
Beatriz Crivelli Mesquita de Sampaio, a Bia Bis, 60 anos, possui uma trajetória marcada por coragem, versatilidade, talento para os negócios e trabalho duro. Nascida em Bauru, filha única de Irany Crivelli e Eduardo Mesquita de Sampaio, ela cresceu em uma família que cultivou sua autonomia e autoconfiança, o que a fez, aos 7 anos, trocar as aulas de balé pelo tênis, esporte que ajudou a moldar sua personalidade persistente e resistente a pressões.
Ainda jovem, contrariando os pais, mudou-se sozinha para o Rio de Janeiro, levando apenas suas raquetes e sonhos. Na capital fluminense, ingressou no Banco Garantia após pedir uma oportunidade a Jorge Paulo Lemann.
Com o grupo, controlado por Lemman, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Herrmann Telles, Bia liderou o departamento de marketing das Lojas Americanas e deu sua contribuição na reestruturação da área comercial das marcas Richards e Brahma. Com formação em administração e marketing pela FGV, acumulou rica experiência, com muitos desafios, viagens e prestigiados eventos.
De volta a Bauru após a morte do pai, Bia fundou a loja de roupas Bia Bis, que funcionou na cidade por dez anos. Atualmente nos ramos imobiliário e de uniformes corporativos, ela revisita sua carreira nesta entrevista, revela histórias curiosas e comemora, com pé no chão, a vida que poucos tiveram o privilégio de ter.
JC - Conte um pouco sobre sua origem familiar.
Bia - Meu avô materno, Romeu Crivelli, veio da Itália e teve oito filhos. Minha mãe foi professora e se aposentou como coordenadora pedagógica. Era muito inteligente, organizada. Já meu pai veio de Jaú e ficou conhecido como Sampainho. Ele era empresário e atuava como conselheiro político, participava das discussões da cidade e ajudou a eleger o prefeito Nicolinha na década de 1950. E, desde os meus 7 anos, minha mãe me levava com meus primos para passar férias na casa de uma tia dela no Rio de Janeiro. Enfiei na cabeça que iria morar lá, fui encaminhando minha vida e, contrariando o desejo dos meus pais, quando fui fazer faculdade, peguei minhas raquetes, porque eu jogava tênis, e fui para o Rio por conta e risco.
JC - Como foi essa experiência como jogadora?
Bia - Gostaria de contextualizar: as crianças da minha geração viviam sob uma hierarquia familiar firme, mas meus pais sempre me deram uma autonomia proporcional a cada idade, o que me deu autoconfiança para fazer tudo o que fiz na vida. Morávamos na Antônio Alves, na esquina com o BTC e em frente à casa do maestro Carlos Guimarães. Minha mãe me colocou para estudar piano com ele, mas eu não queria e fiquei só uns quatro meses. Então, ela me colocou no balé no BTC e, da janela da sala, vi pessoas jogando tênis na quadra. Desde então, em vez de ir para o balé, passei a ir às aulas de tênis.
JC - Com a ciência dos seus pais?
Bia - Só contei uns 20 dias depois. O Claudio Sacomandi me emprestou a raquete, até que pedi uma para meu pai, mas ele falou para eu jogar com uma tábua de carne até começar a bater bem na bola. Foi o que fiz e, depois de uns dois meses, ele me deu a raquete. Participei de diversos campeonatos, o que ajudou a moldar minha personalidade quanto ao empenho e à persistência para conquistar objetivos e sobre como agir em momentos de pressão.
JC - Como foi seu início no Rio?
Bia - Fui em 1980 e dormia em uma pensão em Copacabana. Depois, mudei-me para um quarto e sala com quatro moças no Leblon. Como sou filha única, para uma jovem com pouca idade, que havia saído de uma cidade pequena para uma capital com um modo de vida totalmente diferente, foi um desafio. Eu conhecia o Jorge Paulo Lemann porque ele jogava tênis e vinha a Bauru às vezes, até que o encontrei em um campeonato e fui pedir emprego. Ele disse que o Banco Garantia estava contratando trainees, fiz a prova e passei. Nunca tinha usado uma máquina financeira e fui trabalhar na mesa de overnight (aplicações feitas para resgate no dia seguinte), na época da inflação do governo Sarney.
JC - Fez faculdade na mesma época?
Bia - Sim. Logo que fui contratada, eles compraram as Lojas Americanas, para onde o Beto Sicupira me levou com outras três pessoas. Ninguém sabia nada de varejo, mas foi um trabalho muito legal, porque tínhamos autonomia e aprendíamos fazendo. Na época, a empresa pagou meu curso de administração na FGV, onde também fiz pós-graduação em marketing. Depois de alguns anos, fiquei uns meses na Mesbla para aprender mais sobre compra de varejo e, em 1985, voltei para as Americanas como gerente de marketing.
JC - Pode revelar passagens deste trabalho?
Bia - Fizemos o primeiro encarte de publicidade em jornal do Brasil. Fui em todas as principais cidades do País para negociar preço e anunciamos nos maiores jornais. Quando o grupo comprou a Richards e a Brahma, foi o meu departamento que reestruturou, no início, o marketing destas empresas. Ajudei, inclusive, na intermediação para a organização do primeiro camarote da Brahma na Sapucaí. Como as Americanas patrocinavam a Fórmula 1, às vezes eu ia de helicóptero para as corridas em Jacarepaguá e fui a muitas festas, inclusive na qual o Mick Jagger e a Luciana Gimenez se conheceram. Era muito trabalho, mas foi uma escola. Em 1991, porém, meu pai faleceu de câncer, aos 50 anos, e voltei a Bauru para ficar com minha mãe. Como tinha viajado muito fora do País, abri a loja de roupas Bia Bis e dava consultoria de moda aos clientes.
JC - Depois, trabalhou em qual área?
Bia - Após dez anos, em 2000, fui trabalhar em São Paulo em uma indústria que fazia etiquetas de roupas. Lá, elaborei um novo projeto e passamos a produzir bolsas escolares, estojos, fichários, capas de agenda para empresas como a Tilibra, Foroni, sacolas para lojas como a Daslu. Mas, em 2014, minha mãe ficou doente e retornei a Bauru para cuidar dela. Hoje, faço captação de imóveis e presto serviços para a Deplaka, que faz uniformes personalizados para diversas empresas. Felizmente, tive uma experiência de vida privilegiada e construí minha credibilidade na cidade.
O que diz a empresária
'Meus pais sempre me deram autonomia, o que me deu autoconfiança para fazer tudo o que fiz na vida'
'Jogar tênis ajudou a moldar minha personalidade quanto ao empenho e à persistência para conquistar objetivos'
'Tive uma experiência de vida privilegiada e construí minha credibilidade na cidade'