Opinião

Brincadeira de mau gosto

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Um cidadão, com extremo mau gosto, publicou na rede social a oferta de "um negro africano, com pouco uso, ... um escravo baratinho. Único dono". Denunciado, foi condenado a pena de 1 ano de reclusão, substituída por 365 horas de prestação de serviços à comunidade e multa equivalente a três salários mínimos. Em sede de defesa, o argumento, como de costume, ficou limitada a uma "brincadeira"!

Então, né? Em que se pese a convicção do judiciário paranaense, a meu olhar, o resultado imposto a tal "brincadeira" confirma que os crimes raciais no Brasil são os famosos "crimes perfeitos", vez que a condenação não inibe novos casos e nem sua repetição.

Notem que o autor da ofensa, ao cumprir a pena (prestação de serviços à comunidade), mantém e manterá o fato como só uma "brincadeira", enquanto a vítima, seus familiares, conviverão com essa mágoa para todo o sempre, vez que atinge a própria alma com reflexos a toda a comunidade negra. Efetivamente, NÃO SE TRATA DE APENAS UMA BRINCADEIRA!

Esse tipo de comportamento se repete todos os dias, sendo que tais ofensas ganharam maior proporção recentemente, como, por exemplo,   divulgação por toda a imprensa do regime de escravidão imposto aos colhedores e uvas no Estado do Rio Grande do Sul; aquele cidadão que foi chamado de "macaco" em um posto de gasolina; ofensas e invasões aos territórios indígenas; aumento dos casos de infanticídio e feminicídio; embaixador brasileiro no Mali (África) subjugando e humilhando os servidores; ofensas aos jogadores de futebol; ex-BBB ofendida no aeroporto de Guarulhos; Diretor de grande emissora de TV segregando camarins de acordo com a cor da pele dos artistas; ambulante chamado de "macaco" no Carnaval da Bahia; e por ai vai...

Certamente virão comentários alegando que sempre foi assim e que estamos diante do clássico "mimimi" e que era apenas um brincadeira!  Infelizmente, como disse a potente Glória Maria, "Quem não é preto nunca vai entender".

É a mais pura verdade, tanto que toda vez que se busca proteger a dignidade das pessoas negras, os comentários se repetem, exatamente pela absoluta ausência de empatia. Vale dizer: o branco nunca será ofendido em razão da cor de sua pele; sempre receberá tratamento na saúde com mais humanidade que os negros; nunca será perseguido em supermercado ou nas chamadas lojas de departamento; nunca será tratado como coisa ou sem alma; as mulheres sempre receberão maior dosagem de anestésicos quando dos partos e muito menos serão esterilizadas apenas por serem brancas; não precisaram e nem precisarão de cotas raciais etc, até porque diante dessas situações a empatia fala mais alto. Simples assim!

É difícil esquecer do pronunciamento daquelas juízas de direito: uma afirmando que o latrocida (aquele que mata para roubar) não tinha estereotipo de bandido porque tem pele, olhos e cabelos claros e a outra afirmando que o acusado negro "era seguramente integrante de grupo criminoso em razão de sua raça".

Creio que as mudanças estão bem próximas, pois que agremiações de grande porte estão adotando medidas enérgicas, como, por exemplo a Confederação Brasileira de Futebol e com a entrada em vigor da Lei n. 14.532, de 11/01/2023, equiparando os crimes de injuria aos raciais e elevando a pena de um a três anos para dois a cinco de reclusão e multa, como também atribuindo a responsabilidade do Ministério Público na adoção das medidas criminais cabíveis, independente de provocação da vítima.

Brincadeiras tem limites e o meio para acabar está na Educação formal, convivência, empatia e punições exemplares.

Diante disso, o juiz da 1ª Vara Federal de Ponta Grossa, André Wasilewski Duszczak, que apreciou o caso na primeira instância, entendeu que ficou comprovada a ocorrência do crime de injúria racial. No entanto, pelos depoimentos e documentos, não era possível afirmar que ele agiu com a intenção de menosprezar a raça.

O magistrado condenou o homem a um ano de reclusão, tendo a pena sido substituída pela prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora por dia de condenação, e pelo pagamento de três salários mínimos.

Eginaldo Honorio é advogado, doutor Honoris Causa e conselheiro estadual da OAB/SP (eginaldo.honorio@gmail.com)

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