Limonada purgativa

16/11/2022 | Tempo de leitura: 2 min

Férias escolares nem sempre têm lembranças agradáveis. E agradável é poder acordar mais tarde, brincar o dia inteiro e esquecer os livros durante não sei quantos dias. Se bem que férias de julho, na década de 1950, tinha professor que deixava dever para o mês inteiro: 30 problemas de Matemática, 30 textos para serem lidos, 30 redações. Enfim, férias não tão completas assim...

Mas tem dia nas férias que a gente não gostaria que existisse. É que todo ano, durante as férias, eu e meus irmãos tínhamos de tomar limonada purgativa. Uma garrafinha de 200 ml que tínhamos de virar na boca de uma vez, esperar uma hora e passar o dia no banheiro.

Cada dia um dos filhos de dona Angelina passava por isso, “para não congestionar o banheiro”. E não tinha outro jeito: cinco horas da manhã ela nos acordava com o copo na mão. Olhos fechados, movidos pelo sono “engolíamos” aquilo sem a menor alegria.

Pensávamos que isso só acontecesse com a gente, mas quando alguns anos mais tarde arrumei meu primeiro trabalho e justamente numa farmácia, vi que isso era comum: nos meses de junho e janeiro o farmacêutico responsável comprava caixas e mais caixas de limonada purgativa para serem vendidas. E me lembro que vendia “aos montes”.

O objetivo era aproveitar as férias para “limpar” o organismo e, no reinício das aulas, tomar vitaminas que nos deixariam mais fortes. E dá-lhe Biotônico Fontoura ou Iofoscal. O primeiro, com uma leve quantidade de álcool e o segundo composto por iodo, fósforo e cálcio.

Ingerir a limonada não era nada, já que o fazíamos ainda sonolentos. Difícil era chegar ao banheiro e encontrá-lo ocupado...

Aproveitávamos este momento para colocar em dia os deveres de férias, já que estávamos “condenados” a não sair de casa. E muitas vezes combinávamos com amigos de que teriam de vir brincar em nossa casa ou que iríamos na casa deles, já que dependia de quem fosse tomar a limonada purgativa no dia seguinte. O curioso é que no final de semana, quando todos já tinham ingerido o trágico líquido fazíamos as contas pra ver em quem o produto teria provocado mais efeito...

Interessante ver como certos conceitos desaparecem para sempre! Limonada purgativa, com certeza, deve ter levado muito laboratório à falência, já que a procura por tal produto é praticamente nenhuma.

Mas aquele gostinho amargo na boca, aquele sabor de “não quero mais”, resiste aos tempos. Uma mania que muita gente não faz questão de lembrar!...

Nelson Manzatto é jornalista (nelson.manzatto@hotmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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