OPINIÃO

Quando o poder amedronta

Por J.F. da Silva Lopes | 13/10/2023 | Tempo de leitura: 3 min

O autor é advogado

Guimarães Rosa, pela boca do jagunço Riobaldo, sentenciou com sublime perspicácia que "viver é muito perigoso", ensinando que é destino humano conviver com perigos e, certamente, com medos a eles inerentes. Desvendar quem e o que provoca o perigo equivale a descobrir aquilo que nos amedronta ao longo de nossas vidas, tarefa tão importante quanto ingrata.

O quadro nacional de violência doméstica ou urbana ou penitenciária gerado por machões que não suportam perdas de amores ou pelo crime organizado que, dentre e fora de presídios, não encontra limites nos seus enfrentamentos provoca perigo e nos amedronta com assassinatos domésticos, chacinas, rebeliões, balas perdidas, sequestros, golpes e centenas de artimanhas criativas que invadem nossos bolsos em busca de suados valores. Conviver com essas ações sem esperança de sucesso nos apavora e exige esforços na tentativa de superação, até porque precisamos sobreviver, trabalhar, proteger e socorrer nossa descendência como grande missão de nossas vidas.

Diante da Constituição Federal, aniversariante deste outubro, que nos organiza, protege e garante não existem grandes motivos para perigos e medos. Os governos, gostemos ou não deles, governam sem afetar nossas liberdades, sem nos obrigar em desacordo com as leis, sem nos cobrar tributos confiscatórios ou sem causa em leis justas e sem atormentar os nossos direitos. E, se algo aparecer para nos incomodar a mesma Constituição confere o regular e legítimo exercício de remédios constitucionais adequados e suficientes perante Juízes Naturais para nos proteger do perigo e reduzir à insignificância os nossos medos, com chance quase total de sucesso segundo o devido processo legal com seu significado altamente protectivo.

Todavia, circunstâncias ocorridas no âmbito do Supremo Tribunal Federal a partir de determinada data (13/06/2020) com rojões lançados contra suas instalações, com ameaças, com agressões verbais a seus ministros e dezenas de outros episódios somados que culminaram com o vandalismo de 8/01/2023 geraram reação praticadas por um único ministro (Alexandre de Moraes) com respaldo incondicional de seus pares que acabaram por amesquinhar o alcance do devido processo legal, afastadas garantias do Promotor e do Juiz Natural, da amplitude da defesa e do duplo grau de jurisdição, praticamente deixando a cidadania desguarnecida e desprotegida em face de direitos fundamentais, conjuntura perigosa e geradora de medos, sem alternativas suficientes e eficientes para necessárias correções.

Ninguém esta obrigado a suportar ações e comportamentos abusivos de autoridades e todos têm amplo direito de criticar, de opinar, de questionar quaisquer ações de quaisquer autoridades desde que o façam com civilidade e respeito, ainda que com palavras fortes.

Eventuais excessos da cidadania podem - e devem - gerar crimes de menor potencial ofensivo e reparações civis adequadas sempre integralmente respeitadas as cláusulas protectivas do devido processo legal.

Anormal truculência da discreta ministra Rosa Weber para apurar em sede antinatural e imprópria o entrevero do aeroporto de Roma envolvendo ministro Alexandre de Moraes e familiar - episódio desagradável com mínimo potencial ofensivo - trouxe constrangimentos e revelou que se chegou a um ponto limite diante do aniquilamento do devido processo legal, produzindo, mais que insegurança, quadro difuso de apavoramento diante de decisões questionáveis sem possibilidade de correção. Mais que medo, isso apavora por partir de nosso mais alto poder protetor.

Então, parece hora - derradeira hora - de repetir o que se fez tardiamente com a Lava Jato e amaldiçoar e banir continências e conexões processuais para pleno retorno ao bom caminho traçado pela Constituição através das cláusulas protetoras do devido processo legal. Isso constitui missão pacificadora essencial e urgente da Suprema Corte superando, definitivamente, perigos e medos acontecidos e gerados no âmbito do seu imenso poder.

Oremos, pois!

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