
Da porta da sala, das janelas do quarto ou do vitrô da cozinha. Não importa o cômodo em que está, a dona de casa Maria das Dores da Silva, a dona Nega, 78, consegue ver com perfeição o Mosteiro de Claraval. Moradora a duas quadras da imponente construção, ela lembra saudosista do início da obra e das várias etapas da vida que tiveram o mosteiro como pano de fundo. Foi ali que seus filhos foram batizados e recentemente uma neta recebeu o crisma. Católica fervorosa, ela é apenas uma das moradores da pequena Claraval (MG) que vive em torno do templo. A cidade fica a 20 quilômetros de Franca.
Claraval está com 4,5 mil habitantes (parte deles na zona rural). É um lugar onde o tempo passa devagar. Cachorros e cavalos andam tranquilamente nas ruas, enquanto muitas senhoras e senhores ficam nas calçadas, sentados, espreitando o vaivém de crianças e adultos.
Principal cartão postal da cidade, o mosteiro é intimamente responsável pelo surgimento do município, antes um vilarejo pertencente a Ibiraci (MG). Foi graças a vinda dos monges italianos na década de 50, que ocorreu a emancipação política, a perfuração de um poço artesiano e a instalação da energia elétrica na vila. Até mesmo o nome Claraval veio de influência do mosteiro e homenageia São Bernardo de Claraval, patrono dos monges e fundador da Abadia de Claraval na França.
A vinda dos monges ocorreu após um pedido particular feito pelo bispo de Guaxupé (MG) na época ao abade do Mosteiro de Casamari na Itália, que enviou ao Brasil três padres e um irmão para a instalação da ordem. A pedra fundamental foi lançada em 1951 e a construção só terminou 18 anos depois.
Moradia atualmente de sete padres, um irmão e dois postulantes (iniciantes), o mosteiro conta com mais de 50 quartos e uma igreja com capacidade para 380 pessoas sentadas e que é cobiçada por noivas de Franca e região. Neste ano, completa-se 63 anos da chegada dos monges a Claraval, que até hoje pertence à Diocese de Guaxupé.
Erguido em uma época de poucos recursos, o mosteiro tem arquitetura neo-gótica semelhante a das igrejas européias e sua torre pode ser vista de diferentes pontos do município, inclusive da zona rural. O agricultor Salvador da Cunha, 72, consegue avistar parte dos fundos da igreja em meio aos cafezais de sua propriedade na rodovia para Ibiraci, distante sete quilômetros da igreja. “É uma construção muito bonita, que chama a atenção”, disse o fazendeiro, que colabora com os monges há mais de 40 anos. “Tenho contato praticamente toda semana com os padres e irmãos e trabalho pedindo doações para o leilão de janeiro.”
Segundo o padre Mateus Resende, atual reitor do mosteiro, a torre da igreja tem cerca de 50 metros e do topo é possível avistar, durante a noite, luzes de Franca e Cristais Paulista.
Contrastando com a magnitude da casa religiosa, ao seu redor há imóveis simples e um povo humilde. Homens trabalham na lida do campo e erguem novas construções. As mulheres cuidam da casa e dos filhos. Pelas pacatas ruas da cidade, também é possível ver a atuação das irmãs cistercienses, da mesma ordem dos monges, que chegaram ao município anos mais tarde e hoje ajudam na evangelização da comunidade.
Responsável por grande parte dos trabalhos pastorais, elas estão presentes na catequese e fazem visitas domiciliares. A irmã Maria das Graças é uma delas e visita semanalmente a casa da dona Maria José de Castro, de 91 anos, para levar a comunhão. “Essa senhora é uma pessoa de muita fé, que sempre participou da igreja e agora se encontra impossibilitada.” Segundo a religiosa, é perceptível na população o carinho e o cuidado com o mosteiro. “As pessoas têm um envolvimento, querem cuidar, ajudar no que for preciso. É uma relação de filhos querendo cuidar do pai.” Enquanto elas realizam visitas, os moradores caminham tranquilamente pela cidade e os dias vão passando, o Mosteiro de Claraval permanece um ícone para o município. E a vida continua em torno de um mosteiro.
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