Economia & Negócios

Os celulares de quem trabalha com delivery

Bruno Romani
| Tempo de leitura: 3 min

Na manhã de 19 de outubro, o entregador Luís Elvis Monteiro, 28 anos, se prepara para mais um dia de trabalho. Sentado contra um muro, ele espera os chamados pingarem nos apps da Rappi e do iFood. Não são nem 11h, e o seu celular já está plugado a um carregador portátil. "Precisa carregar a cada uma hora e meia, senão descarrega e fico sem pedidos", diz Luís Elvis. Ele não está sozinho. Muitos entregadores sofrem com a ferramenta mais básica para o trabalho de delivery: o smartphone

Esqueça o iPhone: sob essa perspectiva, o negócio bilionário das plataformas de delivery está escorado num mar de modelos básicos, e quase nunca novos, de Motorola e Samsung. Isso significa que a bateria seca mais rápido, o GPS não entende direito a localização e os aplicativos engasgam. Tudo isso, claro, interfere diretamente no trabalho.

Conhecido como "Perna", Jenilson Pereira, 30 anos, sofre com a inconstância do GPS de seu Samsung J7 Pro, lançado em 2017. Usando uma bicicleta para se locomover, Perna conta que o sistema de localização do celular já enviou pedidos de retiradas que estavam a até 10 km de distância. Com menos pedidos, Perna deixa de ganhar dinheiro - aos finais de semana, ele ganha, em média, R$ 120 por dia.

O GPS é também vilão de um dos maiores temores dos entregadores: ficar sem bateria. O recurso é um dos glutões de smartphones e tem impacto até nos modelos mais avançados - o recomendável é desligá-lo quando não está em uso. Só que os entregadores precisam do sistema o tempo todo.

Às 11h, quando Guilherme Henrique, 20 anos, inicia sua jornada, seu Samsung J7 está com a carga em 100%. Quatro horas depois, quando dá uma pausa para o almoço, o nível já está em 45% - para voltar ao trabalho, é preciso recarregar. Mas nem sempre é suficiente.

"Uma vez, eu estava na rua do cliente e fiquei sem bateria", conta Guilherme. "Ainda bem que eu lembrava que o nome dele começava com 'M'. Fiquei chutando o nome para o porteiro até acertar".

O medo se justifica: não conseguir entregar o pedido pode gerar punições por partes das plataformas, que vão desde a cobrança do valor do pedido ao bloqueio da conta no serviço. Quando o nível de bateria atinge 15%, o iFood bloqueia os pedidos para o dono do celular. Mas, se o pedido foi retirado antes e a bateria acaba no trajeto, o entregador está sujeito à punição.

TELAS

A natureza do trabalho também impõe desgaste acelerado aos aparelhos - com o manuseio constante para tirar pedidos e usar os mapas, as quedas são comuns. É difícil encontrar quem não tenha o celular com a tela rachada.

Não é só estética: como muitos entregadores aprendem, tela trincada vira a porta de entrada para outros problemas. No dia anterior ao encontro com a reportagem, a água da chuva infiltrou a tela do celular de Guilherme enquanto ele trabalhava. Resultado: parte do painel queimou, formando uma grande mancha preta na parte inferior do aparelho.

Pior, em alguns casos, a tela trincada é o resultado de acidentes com os próprios entregadores. Quando encontrou a reportagem, Kawane Bianca, 24 anos, não tinha pagado a primeira das 12 parcelas de R$ 100 do seu Moto E7.

Pouco tempo antes, ela caiu na ciclofaixa da Avenida Faria Lima ao passar em um desnível na pista com o patinete que aluga do iFood. "Fiquei três dias com dor, mas não fui ao hospital. No tombo, a tela do meu J5 trincou, e ele começou a ficar lento. Minha amiga falou do risco de bloqueio na conta, então parcelei um celular novo", diz.

O impacto no ganha pão como efeito dos problemas com o smartphone também é relatado por Erick Nogueira, 21. Conhecido como "Romarinho", ele também estava com um Moto E7 recém-comprado. Era o terceiro celular numa sequência recente. "O primeiro caiu e parou de funcionar e fiquei uma semana parado No segundo, entrou água da chuva e estragou. Fiquei um mês parado até pegar esse", diz.

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