
Simples, aconchegante e democrática (afinal, recebe os mais variados públicos), a Venda da Rose, situada no bairro Água do Paiol, a 18 quilômetros da área urbana de Bauru, caiu no gosto de muita gente da região e se consolidou como a mais tradicional mercearia rural do município. Nascida e criada por lá, a mulher que dá nome ao local, Rose Marie Miziara de Lima, de 73 anos, morreu na madrugada de sexta-feira (10) após sofrer um aneurisma na veia aorta. A sua trajetória se confunde com a do estabelecimento, fundado na década de 40. O local chegou a receber grandes nomes do sertanejo raiz, como João Mineiro & Marciano e Cezar & Paulinho.
Uma canção eternizada pela dupla Tião Carreiro & Pardinho, particularmente, mexia com Rose: "Amargurado". O trecho "Eu só desejo que a boa sorte siga teus passos" deu o tom ao adeus dos entes queridos no decorrer do velório, que ocorreu na Funerária São Vicente. Mesmo de forma contida, em virtude da pandemia do novo coronavírus, muitos passaram pelo local para se despedir da mulher. O corpo da comerciante foi sepultado no mesmo dia, no Cemitério da Saudade.
Filha de Rose, a auxiliar administrativa Rosana Miziara de Lima, de 45 anos, relata que a mãe começou a trabalhar na venda ainda criança. Desde então, não mais deixou o local. "Ela era carismática e calma, além de ter sempre uma palavra de conforto para qualquer pessoa que chegasse", observa.
As características exaltadas pela filha levaram várias duplas famosas ao estabelecimento, como João Mineiro & Marciano, Cezar & Paulinho, Mato Grosso & Mathias, Pedro Bento & Zé da Estrada, Craveiro & Cravinho e Eli Silva & Zé Goiano. Esta última, inclusive, destinou alguns versos ao local (veja na ilustração).
Rosana, que também nasceu e foi criada no Água do Paiol, pretende dar continuidade ao negócio da mãe, mas após o seu horário de trabalho.
Sobrinha de Rose, a líder da Associação de Pais para Integração Social e Escolar da Criança Especial (Apiece), Catarina Carvalho, que tinha quase a mesma idade da comerciante, diz que cresceu com ela. "Nós povoamos o sítio", acrescenta.
Isso porque a avó de Catarina, Salma José Miziara, mãe de Rose, foi uma das primeiras a chegar ao bairro após sair do Líbano, onde nasceu. "Ela trabalhou como parteira, enfermeira e costureira. Porém, na década de 40, resolveu montar um botequinho que vendia pinga. Na época, não havia energia elétrica, mas o pessoal se virava com o lampião", rememora.
Hoje, o local se tornou uma venda e muita gente sai da região de Bauru para frequentá-la. "A Rose assumiu o negócio depois que a minha avó faleceu. O mundo dela se resumia àquele espaço", revela.
CARISMA
O vendedor José Pereira de Freitas, de 70 anos, conheceu Rose há mais de quatro décadas. Ele vendia sardinha salgada, produtos suínos, salsicha, queijo e diversos outros embutidos para a comerciante. "Ela nunca estava triste e andava sempre com aquele sorriso aberto", reforça.
Já o cantor Ed Santos, de 48, frequenta a venda desde 2010. "Desta água eu bebi e nunca mais deixei de ir. Eu gostava da conversa do Tota e da paciência da Rose", destaca.
Viúva do agropecuarista Dirceu Alves de Lima, mais conhecido como Tota, havia apenas sete meses e meio, Rose deixou a filha Rosana Miziara de Lima, a neta Ana Carla Miziara de Lima Batista e o bisneto Kauê de Lima Bueno. Todos, sem exceção, vivem no Água do Paiol e não têm qualquer pretensão em abrir mão do bairro ou do negócio da família.