ACESSIBILIDADE

Deficientes visuais e a luta por inclusão

Para a comunidade das pessoas com deficiência visual, a forma de experimentar o mundo é distinta; falta de visão traz desafios

Por Yasmim Dorti | 03/09/2023 | Tempo de leitura: 4 min
Jornal de Jundiaí

ARQUIVO PESSOAL

Erika Rack Drezza é pedagoga especializada em Deficiência Visual e é professora de braille
Erika Rack Drezza é pedagoga especializada em Deficiência Visual e é professora de braille

O mundo é repleto de paisagens, culturas e experiências únicas. No entanto, para a comunidade de pessoas com deficiência visual, a forma de experimentar este mundo é distinta. A falta de visão impõe desafios no dia a dia, desde a simples tarefa de atravessar a rua até questões mais complexas, como acessibilidade em locais públicos.

Manuela Carvalho de Oliveira, 8 anos, é deficiente visual e sua mãe, Magda Souza Carvalho de Oliveira, 45 anos, conta que percebeu a deficiência da filha com 3 meses. "Entre idas ao oftalmologista e neurologista, consulta paga em SP e um ano de atendimento na Unicamp, encontramos o Braille, onde ela tem atendimento até hoje. Nessas consultas, não tivemos um laudo definitivo, mas ficou com a possibilidade de ser Amaurose de Leber. Ela cursa o segundo ano na escola, já lê e escreve em Braille. Iniciou o aprendizado na pandemia via chamada de vídeo e hoje vejo a sua evolução escolar", conta a mãe.

Magda revela dificuldades. "As pessoas precisam entender que elas [pessoas com deficiência] têm desejos e opiniões. As perguntas devem ser direcionadas, como é feito para outras crianças. Nesses casos, eu preciso interagir com as crianças e incluir ela na brincadeira", relatou Magda.

Diva Raquel Schiavinato, 59 anos, perdeu a visão aos 4 anos de idade, por um erro médico. "Quando eu tinha 6 anos de idade, minha mãe procurou por ajuda e encontrou o Instituto Luiz Braille. Não tinha muitos cegos na cidade naquela época e minha mãe aprendeu braille para poder me ajudar. Eu continuei estudando na escola normal e essa professora me acompanhava no período primário. Quando moça, minha mãe me colocou em uma escola interna em São Paulo só para deficientes visuais. Eu cheguei a trabalhar em Campinas por 13 anos na Sobam, na Ecom, como auxiliar de raio X, tomografia, ultrassom, mesmo sendo cega", contou Diva.

"Hoje em dia não tenho nenhuma dificuldade, eu faço leituras na igreja. Eu ando bem com a minha bengala, vou para São Paulo sozinha, eu me localizo bem, mas o problema hoje em dia é que Jundiaí tem muitos buracos ainda, se tem alguma árvore na frente eles não te avisam e você bate sem querer", relatou.

EDUCAÇÃO

A educação também é um campo em constante evolução para pessoas com deficiência visual. Graças a avanços tecnológicos, como softwares de leitura de tela e impressoras em Braille, a educação inclusiva tem se tornado mais acessível.

De acordo com Erika Rack Drezza, pedagoga especialista em Deficiência Visual, o Braille é um sistema muito complexo, porém imprescindível. "No caso das crianças que nasceram cegas ou perderam a visão na primeira infância, após trabalharmos através de materiais adaptados, todas as habilidades que antecedem o aprendizado do Sistema Braille, elas irão se apropriar do mesmo sem muitas dificuldades. Já o adolescente ou o adulto com cegueira adquirida, podem ter certa dificuldade tátil pela patologia ou por não ter o tato desenvolvido. Eles vivem uma realidade de descobertas táteis, auditivas e olfativas que serão armazenadas na memória e lhe propiciarão o desenvolvimento de habilidades para uma vida com independência", explicou a pedagoga.

Além disso, Erika explica sobre a inclusão nas escolas. "Muitas escolas tem um professor que auxilia o aluno em sala de aula para que o mesmo possa acompanhar o conteúdo com melhor qualidade, já que o Braille possui uma leitura e uma escrita mais morosa do que o convencional. Existem 'professores inclusivos'. Se o nosso aluno com deficiência visual tiver a sorte de estar na sala desse professor com um olhar diferenciado, com certeza vai conseguir acompanhar", explicou.

BIBLIOTECA

Para atender as pessoas cegas, a Biblioteca Municipal Nelson Foot possui acervo em braille, em áudio e equipamentos para esse público (como ampliador automático para pessoas com baixa visão e scanner leitor de mesa). Atualmente, o acervo é formado por aproximadamente 1500 volumes em braille e 300 em CD de áudio. Todo o acervo fica acondicionado num espaço logo na entrada da Biblioteca, onde também possui um mapa tátil do prédio. Apesar disso, a frequência de usuários cegos é muito baixa.

ACESSIBILIDADE

Atualmente, a discussão sobre acessibilidade ganha cada vez mais relevância e a adaptação de locais para pessoas com deficiência visual tem se mostrado um desafio que vai muito além da simples disponibilidade do sistema Braille.

Professora da rede municipal, Carina Conceição Vieira Franco, 48 anos, atua na sala de recursos multifuncional para estudantes com deficiência visual e explica que a acessibilidade deve ser pensada em todos os âmbitos. "O sistema braille é muito utilizado na parte de educação, mas em um restaurante ou em outro local, o braile nem sempre é o caminho mais fácil. Hoje a gente tem que pensar quais possibilidades de acessibilidade esses locais oferecem, porque nisso é que está o problema. O cardápio tem QR code? Porque se a pessoa cega abre no celular, o aparelho vai ler o cardápio para ela. Tem pessoas preparadas pra orientar essa essa pessoa dentro do restaurante? Alguém que saiba orientar? Tem áudio descrição? Quando a gente pensa em acessibilidade, a gente não pode fechar em um sistema."

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