Uma mistura para entrar em combustão precisa de duas coisas: um combustível e um comburente. Um motor precisa de uma combustão destas para funcionar. O comburente mais comum no planeta é o oxigênio do ar, e usamos diversos combustíveis para tocar o motor.
Motores automotivos são basicamente de 2 tipos: a explosão e a combustão interna. A principal diferença é o ciclo utilizado, pois os motores a explosão precisam de uma faísca para iniciar a combustão, enquanto que os motores de combustão interna usam a alta compressão (e conseqüentemente a alta temperatura gerada na compressão) para gerar a queima da mistura. Este último tipo corresponde aos motores diesel, nos quais o combustível é injetado micro-pulverizado na câmara de combustão misturando-se com o ar admitido, resultando em uma mistura que se queima quando comprimida na proporção de mais de 20:1.
Os demais motores são a explosão e usam os mais diversos combustíveis. Os mais comuns são a gasolina, o álcool, o GNV, o GLP e hidrogênio. Cada um tem suas características próprias baseadas na otimização da queima da mistura combustível, por isso que nem sempre se pode usar combustíveis diferentes em um mesmo motor.
A gasolina na verdade é uma mistura de mais de 300 hidrocarbonetos diferentes, e cada um com características físico-químicas próprias. Por exemplo, cada hidrocarboneto tem um ponto de ebulição diferente, variando de 20° a mais de 240°C. Assim, se deixarmos um copo com gasolina no sol, as frações mais leves se evaporarão mais rapidamente, enquanto que as mais pesadas permanecem no fundo, constituindo a chamada laca ou gasolina velha, que entope carburadores, bicos e dutos. A mistura ar-gasolina tem uma proporção estequiométrica de 14:1, ou seja, 14 partes de ar para uma de gasolina e precisa de uma taxa de compressão ideal de 9 a 10:1, dependendo da construção e projeto do motor e da qualidade da gasolina. Usa uma vela mais quente para manter a temperatura de queima adequada dentro da câmara de combustão.
O álcool combustível ou álcool hidratado, diferentemente da gasolina, é um composto único chamado etanol, portanto tem suas características físico-químicas bem definidas. O etanol evapora a 78°C e sua mistura com o ar queima idealmente na proporção estequiométrica de 9:1 e com uma taxa de compressão de mais de 12:1. Como a alta taxa gera alta temperatura, precisa de velas mais frias para dissipar este calor. O poder calorífico do etanol é praticamente a metade do da gasolina, por isso que se precisa de mais álcool do que gasolina para gerar a mesma potência, fazendo com que todo motor a álcool consuma mais do que um equivalente a gasolina. A grande vantagem do álcool é seu preço por litro, que faz que mesmo consumindo mais, seu custo por quilômetro seja menor.
O GNV, ou gás natural veicular, tem poder calorífico menos da metade do da gasolina, mas agüenta uma taxa de compressão bem mais alta, em torno de 15:1, o que nenhum outro combustível líquido suporta. É um gás bem mais limpo, mas que apresenta problemas de partida a frio, precisando de uma assistência de outro combustível líquido no início. O GLP (gás liquefeito de petróleo) é um gás muito mais forte, com poder calorífico equivalente ao da gasolina. É o gás usado em botijões de fogão e empilhadeiras, mas não é homologado para uso veicular externo, apenas interno de indústrias. Apresenta uma queima limpa e eficiente, gerando boa potência. O hidrogênio é um gás difícil de obtenção, pois precisa ser retirado da água ou do ar antes de ser usado no motor. Ainda estão em desenvolvimento células de combustível para uso automotivo e vai levar algum tempo ainda antes de termos disponibilidade real a custos acessíveis em nossos carros. Vimos assim que um motor pode ser otimizado para um determinado combustível, mantendo características adequadas de queima, o que se torna um problema nos motores flex por envolver mais de um combustível. Como se usa um motor flex primordialmente com álcool e eventualmente com gasolina, as taxas de compressão são mais altas, fazendo com que a queima da gasolina tenha que ser controlada eletronicamente e enriquecida para evitar detonação, de forma que o motor não seja otimizado para nenhum dos combustíveis. O que não tira seu mérito de nos permitir a escolha, o que é muito bom.
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* Marcos Serra Negra Camerini é engenheiro mecânico formado pela Escola Politécnica da USP, pós-graduado em administração industrial e marketing e engenharia aeronáutica, com passagens como executivo na General Motors (GM) e Opel. Também é consultor de empresas e é diretor geral da Tryor Veículos Especiais Ltda. Seu site é www.marcoscamerini.com.br.