
Família Ijuim reuniu-se para relembrar a trajetória de seus patriarcas. Kanehiko (Caneca), Kaneaki (Canequinha) e Kenkyu (Canecão) fincaram suas raízes em Bauru nos anos 1920. Seus pais chegaram ao país há 100 anos.
A saga dos Ijuim no Brasil teve início em 1917. Ainda que o casal tenha origem em Kagoshima, extremo sul do Japão, naquele momento vivia em Okinawa, ilha a sudoeste, próxima da China e de Taiwan. Após meses cruzando três oceanos, a bordo do Wakasa Maru, Kentetsu e Haruko desembarcaram no porto de Santos, em 29 de dezembro. Acopanharam nesta longa viagem os filhos Kenkyu, então com dos anos, Kanehiko, com apenas um ano, e o irmão de Haru, Hisakiti Yamauti.
Os dados recuperados pela história oral em família dão conta que os primeiros trabalhos foram na agricultura. O Japão já passava por intensa crise econômica e, fascinados com a propaganda que estimulava a emigração, o casal reuniu suas reservas e partiu para a aventura sem volta. Consta que funcionários do governo japonês distribuíam cartazes vendendo as "fortunas" do Brasil - corriam versões de que se juntava ouro com enxada no campo, tal a riqueza da nova terra. Como se sabe, o país já se destacava na cultura do café, propagado orgulhosamente como o "ouro verde". Não se sabe se por dificuldades de tradução (ou por má fé dos agenciadores) muitos confundiram juntar ouro com o trabalho na lavoura de café. O fato é que a atividade que encontraram no primeiro emprego, em Juquiá, no sul do Estado, foi numa dessas fazendas.
A política migratória brasileira começou em meados do século 19. Os movimentos republicano e abolicionista atuavam de maneira a sinalizar que o sistema escravocrata tinha seus dias contados. Os primeiros governos republicanos se preocuparam em abrir as portas para a imigração visando substituir a mão de obra escrava. Assessorados por antropólogos como Sivio Romero, a rigor, pretendia-se o "branqueamento" da população do país. Ledo engano. Os dados do IBGE dizem o contrário, e livrar-se de um sistema escravocrata não foi tão fácil e rápido.
Os anciãos contaram, pouco a pouco, por anos, as dificuldades iniciais. Além de ter de se adaptar ao clima, ao idioma, aos hábitos e à alimentação disponível, foi doloroso acostumar-se à nova cultura. Os estigmas do diferente eram intensos e frequentes. As "vendas" nas fazendas eram os únicos fornecedores de mantimentos e, ao final do mês, a conta na caderneta estava maior que o salário a receber. Em suma, os Ijuim e tantos outros experimentaram um trabalho semiescravo.
Kentetsu, além de ser professor, era hábil na marcenaria, fato que o levou a atuar na construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil sobre o rio Aquidauana (então Mato Grosso). Ali nasceu o terceiro filho do casal, Kaneaki, em 1921. Mas o trabalho semiescravo permanecia e, nas vozes dos anciãos, "certo dia juntaram o que puderam e pegaram o trem até o fim da linha". O fim da linha era Bauru (início para a NOB).