EQUILÍBRIO AMBIENTAL

Supressão de árvores tem relação direta com crise hídrica

Por Tisa Moraes | da Redação
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Tisa Moraes
Luiz Carlos de Almeida Neto, diretor do Jardim Botânico de Bauru
Luiz Carlos de Almeida Neto, diretor do Jardim Botânico de Bauru

Neste sábado (21), o Brasil comemora o Dia da Árvore e a data, criada para reforçar a importância de preservar e plantar mais exemplares, ganha maior relevância no momento atual, quando Bauru é assolada por uma grave crise hídrica e o País, impactado por um enorme volume de queimadas. Isso porque existe uma relação direta entre as árvores e as chuvas, cuja escassez deixa, há mais de quatro meses, mais de 100 mil bauruenses com torneiras secas.

Estas plantas também influenciam a qualidade do ar, que ficou em condições péssimas nas últimas semanas, castigando e adoecendo moradores. Diretor do Jardim Botânico de Bauru, o engenheiro agrônomo Luiz Carlos de Almeida Neto explica que as árvores transferem umidade do solo para a atmosfera por meio de suas raízes profundas.

Por fotossíntese, a planta retira água da terra e, no processo de evapotranspiração, lança esta umidade na atmosfera. "A umidade do ar ajuda na formação de nuvens, favorecendo a ocorrência de chuvas. Uma sibipiruna adulta, por exemplo, transpira mais de 400 litros de água por dia", pontua. Na zona urbana do município, contudo, o plantio desta espécie - considerada de médio porte - é permitido somente em calçadas onde não há fiação elétrica.

Dados do Centro de Meteorologia de Bauru (IPMet) mostram que, entre junho e agosto deste ano, choveu apenas 53,6 milímetros na cidade, o que corresponde a 42% da média esperada para o período. Já em setembro, até o dia 20, havia chovido apenas 11,2 milímetros, pífios 16,5% da média climatológica.

"Antigamente, o calendário agrícola começava em setembro, com a chegada das chuvas. Hoje, só chegam na segunda quinzena de novembro. Perdemos mais de dois meses de chuva alimentando o lençol freático, as minas alimentando os rios. Neste ano, o Brasil inteiro pegou fogo, a umidade relativa do ar está em níveis de deserto, aumentou a temperatura no mundo, em um momento que não era mais para continuar lançando CO2 na atmosfera. Estamos caminhando para o caos. É muito preocupante", lamenta Almeida Neto.

Equilíbrio

Ele explica que, Bauru é privilegiada em termos de cobertura vegetal, visto que abriga uma das maiores áreas de conservação de Cerrado do Estado de São Paulo, que integra o Mosaico de Unidades de Conservação do Cerrado Paulista junto com Agudos e Pederneiras. Não é o suficiente, porém, para garantir a ocorrência de chuvas na cidade, já que o equilíbrio do meio ambiente depende de grandes áreas de solo permeável que permitam a recarga de água em aquíferos e rios não apenas no País, mas no mundo.

Berço do nascimento de grandes bacias hidrográficas por abrigar os aquíferos Guarani, Bambuí e Urucuia, o Cerrado atravessa o País do Nordeste ao Mato Grosso do Sul. Porém, ao longo dos anos, foi sendo destruído para dar lugar a commodities como a soja. Com a diminuição da vegetação nativa, responsável por levar água para regiões mais profundas através das raízes, os aquíferos deixaram de abastecer diversas nascentes.

"Sem chuva, o volume das minas diminui, ficando cada vez mais crítico o fornecimento de água para as pessoas", acrescenta. Neste sentido, também o Rio Batalha foi impactado, afetando o abastecimento de 27% dos bauruenses, sob regime de rodízio há mais de quatro meses.

"No Batalha, ainda há outros agravantes, como estradas rurais que contribuem para levar partículas de areia ao leito do rio, as matas ciliares totalmente degradadas, propriedades sem nenhuma conservação de solo, pisoteamento do gado nas margens. São fatores que contribuem para o surgimento de erosões laminares (provocadas pelo escoamento superficial da água da chuva) e o assoreamento do manancial".

'Fomos educados a não gostar de árvore', diz diretor do Botânico

Se o bauruense pode se orgulhar em morar em uma cidade com uma das maiores reservas de Cerrado do Estado, o mesmo não ocorre quando se trata de arborização urbana. Segundo Luiz Carlos de Almeida Neto, um dos motivos desta deficiência é a educação ambiental que, de forma geral, os brasileiros não recebem ao longo da vida.

"Somos educados não gostar de árvore, a achar que ela só serve para atrapalhar o abastecimento de energia, sujar o chão com folhas, entupir calha, arrebentar calçada e representar risco de quedas, que ocorrem por falta de conservação. Se uma cidade quente como Bauru estivesse cheia de sombra, a temperatura poderia ser reduzida em três a quatro graus. Além disso, uma quantidade muito maior de partículas poluentes seria retida pela umidade oriunda da transpiração. A qualidade de vida seria outra", completa.

Risco de colapso

As chuvas no Estado de São Paulo também são influenciadas pela Floresta Amazônica, que corre risco de entrar em colapso em 2050 se medidas não forem adotadas, de acordo com artigo científico liderado por pesquisadores brasileiros publicado na revista científica Nature no início deste ano. Diretor do Jardim Botânico, Luiz Carlos de Almeida Neto explica que a evapotranspiração da Floresta Amazônica provoca os chamados "rios aéreos", vapor d'água lançado na atmosfera, que encontram uma barreira natural na Cordilheira dos Andes e seguem para a região Sudeste do Brasil. "Se a Floresta Amazônica entrar em colapso, entraremos em colapso em Bauru também. Nossa sobrevivência depende disso. Só estamos vivos porque chove, nossa agricultura só produz muito porque chove. A natureza é um equilíbrio que, infelizmente, o homem vem alterando há muito tempo", alerta.

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