Crostini com ovo de Codorna


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Em italiano o nome do petisco  parece um verso: Le uova di quaglia e acciughe crostini fritti; mas ele é um dos mais prosaicos encontrados em Veneza, a terra dos cicchetti
Em italiano o nome do petisco parece um verso: Le uova di quaglia e acciughe crostini fritti; mas ele é um dos mais prosaicos encontrados em Veneza, a terra dos cicchetti
Alguém já disse que os cicchetti da região do Vêneto são uma versão das tapas espanholas; dos finger food americanos; dos amuse-gueule franceses, dos petiscos brasileiros. Encare-se como bem reducionista a analogia, embora pertinente. É que os venezianos elevaram sua especialidade a nível de arte muito sofisticada. Por toda a Itália encontram-se centenas de petiscos, cada um mais maravilhoso que outro, graças à sazonalidade e à qualidade dos produtos. Mas só em Veneza eles recebem o nome cicchetti e são tão particularmente elaborados. Conclui-se portanto facilmente que há profunda identificação entre essas iguarias e uma das cidades mais românticas do mundo, um elo que vincula a comida a um específico espaço urbano.
 
Servidos em bares ou mesmo bancas de mercados de rua, são feitos de toda maneira que se possa imaginar, e consumidos geralmente sem talheres. A variedade é de impressionar. Os polpettine são bolinhos fritos de carne, peixe ou legumes da estação e encontram-se por toda parte, disputando excelências ao lado dos pequenos espetos de frutos do mar; de miúdos de aves, bovinos, suínos; de torradas, pães e polentas como base para coberturas e recheios variados; de muita sardinha; de ovos; de inesquecíveis embutidos chancelados pela experiência milenar. Veneza é muito antiga e seus cozinheiros serviram ao longo de séculos a uma nobreza ilustrada que sabia o que queria. Os doges, principalmente, eram exigentes em tudo e especialmente à mesa.
 
No livro Antipasti, da Editora Zero, Lindy Wildsmith e Valentina Harris descrevem de forma quase literária as iguarias italianas que dão título à obra. Além dos cicchetti, as autoras elencam preciosidades gastronômicas de todas as regiões da Bota. Mas é falando de Veneza que elas ganham o leitor. Vou destacar um trecho:
 
“O bacaro é exclusivo de Veneza. É um bar tradicional de vinhos que foi reinventado recentemente para se transformar em um tipo de espaço chique-decadente. Ao redor do mercado de Rialto, alguns bacari são pouco mais que um cubículo com uma localização privilegiada e oferecem vino, aperitivi e cicchetti. No horário do almoço de um sábado típico, jovens venezianos a caminho de casa depois das compras andam pelas calçadas com grandes vinhos espumantes, de Aperol âmbar e de Campari vermelho. A altura da água não evita esse ritual de almoço. O elegante veneziano simplesmente calça um par de galochas ou de botas de pesca de borracha (que nunca tinham alcançado tamanho requinte de estilo) para completar o discreto visual charmoso, dobra um exemplar do Gazzetino (o jornal de Veneza) e o enfia no bolso traseiro do seu jeans, ante de se dirigir ao objeto de seus desejos.”
 
Na sequência do comentário acima, as autoras listam os dez cicchetti mais populares de Veneza. Seppie alla veneziana (refogado de sépia, um tipo de mini lula, sobre pedaço de polenta); Bacallà mantecato ( Bacalhau desfiado que lembra a brandade dos franceses); Le capesante gratinate (Vieiras gratinadas, perfumadas com sálvia, servidas na concha); Moeche al vino bianco (siri ao vinho branco temperado com ervas e servido sobre crostini); Trotta affumicata com mostarda( Truta defumada grelhada com mostarda); I mesi uovi (ovos cozidos cortados ao meio na longitudinal, gemas temperadas); Sopressa com radicchio (embutido grosso, rosado, de sabor fresco, feito com carne suína, sal e especiarias); Crostini di fegato (bem parecido com nosso fígado acebolado, mas de sabor mais suave ); Polpetine di manzo ( bolinho pequenininho de carne); Carcioffi violeta ( corações de alcachofra roxa, só encontrada na região, cozidos em água, vinho e ervas).
 
Das muitas receitas que o livro traz, escolhi uma facilmente adaptável. Sua base, como a de grande parte dos cicchetti, são os crostini. Italianos costumam tê-los armazenados em vidros e prontos para receber a cobertura mais apropriada segundo os produtos disponíveis. Como o pão, em toda a Itália, é muito bom, basta aproveitar sobras, até porque o dormido é o que se presta melhor a ser cortado. As rodelas ou triângulos de um ou dois centímetros são pinceladas com azeite e levadas ao forno quente até ficarem douradas. Aí é empregá-las ou guardá-las, pois duram alguns dias.
 
Mas no caso da receita de hoje, os crostinis são preparados na hora. Corte fatias de pão de forma sem casca em quatro. Aqueça uma frigideira e quando ela estiver bem quente, junte o óleo de girassol, que deve cobrir o fundo da panela. Adicione os quadradinhos de pão, frite até dourar de um lado, vire para dourar o outro. Deixe sobre papel toalha para que fiquem bem secos. Faça uma pasta com a anchova, amassando-a bem. Espalhe sobre o pão frito e transfira para o forno em uma travessa aquecida. Com cuidado, quebre os ovos em xícara para se certificar de que estão frescos. Frite-os em frigideira até que as gemas estejam duras. Apare as claras com a boca de um copinho. Coloque sobre as fatias de pão frito e sirva bem quente. Se não gostar de anchovas, você pode trocá-las por sardinha, atum, bacalhau. Aspargos em conserva esmagados ou pedaços de queijo grana padano também vão super bem como substitutos. Todos seguem a mais perfeita tradição dos cicchetti. 
 
 
INGREDIENTES
 
 6 fatias de pão branco 
 6 filés de anchovas
 12 ovos de codorna
 3 colheres (sopa) de óleo de girassol
 
porção: 6 pessoas
dificuldade: média
preço: econômico

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