Alberto Consolaro

Herpesvírus e câncer: um presente de grego!

24/09/2022 | Tempo de leitura: 3 min

1. Vírus é tão pequeno que entra e vive apenas dentro de nossas células que são enormes para eles!

2. Cada tipo de vírus tem afinidade apenas por um tipo de células no corpo. Estas células podem ser escolhidas em laboratórios, sugerindo-se ao vírus que só entrem nesse tipo e que pode ser as células de um câncer.

3. Como não têm ferramentas e maquinaria próprias, os vírus entram no centro de comando das células, no seu núcleo, e comanda tudo para se beneficiar. A célula em geral perde autonomia e pode morrer por esgotamento.

4. Se colocarmos mensagens escritas nos vírus, a hora que entram nas células estas mensagens são liberadas e isto pode ser uma estratégia que podemos usar para matar estas células induzindo nelas o chamado suicídio celular, também conhecido como apoptose.

5. Todas as células têm o gene p53 da apoptose que fica reprimido ou inibido, mas depois de um certo tempo todas as células acabam liberando-o. Ele determina o tempo de vida de uma célula. Quando isto acontece a célula morre sem escândalos clínicos como a inflamação e resposta imunológica.

6. A apoptose ou morte celular geneticamente controlada é uma forma do corpo controlar a população celular tanto em quantidade, quanto em qualidade.

7. Quando uma célula fica estranha e atípica ou bizarra, o gene p53 é ativado e a célula entra em suicídio para que não prolifere e forme um clone estranho e maligno.

8. Alguns vírus podem ficar mais fracos no laboratório e aproveita-se para colocar mensagens como uma dizendo bioquimicamente assim: “libere o p53”. Quando chegar dentro das células cancerosas, o vírus induz a apoptose ou o suicídio!

CIÊNCIA PURA

Pesquisadores britânicos controlaram e atenuaram o vírus do herpes simples labial deixando o muito fraquinho. Colocaram nele a mensagem para que quando chegasse a uma célula cancerosa, entrasse e liberassem o suicídio celular ou que acontecesse a apoptose.

Isto mataria as células cancerosas e os seus fragmentos estimularia uma resposta imunológica contra aquelas que ainda estivessem vivas. Isto aconteceu em uma parte considerável dos doentes: o câncer desapareceu em três de cada nove pacientes. Em outros pacientes o câncer diminui muito de tamanho. Foram testados vários tipos de câncer, inclusive câncer de glândulas salivares. Os pacientes tomaram injeções a cada duas semanas por 5 vezes e eram aplicadas diretamente no tumor.

Este trabalho inicial e promissor foi apresentado em uma conferência médica em Paris e foram considerados promissores pelos cientistas britânicos liderados por Kevin Harrignton. Ele destaca que esta ideia não é nova, tem mais de 100 anos, mas agora ficaram encorajados pelos crescentes conhecimentos sobre os vírus. O conhecimento vai se acumulando e permitindo avanços no tempo. Não é a novidade que faz avançar, é a solidez da sabedoria acumulada que alavanca o progresso da humanidade. E sempre foi assim e continua!

REFLEXÃO FINAL

Os vírus quando entram nas células super bem-organizadas atuam como o enorme cavalo de madeira que os gregos deram para os troianos de presente. Uma vez dentro da cidade e já com as muralhas ultrapassadas, se viu que o presente estava carregado de soldados e armas que arrasaram com Tróia. Vale a pena ler sobre o assunto e assistir o filme Troia com Brad Pitt, uma aula sobre estratégia e entender um pouco mais o significado da expressão: - Isto é um presente de grego!

Alberto Consolaro – Professor Titular da USP e Colunista de Ciências do JC.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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