Há provas consistentes da "dinâmica golpista" para levar Jair Bolsonaro para trás das grades. Mas não vai acontecer. Pelo menos não tão já.

Eventual decretação de prisão deve levar em conta o fator político. A proposta de "acabar com a democracia para salvar a democracia" não vingou, mas o país continua dividido entre a esquerda que virou centro, e a direita que virou extremista. Extrema esquerda só existe em diretório acadêmico de faculdade de Sociologia.

Aos ministros do Supremo Tribunal Federal seria traumático transformar Bolsonaro em mártir. Lula, condenado sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, na ação envolvendo o tríplex do Guarujá, saiu da prisão de Curitiba para a campanha triunfal de volta à Presidência da República. Lula estava inelegível, como Bolsonaro hoje está.

O ex-presidente, terá primeiro que ser condenado pela Justiça, o que não é fácil no STF. Se ele não tentar obstruir as ações de investigação da Polícia Federal, a prisão temporária fica indefensável. O papel da Corte Suprema é o de defender a Constituição, e ela não deseja se ver engolfada por julgamentos criminais envolvendo autoridades com foro privilegiado.

Há juristas que sustentam que o "mito" não cometeu crime nenhum. Aquela reunião com os ministros, um deles falando em "virar a mesa antes das eleições" (general Villas Bôas), não teria passado de uma conversa entre ressentidos, com alguns palavrões. Coisas que acontecem em qualquer botequim.

Terá que ser cauteloso, o ex-presidente, mesmo assim. Ele sabe disso. Tanto é que convoca os correligionários para a concentração na Av. Paulista, no próximo 25 deste mês, pedindo que ninguém leve faixas "contra quem quer que seja" e nem de protestos. Nada de pedir para prender o Xandão e o Gilmar Mendes. Nem mesmo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, deve ser molestado. Bolsonaro quer se defender de todas as acusações dos últimos meses. A Operação "Tempus Veritatis", da Polícia Federal, cumpriu 33 mandados de busca e apreensão, efetuou quatro prisões, e tomou 48 medidas alternativas contra Bolsonaro e apoiadores por suposta tentativa de golpe de Estado, para mantê-lo na Presidência. Será um discurso longo, de camisa verde e amarela da Seleção Brasileira. A manifestação é pacífica, em defesa do "estado democrático de direito" - já cansou de advertir. A Av. Paulista vai lotar. Pesquisas indicam que somente 7% dos que votaram em Bolsonaro estão arrependidos. Significa que o ex-presidente ainda tem 44% dos votos.

Carlos Bolsonaro pode se complicar na história do golpe. É suspeito de integrar o núcleo político do esquema de monitoramento ilegal de inimigos políticos de seu pai. O clima pesou quando o filho 02 foi informado da apreensão de três celulares que estavam na casa da família na Barra da Tijuca.

A tensão e a contrariedade manifestadas pelo filho do ex-presidente, chamou a atenção dos agentes federais, que ficaram intrigados e surpresos. Por enquanto, nada foi divulgado do teor. São fortes as comprovações de um esquema montado em paralelo na ABIN, para servir de apoio ao presidente e a seus filhos.

A participação de militares na tentativa de golpe só eleva as Forças Armadas, por não terem aderido. As omissões de oficiais graduados, não denunciando os que conspiravam e permitindo acampamentos de golpistas em frente aos quarteis, livra os conspiradores reais de punição. Não é possível prender todos os implicados.

As instituições funcionam, mas nem tanto assim. Os ventos políticos, se soprarem muito fortes, viram vendavais e a casa cai.

Vivemos, sim, um simulacro de democracia. Como teorizava Baudrillard, a verdadeira realidade é abolida e volatilizada em proveito de interesses (dos) maiores.

Todos à praia, antes que o verão acabe.