de Maria, estava, por certo, fragilizada pela idade, grávida de seu filho João Batista. Maria vai até ela para se colocar a serviço e mostra que Deus está com ela. A criança exultou em seu ventre.
Não há obstáculo, disse Padre Márcio Felipe, que impeça o Senhor de chegar até nós, mas acolhê-lO é uma resposta pessoal. Precisamos deixar-nos tocar por Deus. E acrescentou que a missão do cristão é olhar a humanidade das pessoas e preparar o caminho para se deixarem ser tocadas por Ele.
Há palavras que me despertam e sacodem: olhar a humanidade de todas as pessoas me comove, pois é o jeito de Deus vir até nós, apesar de nossas misérias. Olhar a humanidade de todas as pessoas é um convite para que eu aja assim, consciente de que há aqueles e aquelas que crescem carregados de dores e cicatrizes e suas ações são o resultado de agonias em carne viva.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)