Semana passada, em reunião com o grupo de mulheres da Pastoral/ Magdala, conversávamos a respeito da dor em sintonia com a Cruz de Jesus Cristo.
Fazendo um parênteses, recentemente o prestigiado e querido Dr. Edgar Antonio de Jesus, de gentileza ímpar, que me honra em ler estas crônicas, me disse que escrevo sobre histórias tristes. Verdade! São de pessoas com quem me deparo no dia a dia e me emocionam. Preciso dizer delas, pois, mesmo com inúmeros dissabores, reagem. Preciso dizer delas pois, alguns que me leem, às vezes nem imaginam que há gente que veio de infância destruída por todos os tipos de miséria.
Voltando à conversa com o grupo de mulheres, algumas delas nos disseram sobre a dor e a dificuldade com gente de sangue, bem próxima, que se deixou levar pelas drogas. Tentaram muito que não fossem, mas há momentos em que crianças se tornam adolescentes e adolescentes, jovens, e acabam por escorrer dentre os dedos de seus responsáveis.
Lembrei-me de duas moças que conheci no início da Pastoral. Jovenzinhas sem sonhos. Viviam um cotidiano cinza, na possibilidade de um cigarro de maconha ou de cocaína. Quando a ansiedade tornou-se maior ainda, optaram por tomar baque, ou seja, injetar cocaína na veia. Uma delas chegava a inocular na veia do pescoço.
Injetada na veia, vai direto para o coração, depois para os pulmões, e volta para o coração, de onde será bombeada para o cérebro. O efeito é muito mais rápido, que o obtido pela inalação.
Uma delas experimentou, naquela época, a primeira pedra de crack e, depois vieram diversas Fez de tudo para proteger a amiga, a fim de que não a usasse. Não conseguiu. Antes dos 30 anos, não estavam mais conosco. Uma partiu em situação de violência e a outra por doença decorrente dos baques de prazer.
Não é fácil! Muitas pessoas residem acotoveladas nas periferias das cidades. Habitações encostadas em vielas, cortiços, quintais, cujo portão da frente dá ideia de que há espaço para ser e se desenvolver. Moradores desesperançados que exalam o cheiro de álcool pelos caminhos escuros das noites sem luar. Proximidade das drogas para uma experiência que se torna prática diária. Como podem os responsáveis, empurrados para a pobreza, ter pelo menos um muro, com flores dependuradas, para que os filhos não sejam da rua? Isso não quer dizer que nas outras classes sociais não hoje quem use droga, contudo, com raras exceções se integram na população da rua.
Na Jornada da Juventude, em Portugal, no bairro da Serafina, que é o mais pobre de Lisboa, o Papa Francisco conclamou a todos que "sujem" as mãos para combater a pobreza e fazer valer a solidariedade. E prosseguiu: "
É preciso fazer como Cristo, que se abaixou para lavar os pés dos apóstolos para curar as solidões, os medos, os sofrimentos, a dor, o abandono, a morte. Esse é o amor concreto, crível, que nos leva a dobrar os joelhos, a deixar que o coração se comova, que as lágrimas corram pelo rosto",
Nas ruas, diferentes personagens se encontram e na inviabilidade da esperança, fogem nos entorpecentes. E agora há K2, K4, K9...
Acredito muito que os caminhos de Deus salvam e dão sentido ao existir.
Há poucos dias, o Padre Márcio Felipe de Souza Alves contou-me que São João Batista Maria Vianney (1786 - 1859 - França), na rua, perguntou a um menino onde era a igreja. Ele lhe apontou com o dedo. São Vianney respondeu a ele: "Você me apontou a Igreja e eu vou lhe apontar o Céu".
Creio que nos falta apontar o Céu, com gestos concretos, aos aspirantes ao uso de drogas e, em especial, aos mais excluídos.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)