OPINIÃO

Obrigado, Fritz Lang, ou do porquê todos temos uma religião

Por Renato Ghilardi |
| Tempo de leitura: 3 min
Professor Livre-docente - Unesp - Bauru

Conforme vamos envelhecendo percebemos que a juventude é realmente uma fase necessária para a rebeldia da alma. É nela que confrontamos e queremos mudar aquele status quo na esperança de mostrar, a não sei bem quem, que somos não só parte integrante da sociedade, mas também que somos seres muito mais racionais do que toda a humanidade que existiu até então.

E, dentro dessa suposta racionalidade, nada mais óbvio do que questionar sobre nossa existência e quais fatores, naturais ou sobrenaturais, nos fazem ser o que somos.

Surge daí em muitos o racionalismo científico que tem suas origens no Iluminismo e carrega, dentro desse pouco tempo de existência dentro da história da humanidade uma vez que não tem mais do que tem trezentos anos, a enorme carga de trazer aquilo que se convencionou chamar verdade imutável.

O secularismo iluminista tem o seu lado extremamente importante, pois nos traz uma visão científica do mundo e menos supersticiosa. De fato, o desenvolvimento tecnológico e científico nos permitiu benesses para a população mundial que até então não tínhamos vivenciado. Esta racionalidade nos leva também, se levada ao mote iluminista, a abnegar de pensamentos metafísicos e filosóficos, como religião, em detrimento ao materialismo científico.

Assim, em seu momento mais extremista, o jovem racionalista vai com o pulmão cheio de ar e olhar de pena àquele que for contra ele bradar que é ateu. Eu sei pois já fiz isso.

Mas o tempo passa e com ele vem uma certa maturidade para se perceber que mesmo usando a racionalidade, o ser humano necessita de uma religião. Mesmo o ateu pratica algo parecido com uma. Explico tendo como base a teoria da evolução darwiniana.

A partir de uma simples frase: "os organismos mais adaptados em um ambiente se reproduzem e transmitem seus genes", os melhores naturalistas britânicos e alemães pós-darwin racionalizaram todas suas pesquisas tendo como conceito basilar a eugenia, inclusive dando arcabouço ao medonho raciocínio científico do III Reich. Horrível, não?

Horrível e desolador quando você se apercebe que o pacote de racionalidade evolutiva não contém em seu interior a ética. Por esses fatores que sempre desconfio de um ateu evolucionista que se diz com ética!

Minimamente ele é hipócrita nessa convicção, pois não se coaduna ter ética se formos levar a cabo estritamente o racionalismo científico. E como incluir a ética na conduta racional?

Quando mais jovem, eu assisti a uma entrevista do famoso cineasta alemão Fritz Lang ao também famoso cineasta William Friedkin, onde o primeiro não se conformava pela ausência do ensino religioso em escolas, o que acarretaria na ausência da compreensão ética na sociedade.

Achei aquilo uma babaquice sem tamanho mesmo vindo de um ancião, sem religião, de 80 anos fugido do regime nazista. Hoje entendo que ele não está tão errado. Mesmo aquele que se diz ateu precisa de um sistema religioso para estabelecer seus preceitos éticos.

Isso se faz mais premente quanto mais radical for o ateísmo da pessoa pois haverá maior proselitismo de disseminação de sua ideologia e na crença e fé de uma ciência imutável (troque a palavra ateísmo por qualquer outra religião que teremos uma guerra santa).

O amadurecimento é necessário também, graças a Deus.

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