OPINIÃO

Quem manda é o vento

Por Roberto Magalhães | 16/01/2024 | Tempo de leitura: 2 min

O autor é professor de redação e autor de diversas obras didáticas e de ficção

Marina, linda, 30 anos, publicitária bem sucedida, carreira promissora, inteligente e comunicativa. Alguém duvida de que a vida é loteria? Da sorte, certamente, ela não podia reclamar. Apaixonada e casamento marcado. Dr. Regis, o noivo feliz. Um homem igualmente lindo, igualmente bem sucedido, atencioso nos gestos e macio nas palavras. Conto de fadas? Parece, mas não é. Apenas a mão injusta da vida que a uns tanto dá e a outros tanto tira.

Mas a mesma vida que joga as pessoas pra cima, costuma puxar-lhes o tapete. O príncipe foi embora, o sonho acabou, o futuro programado miou. E o tempo passou, que só isso ele sabe fazer. Não só o tempo, Marina também passou. Com as armas que tem, luta para manter razoável aparência. A carreira que tanto prometia não decolou. Vive de freelancer para se garantir. Com dificuldades financeiras, chora todos os problemas em noites de confidente travesseiro.

Assim do nada, conheceu Manolo. Feio. Muito magro e o nariz estragava a cara. Contudo, simpático, gentil, com emprego estável e ótimo salário. Em outras circunstâncias, jamais aceitaria um convite de um homem assim para jantar. Mas os tempos eram outros, somou, subtraiu, tirou os nove fora e disse sim. Aceitou jantar com ele. Depois, aceitou namorá-lo. Agora, já pensa em aceitar o pedido de casamento, sim, meu amor, é o que eu mais quero. Claro, ele não é bonito, mas, olhando bem, é charmosinho... Mas ninguém é perfeito. Mas é preciso considerar o caráter. Mas beleza não é tudo. Mas... Suspendeu a conjunção cansativa adversativa e foi logo para a conclusiva: tirando o nariz de batata, dava pra levar.

Circunstâncias. Essa palavra comanda a vida da gente. Dependendo de como o vento sopra, vamos pra cá ou pra lá. Mudando as circunstâncias, as pessoas são capazes de coisas que jamais admitiriam fazer, coisas que lhes violam o próprio código ético. Mais ainda, coisas que sempre condenaram na vida do outro. A gente nunca sabe como o vento vai soprar, melhor não cuspir pra cima, a gosma pode cair na nossa cara, diz o povão.

Escrevi este texto logo depois de ver um filme na tevê. Um avião espatifou-se nas geleiras dos Andes. Muitos sobreviveram. Começou, então, a luta pela vida. Água tinha, gelo não faltava, comida zerada. Nenhuma possibilidade de caça ou de pesca. Um deles sugeriu, como única saída, que comessem os mortos. Era isso ou morrer. Todos se horrorizaram com a ideia. Isso nunca! Todavia, quando a morte começou a mostrar a horrenda cara, todos prontamente aderiram ao canibalismo. Ao final, graças à carne do mortos, a vida se prolongou e todos foram socorridos.

Vida maluca! Sem mínima piedade, entulha o nosso caminho com pedra, pau, toco, caco de vidro, laço, anzol... E a gente vai dançando conforme a música. O feio vira charmosinho e a carne do irmão, almoço e janta.

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