Octogenário ilustre, Paulo César Batista de Faria é carioca nascido e criado no bairro de Botafogo. Veio ao mundo em 12 de novembro de 1942, e há seis décadas seu talento enriquece a canção brasileira. Filho de Benedito César Ramos de Faria e de Paulina Batista, o garoto Paulo César desde sempre conviveu com a música.
Seu pai, conhecido por César Faria, era violonista de primeira, integrante do grupo "Época de ouro", referência no universo do chorinho brasileiro. Em sua casa de Botafogo, passavam para tocar músicos do calibre de Pixinguinha, Jacó do Bandolim e Canhoto da Paraíba. César era funcionário público, escriturário na Justiça Federal, e a música não era seu ganha-pão, mas uma paixão daquelas. Paulinho curtia o som da casa, formado de valsas, boleros, guarânias, samba e muito, muito chorinho. Sabedor dos perrengues vivenciados por seus colegas músicos, César não incentivou nos primeiros tempos o filho a seguir carreira. O rapaz foi estudar Economia e trabalhar como bancário numa agência no Centro do Rio.
Em 1964, o acaso chegou na figura do compositor Hermínio Bello de Carvalho, cliente do banco. Paulinho deixou de lado a timidez e puxou conversa com o poeta. Hermínio conhecia César Faria e perguntou se Paulinho compunha. Começava ali uma amizade e parceria que a música brasileira agradece até hoje. Foi Hermínio quem levou Paulinho ao Zicartola, restaurante de dona Zica e do compositor Cartola, reduto de músicos e boêmios. Por lá conheceu Zé Ketti, Nélson Sargento, Nélson Cavaquinho, Elton Medeiros, dentre tantos outros. Com Elton Medeiros (1930/2019) compôs algumas de suas obras-primas, como a imortal "Onde a dor não tem razão" ("Canto, pra dizer que no meu coração/Já não mais se agitam as ondas de uma paixão/Ele não é mais abrigo de amores perdidos/É um lago mais tranquilo, onde a dor não tem razão...").
Paulinho ia ao Zicartola, acompanhava no violão a turma da pesada que tocava toda noite. Foi de Cartola que recebeu seu primeiro cachê: "Paulinho, você vem aqui tocar à noite. Toma um dinheirinho pra condução". Zé Ketti chamou Paulinho para integrar o conjunto "A voz do morro", juntamente com Elton, Oscar Bigode e Nélson Sargento. Deixou o banco e o curso de Economia. O grupo gravou seu primeiro disco, em 1965, pelo selo Musidisc. Um funcionário da gravadora pediu os nomes para os créditos e não aprovou um deles: "Paulo César não é nome de sambista". Foi o jornalista Sérgio Cabral quem o rebatizou como Paulinho da Viola.
O rapaz curtia carnaval e participava de blocos de rua e de uma pequena agremiação, a "União de Jacarepaguá". Foi Oscar Bigode quem o levou até a Portela e apresentou-o aos compositores Candeia, Monarco, Casquinha e Ventura. Com Casquinha compôs "Recado", primeiro samba pela Portela. Em 1966, sua canção "Memórias de um sargento de milícias" foi escolhida como samba-enredo. A escola faturou o carnaval daquele ano. E foi para a Portela que criou seu maior sucesso, "Foi um rio que passou em minha vida", de 1970.
Elegante, discreto e muito talentoso, Paulinho da Viola dá nome e sobrenome à música brasileira.
Fernando Pellegrini Bandini é professor de Literatura (fpbandini@terra.com.br)